Venezuelanos têm deixado Roraima e voltado a seu país de origem de ônibus, que têm sido contratados em Boa Vista, capital do estado, para transportá-los até a fronteiriça Pacaraima. Após cruzar a fronteira, já em Santa Elena de Uairén, os venezuelanos são levados em outros ônibus para as regiões de origem.
O governo de Roraima, estado fronteiriço e porta de entrada dos migrantes, considera o número pequeno perto do total de estrangeiros que estão no estado, que diz abrigar ao menos 40 mil venezuelanos.
Essa repatriação a conta-gotas não tem participação do governo local, segundo a governadora Suely Campos (PP). Sua gestão alega que em nenhum momento foi procurada pela Venezuela para contribuir com o retorno dos migrantes ao país de origem.
Em setembro, porém, a governadora havia anunciado que o estado pagaria ônibus fretados até a fronteira para venezuelanos que desejassem voltar a seu país pelo programa de repatriação do ditador Nicolás Maduro. E é exatamente o que está ocorrendo, com ou sem auxílio brasileiro.
O regime de Maduro afirma ter repatriado nos últimos dois meses 7.907 venezuelanos que tinham migrado para outros países, dos quais 6.389 estavam no Brasil. Segundo estimativa da ONU, cerca de 5 mil fogem da Venezuela diariamente.
De acordo o Ministério das Relações Exteriores, esses venezuelanos deixaram o seu país por fatores associados às expectativas de vida, razões de natureza econômica e devido ao que considera uma campanha de mídia e política de promoção da saída da população da Venezuela.
Além dos que estavam no Brasil, o governo do país vizinho diz ter levado de volta 564 que viviam no Peru, 465 no Equador e outros 489 espalhados por Colômbia, Argentina, República Dominicana, Chile e Panamá.
O programa é uma tentativa do governo Maduro de mostrar força, na avaliação de migrantes que vivem no Brasil, mas o êxodo só terminará com o fim da ditadura, dizem oposicionistas como o ex-prefeito David Smolansky.
Segundo o governo, entre os motivos alegados por quem quis voltar estão a xenofobia no país de destino, abuso de trabalho, desemprego, problemas de saúde e dificuldades econômicas.
A reportagem tentou contato telefônico com a cônsul venezuelana em Boa Vista, Gabriela Ducharne Cardenas, para falar sobre a logística da repatriação, mas ela desligou quando a reportagem se identificou. Ela acompanhou Suely em setembro numa reunião com Maduro em Caracas, na qual o estado se comprometeu em apoiar o consulado na execução do Volta à Pátria.
Conforme os dados do ministério, fornecidos pela embaixada venezuelana, 77% dos repatriados voltaram ao país via terrestre, a partir do Brasil e da Colômbia. Nos outros casos, os venezuelanos foram transportados em 13 voos.
Muitos não tem interesse em retornar
Nas ruas de Boa Vista, os estrangeiros alegam não ter interesse em retornar à Venezuela devido à falta de condições econômicas e sociais no país. "Só quero um emprego. Com um emprego, o Brasil não precisará se preocupar com a gente. Trabalhando, eu sustento minha família", disse o venezuelano Jean Rosales, que chegou à capital em setembro e, desde então, dorme em papelões em frente à rodoviária de Boa Vista.
De acordo com Juan Garcia, que está na cidade desde o dia 1º, não há possibilidade de retorno espontâneo à Venezuela enquanto Maduro estiver no poder.
Não há condições, nem morais nem de governo, para ele prosseguir. Ninguém veio para o Brasil ou foi para outros países por desejo puro. Ninguém sai de seu país se houver condições mínimas nele. No nosso, não há.
Com o alto número de venezuelanos morando em Roraima, problemas sociais têm se avolumado no estado. De acordo com o governo estadual, há 111 venezuelanos presos no sistema penitenciário local. Os crimes mais comuns são roubo (44 presos), tráfico de drogas (24), furto (12) e homicídios (11).
Desde 2015, foram registradas 4.282 ocorrências policiais envolvendo estrangeiros. Só no primeiro semestre, os casos ligados a venezuelanos representaram 5,29% do total.
A situação é considerada mais crítica em Pacaraima, onde 6 de cada 10 ocorrências têm elo com venezuelanos. Na mesma cidade, o hospital Délio Tupinambá fez 10.368 atendimentos no primeiro semestre, dos quais 6.509 de migrantes do país vizinho.
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