Os republicanos têm motivos de sobra para acreditar numa recuperação da maioria na Câmara dos Representantes e num desempate na divisão no número de cadeiras com os democratas no Senado nas eleições legislativas de novembro, quando estarão em votação 35 dos cem assentos na câmara alta e todos os 435 da câmara baixa.
Historicamente, o partido do presidente em exercício costuma ir mal nas eleições de meio de mandato: segundo levantamento do jornal The Hill, desde 1946, a legenda do governante do momento perdeu assentos na Câmara na grande maioria desses pleitos (com apenas duas exceções) e no Senado conseguiu mais cadeiras em somente quatro oportunidades.
A aprovação do presidente democrata Joe Biden é de apenas 33%, inferior à de qualquer momento do mandato do antecessor Donald Trump (2017-2021), em grande parte devido à inflação, a maior dos últimos 40 anos.
Isso significa que os republicanos terão uma vitória esmagadora em novembro? Não necessariamente. A Gazeta do Povo lista alguns dos pontos que podem atrapalhar a oposição americana nas urnas.
Candidatos problemáticos
Analistas consideram que candidatos inexperientes e/ou envolvidos em polêmicas podem dificultar vitórias dos republicanos, especialmente no Senado.
O ex-jogador de futebol americano Herschel Walker, que tentará uma vaga no Senado pelo estado da Geórgia, tem a imagem desgastada por escândalos pessoais, como a revelação de que tinha três filhos não reconhecidos publicamente e ter mentido sobre ter trabalhado como policial.
Na Pensilvânia, o candidato de ascendência turca Mehmet Oz foi acusado nas primárias de “conexões” com o governo da Turquia e de não ter vínculos com o estado que pretende representar no Senado (ele mora em Nova Jersey).
Bandeiras em baixa
Uma pesquisa recente divulgada pelo New York Times mostrou que bandeiras tradicionais do Partido Republicano estão em baixa entre as preocupações do eleitorado americano: imigração, criminalidade e educação foram citadas como as mais importantes por apenas 4% dos entrevistados.
Segundo o levantamento, os temas que mais têm despertado o interesse no momento são aborto, controle de armas e democracia, mencionados por 30% dos que responderam à pesquisa. Entre os eleitores que citaram esses assuntos, 66% disseram que pretendem votar em candidatos democratas e apenas 14% em republicanos.
Mobilização em torno do aborto
Um desses grandes temas em destaque, o aborto, deve ter grande influência nas eleições legislativas de novembro, devido à recente decisão da Suprema Corte de derrubar a jurisprudência federal do caso Roe vs. Wade, de 1973, o que retirou os limites para os estados americanos legislarem sobre o assunto.
Desde então, estados governados pelos republicanos têm aplicado leis que restringem ou proíbem o aborto.
Políticos democratas, começando pelo presidente Joe Biden, têm convocado apoiadores a comparecer para votar, para que o partido, que é pró-aborto, garanta maiorias legislativas em nível federal e nos estados.
Em entrevista à Newsweek, Bernard Tamas, professor associado de ciência política da Valdosta State University, afirmou que a indignação progressista com a decisão da Suprema Corte pode fazer com que eleitores democratas compareçam mais às urnas.
“Eleições de meio de mandato são fortemente influenciadas pelo comparecimento. A raiva estimula o comparecimento, e os republicanos eram o grupo mais irritado até o anúncio da decisão da Suprema Corte”, disse.
Para Vinícius Rodrigues Vieira, professor de economia e relações internacionais na Fundação Armando Alvares Penteado (FAAP), os democratas podem usar a decisão sobre o aborto para mobilizar o eleitorado negro (que historicamente privilegia candidatos da legenda: em 2020, 92% dos eleitores negros votaram em Biden) e a fatia do eleitorado latino que apoia o partido.
“Se esses eleitores levarem em conta a retórica democrata de que essas eleições são cruciais para os temas que interessam a eles, o discurso de atrelar a questão do aborto ao começo de uma série de medidas que podem afetar também as minorias raciais, pode acontecer não necessariamente uma derrota republicana, mas uma vitória menos confortável do que o esperado hoje”, destacou, em entrevista à Gazeta do Povo.
Redistribuição dos distritos
As eleições de meio de mandato deste ano serão as primeiras com a nova divisão de distritos eleitorais, baseada no Censo americano de 2020.
Vinícius Rodrigues Vieira disse que, apesar das disputas judiciais sobre o chamado gerrymandering (suposta manipulação de distritos para beneficiar determinado lado) denunciado pelos democratas, o partido de Biden também pode colher frutos com o redistricting.
“Como temos uma crescente população não branca nos Estados Unidos, talvez tenhamos maior número de distritos com maioria ou número significativo de não brancos e esses eleitores podem decidir a favor dos democratas”, ponderou Vieira.
“Na Flórida, os republicanos ganharam vantagem com o redistricting proposto, mas, por exemplo, em Nevada e no Novo México, os democratas avançaram”, acrescentou.