A crise na Venezuela escalou para outro nível.
Nas primeiras horas da manhã de 30 de abril, Juan Guaidó – o líder da Assembleia Nacional da Venezuela, que assumiu a presidência interina do país em janeiro – convocou uma revolta contra o governo autoritário de Nicolás Maduro.
Em um vídeo postado nas redes sociais, Guaidó, ladeado por soldados, pediu aos venezuelanos que se juntassem a ele nas ruas em 1º de maio para a etapa final da “Operação Liberdade”. Esse protesto em massa e revolta militar seriam “o começo do fim” de um regime que Guaidó e mais de 50 países, incluindo Brasil e Estados Unidos, consideram ilegítimo.
Ao fundo no vídeo, resolutamente em pé ao lado de Guaidó e soldados rebeldes, estava uma figura impressionante: Leopoldo López, o prisioneiro político mais famoso da Venezuela.
Revolta em Caracas
Sob o governo de Maduro, que assumiu o cargo em 2013, a economia da Venezuela se enfraqueceu e em seguida entrou em colapso. Alimentos, remédios e eletricidade são escassos. Maduro se recusou a ceder, alegando que os problemas econômicos do país e a agitação popular são uma conspiração dos EUA contra ele.
López, ex-prefeito e ex-candidato à presidência, foi uma figura de destaque no poderoso movimento de protesto contra Maduro que começou em 2014.
Depois que uma importante marcha anti-Maduro em Caracas se tornou violenta, o popular político foi acusado de “incitação ao crime”. No momento em que López atravessou a multidão de apoiadores enfurecidos para se entregar à polícia, ele se tornou o rosto da luta venezuelana por liberdade e democracia.
Os defensores o viram como um mártir que enfrentou a ditadura em vez de se exilar, como muitos dissidentes venezuelanos fizeram. Ele foi condenado a 14 anos de prisão.
O rosto de López foi estampado em camisetas, cartazes e bandeiras que se agitavam pelo país. Um site, o FreeLeopoldo.com, pedia “a libertação imediata do líder da oposição venezuelana Leopoldo López, que foi preso ilegalmente em uma tentativa de silenciar a dissidência e a liberdade de expressão”. A sua causa foi espalhada pelo mundo com a hashtag “FreeLeopoldo”.
Depois de três anos, o governo de Maduro, em 2017, cedeu à intensa pressão política e liberou López para a prisão domiciliar no elegante bairro de Los Palos Grandes. López, encarcerado, era a personificação da oposição vencida da Venezuela.
Então, há três meses, Juan Guaidó revigorou o movimento de resistência travando um ataque frontal a Maduro. E López – aparentemente libertado da prisão domiciliar pelos soldados que guardavam sua casa, agindo sob ordens de Guaidó – voltou à resistência.
Ver Leopoldo López ao lado de Guaidó naquele vídeo, como um homem livre, convocando abertamente uma revolta, foi um sinal poderoso para os venezuelanos depois de anos de protestos sangrentos e várias tentativas frustradas de golpe.
O pedigree político de Leopoldo López
López é trineto do ex-presidente venezuelano Cristóbal Mendoza e teria parentesco com Simón Bolívar, o general nascido na Venezuela que libertou cinco países sul-americanos do domínio espanhol no início do século 19.
López estudou economia e sociologia no Kenyon College, nos Estados Unidos, com uma bolsa de estudos. Em 1996, ele obteve um mestrado em política pública em Harvard.
Ele começou sua carreira política em 2000, com dois mandatos de quatro anos como um dinâmico, popular e charmoso prefeito de Chaco, um município de classe média alta na região metropolitana de Caracas. Em 2008, no final de seu segundo mandato, ele tinha 92% de aprovação.
Foi quando o presidente Hugo Chávez, líder socialista tardio da Venezuela e mentor de Maduro, acusou López de corrupção e o proibiu de concorrer ao cargo. López foi um dos muitos políticos populares venezuelanos que enfrentaram acusações falsas que serviram para impedi-los de desafiar Chávez eleitoralmente.
Em 2011, a Corte Interamericana de Direitos Humanos determinou que López deveria ter permissão para concorrer ao cargo – uma ordem que a Suprema Corte venezuelana rejeitou.
López, que planejava concorrer à presidência contra Chávez representando o Voluntad Popular – um partido político fundado por ele, Guaidó e outras figuras da oposição em 2009 – retirou sua candidatura. Em vez disso, ele apoiou o candidato da oposição Henrique Capriles Radonski.
Chávez venceu a eleição presidencial de 2012 e morreu alguns meses depois. Maduro, seu vice-presidente, assumiu o cargo em 2013.
López foi condenado à prisão um ano depois. Enquanto ele estava na prisão, a esposa de López, Lilian Tintori, se tornou uma pedra no sapato de Maduro. Ela viajou pelo mundo para reuniões com chefes de Estado e denunciou violações de direitos humanos na Venezuela. Ela se encontrou com os presidentes da América Latina, o papa Francisco, e em fevereiro de 2015, com o então vice-presidente dos Estados Unidos, Joe Biden.
Em fevereiro de 2017, Tintori viajou para Washington para se reunir com o presidente dos EUA, Donald Trump, e o vice-presidente Mike Pence, que condenaram Maduro e expressaram apoio público ao marido dela.
Depois de serem recebidos como “convidados” do governo chileno na Embaixada do Chile em Caracas, Tintori, López e um de seus filhos estão agora hospedados na residência do embaixador espanhol na Venezuela. O governo espanhol diz que ele não pediu asilo político, mas López não pode ser preso enquanto estiver na residência do embaixador.
O resultado do esforço de Guaidó para retirar Maduro do poder é incerto. Mas sempre que a democracia é restaurada na Venezuela, López certamente será um candidato presidencial a ser observado.
*Marco Aponte-Moreno é professor assistente de Negócios Globais e membro do Institute for Latino and Latin American Studies, no St. Mary's College, na Califórnia (EUA).
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