Até o diabo já sabe que Osama bin Laden foi o maior terrorista da idade moderna. Ele juntou tudo que era discrepante, somou a grupos terroristas desarticulados e reformulou essa combinação para criar uma organização disciplinada e imensamente ambiciosa, a Al-Qaeda, com o único objetivo de espalhar o jihad pelo mundo ocidental, em especial nos EUA. Sua proeza terrorista mais evidente aconteceu no dia 11 de setembro de 2001.
Agora que Bin Laden está morto, a questão mais urgente que precisamos responder é: a morte dele fará alguma diferença? Obviamente, o fato é simbolicamente importante para os EUA, que conseguiram pegar o responsável pelos ataques do 11 de Setembro. Além disto, a morte terá ramificações políticas para Barack Obama, as quais prefiro não comentar.
Todavia, o que mais importa neste momento é saber se o mundo hoje está mais seguro do que estava na noite de sábado, quando Bin Laden ainda estava entre os vivos. Apesar de não ser uma questão fácil de se responder, acredito que há quatro áreas em que ela deve ser indagada.
A Primavera Árabe
O comentarista foi rápido em perceber a deliciosa ironia de que a morte de Bin Laden coincidiu com os levantes populares no Egito, Tunísia, Líbia e tantos outros países árabes. A Primavera Árabe mostrou que milhões de muçulmanos não estão nem um pouco interessados na teocracia radical promovida pela Al-Qaeda. Eles anseiam por liberdade e democracia. A morte de Bin Laden apenas coloca um ponto de exclamação no fato de que sua influência na região diminuiu consideravelmente desde o 11 de Setembro.
Lawrence Wright, o autor de O Vulto das Torres (Companhia das Letras), uma obra ganhadora do Prêmio Pulitzer de literatura sobre a Al-Qaeda, vai além. Ele está convencido de que a morte de Bin Laden pode ajudar a impedir o fim da Primavera Árabe.
A guerra no Afeganistão
Desde que assumiu o cargo, Obama vem insistindo que a presença norte-americana no Afeganistão estava diretamente relacionada à ameaça constante representada pela Al-Qaeda. Dez anos se passaram, todavia, e a guerra, que cada dia tem menos apoio popular, não dá qualquer indício de estar chegando ao fim. Grupos liberais estão declarando que a morte de Bin Laden eliminou as razões para se manter a guerra.
Não são apenas os liberais que defendem esse ponto de vista. James Lindsay, vice-presidente do Conselho para Relações Internacionais, escreveu que o presidente poderia utilizar a morte de Bin Laden para dizer que os EUA "atingiram seu objetivo" e usar isso como argumento para desacelerar os esforços de guerra. Ainda não é possível saber se o presidente irá tomar tal atitude. Todavia, o fim da guerra parece mais factível agora.
Terrorismo por si só
Michael Nacht, ex-oficial do Departamento de Defesa, acredita que a morte de Bin Laden irá diminuir a ameaça terrorista aos EUA. Nacht comparou o terrorismo da era Bin Laden a uma "doença fatal". Agora, a mesma pode ser encarada como uma doença crônica: "Ela ainda pode trazer complicações, mas não representa um risco de morte".
No entanto, o Wall Street Journal publicou na última segunda-feira que, hoje, a Al-Qaeda é mais vasta e "possui muito mais alcance do que tinha antes dos EUA tentarem destruí-la". Desdobramentos independentes da organização surgiram no Iêmen, Somália e em outros países.
Novos líderes terroristas surgiram, entre eles Nasir al-Wahishi, que comanda as operações da Al-Qaeda na península arábica, e Anwar al-Awlaki, um clérigo que nasceu nos EUA e está envolvido em vários planos terroristas, incluindo a tentativa de explodir um avião no dia de Natal em 2009.
Apesar do excelência americana em frustrar ataques planejados, a ameaça continua muito real, com ou sem Bin Laden.
Mundo muçulmano
Temos que admitir: grande parte do mundo árabe hoje simplesmente não acredita nas ações norte-americanas. Certamente, boa parte da culpa recai sobre a equivocada invasão do Iraque e seus desdobramentos que, por sua vez, levou aos ataques do 11 de Setembro e a Bin Laden. Neste sentido, os EUA fizeram o joguinho de Bin Laden.
Não se pode voltar no tempo só por que ele morreu. A desconfiança continua grande. Um amigo que acaba de voltar da Turquia país muçulmano que é aparentemente um grande aliado dos EUA disse que os meios de comunicação turcos se uniram em uma oposição viral às ações da Otan na Líbia, mesmo apesar dessas ações almejarem impedir que um ditador cruel massacrasse seu próprio povo. "A imagem de ocidentais bombardeando seus irmãos muçulmanos é muito pesada para ser aceita por eles", disse ele.
Esperamos que este não seja o legado de Bin Laden. Mas isso é algo que só nós podemos reverter.
Tradução de Thiago Ferreira.