O conservador Iván Duque venceu as eleições presidenciais da Colômbia no domingo (17), trazendo ao poder um homem de 41 anos educado nos Estados Unidos cuja vitória promete ser uma agressiva nova era na guerra às drogas e pode derrubar um acordo de paz histórico que acabou com a mais longa insurgência da América Latina.
Com quase todos os votos apurados, Duque tinha uma vantagem de 54% a 42% dos votos. As abstenções somaram 53% dos votos, nível maior que todas as eleições colombianas recentes.
Ao ganhar o voto de domingo, Duque – que passou anos estudando e trabalhando em Washington – impediu a ascensão de seu opositor esquerdista, Gustavo Petro. Em um momento em que a produção da folha de coca – a fonte da cocaína – está crescendo em níveis recordes aqui, o ex-guerrilheiro que se tornou senador e prefeito de Bogotá, tinha prometido uma pausa no que ele chama de “guerra às drogas ‘militarista’” apoiada pelos Estados Unidos.
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De outro lado, a vitória de Duque pode anunciar um retorno a táticas mais fortes. Os EUA gastaram 10 bilhões de dólares em duas décadas lutando contra o crescimento da coca – apenas para ver a produção atingir níveis mais altos hoje do que quando a campanha foi lançada. Agentes americanos veem Duque – um apadrinhado do ex-presidente direitista Alvaro Uribe, que lançou uma ampla ofensiva contra guerrilhas e narcotraficantes em 2000 – como um parceiro confiável. Ele poderia trazer de volta uma versão da controversa prática da pulverização aérea, banida em 2015 por razões de saúde.
Duque – que também prometeu baixar impostos das empresas e ampliar as forças policiais – traz com ele a primeira vice-presidente mulher do país, a ex-ministra da Defesa Martha Lucia Ramirez, de 63 anos.
Tensões nacionais
Após ter terminado em primeiro lugar no primeiro turno das eleições colombianas, em 27 de março, Duque procurou amenizar as preocupações de que sua presidência reacenderia as tensões nacionais. Neste domingo, ele reiterou a mensagem – ao tempo que esboçava uma visão conservadora para segurança e crescimento econômico.
“Nós queremos virar a página da corrupção e do clientelismo para um país em que criminosos que cometem crimes paguem por isso. Um país de empreendedores, em que pequenos, médios e grandes negócios criem empregos que nos permitam expandir a classe média e reduzir a pobreza”, Duque afirmou após votar, na capital.
Ainda assim, a vitória de Duque potencialmente põe em perigo o acordo de paz de 2016 firmado com as antigas Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia), pelo qual o presidente Juan Manuel Santos venceu o Prêmio Nobel da Paz. Um crítico do tratado, Duque chegou perto de dizer que rasgaria o acordo. Mas acabou pedindo por “mudanças estruturais” – em particular que os antigos líderes do grupo a quem foram garantidos assentos no Congresso sejam julgados por crimes de guerra.
Críticos temem que tais mudanças possam acabar com o processo de paz já em deterioração, provocando uma nova onda de violência em um momento em que mortes em zonas pós-conflito estão surgindo novamente. Ainda no domingo, eleitores de Duque disseram que eles apoiam uma linha mais dura.
“O acordo de paz foi uma mentira”, disse Rodrigo Pimentel, 72, um médico de Bogotá que votou em Duque. “Internacionalmente, todos foram a favor. Mas não aqui. Como podem as mesmas pessoas que mataram tantos, que eram narcotraficantes, se sentar em nosso Congresso?”.
A vitória de Duque também marcou o retorno triunfante de Uribe ao ápice da política colombiana. Uma figura divisiva cujo mandato terminou nos anos 2000 marcado por alegações de ligações com esquadrões da morte de direita, Uribe é visto como o principal arquiteto da ascensão de Duque ao palácio presidencial.
De fato, para muitos colombianos, Duque apareceu ter vindo do nada. No começo de sua carreira, ele trabalhou como assistente e consultor de Uribe. Depois de ter estudante e trabalhado em Washington por anos, Duque voltou para a Colômbia a pedido de Uribe, onde ele ajudou a catapultar o jovem conservador a um assento no Senado em 2014.
A questão que enfrenta Duque agora será o quanto, se tanto, ele pode sair da sombra de Uribe – e resistir a pedidos de alguns membros de sua base de apoio para que o acordo de paz seja completamente rompido.
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Colombiano de Washington
“O estilo de Duque é pragmático”, disse Michael Shifter, presidente do Inter-American Dialogue (Diálogo Interamericano), um think tank com sede em Washington. “Ele tem a capacidade de superar algumas divisões do país, mas se ele seguir adiante em retroceder aspectos significativos do acordo de paz, isso pode criar mais tensão, mais divisão”.
O resultado tem um vencedor adicional mais ao norte: Washington. Educado nas universidades American e de Georgetown, Duque viveu por anos em Chevy Chase, estado de Maryland, e trabalhou para o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), sediado em Washington. Ele vem de um segmento firmemente pró-americano da política colombiana.
“Você poderia chamá-lo de um colombiano de Washington”, disse Juan Felipe Celia, um especialista em Colômbia do Atlantic Council, outro think tank de Washington.
Ao longo de uma campanha dura, a equipe de Duque procurou retratar Petro como um prenúncio de ideias de extrema-esquerda, cujas políticas transformariam a Colômbia em uma nova Cuba ou Venezuela. Petro – que chegou a se referir com carinho ao falecido venezuelano Hugo Chávez – lutou contra essa caracterização e buscou moderar seu discurso.
Ainda assim, no domingo, muitos eleitores aparentaram apoiar Duque em parte para impedir a ascensão de Petro.
“Petro é um novo Maduro”, disse Marta Quintero, uma corretora de imóveis de 54 anos de Bogotá, referindo-se ao presidente venezuelano Nicolás Maduro, cujo país está confrontando hiperinflação galopante e fome crescente. “Tudo que você precisa é olhar para a nossa fronteira, à Venezuela, para ver que a esquerda não é solução”.
Exército da Libertação Nacional
Em um país que sempre elegeu presidentes conservadores, Petro foi além do que a maioria dos analistas achava possível. Que ele tenha chegado tão perto da presidência reforçou um desagrado forte e crescente com a desigualdade, a miséria e a corrupção – e potencialmente estabeleceu a base para uma disputa mais dura com a esquerda daqui a quatro anos.
Além da guerra às drogas, um dos maiores desafios que se apresentam a Duque é o ressurgente Exército da Libertação Nacional (ELN) – uma força guerrilheira que ocupou territórios anteriormente controlados pelas Farc. Ainda que tenha sugerido que está aberto ao diálogo, Duque chamou tentativas de empurrar um acordo de paz enquanto o ELN ainda se envolve em atividades criminosas de “uma piada”.
Para deter a marcha do processo de paz com as Farc, Duque precisa simplesmente não fazer nada. Mesmo Santos, que firmou o acordo, foi incapaz de levar adiante vários dos pontos fundamentais do acordo no Congresso, deixando para Duque a tarefa de levá-los adiante – ou não.
“O fato é que Duque realmente não precisa fazer nada para bloquear o acordo”, Celia disse. “Tudo que ele realmente precisa fazer é nada”.
*Contribuíram Dylan Baddour em Bogotá e Rachelle Krygier em Caracas.
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