Na semana passada, o Suriname atingiu um passo importante para tentar recuperar sua economia. O Fundo Monetário Internacional (FMI) informou que chegou a um acordo com o pequeno país sul-americano para a segunda revisão de um programa de empréstimos, que, segundo a agência Reuters, disponibilizará US$ 53 milhões assim que for aprovado pelo conselho executivo do fundo.
Esse acordo ressuscita um programa por meio do qual o FMI destinaria US$ 700 milhões ao Suriname, mas que estava paralisado há mais de um ano porque o país não cumpriu as metas estipuladas.
O FMI destacou que o governo surinamês está renegociando de “boa-fé” suas dívidas com China e Índia, e é nesse ponto que a história começa a parecer uma luta entre Davi e Golias: a segunda maior economia do mundo sufocou o pequeno país sul-americano, de cerca de 600 mil habitantes, ao dificultar a renegociação dos débitos.
De acordo com informações do site argentino Infobae, a China é credora de 17% da dívida pública do Suriname. Para conseguir o dinheiro do FMI, o governo surinamês buscou reestruturar seus débitos, mas as renegociações com a China foram as únicas que não avançaram.
Esta semana, uma reportagem da rádio Joy, de Gana, apontou que o FMI fez um alerta de que o país africano está “exposto” à possibilidade de perder parte significativa de sua arrecadação, já que grandes empréstimos que fez junto à China têm como garantia a produção de commodities (como cacau, bauxita e petróleo).
Desde o começo dos anos 2000, Gana obteve quase US$ 5 bilhões em 41 empréstimos chineses, para investimentos em áreas como transporte, energia e agricultura. Agora, atravessa sua pior crise econômica em décadas e enfrenta grandes dificuldades para pagar seus credores.
Os casos de Suriname e Gana não são isolados: no ano passado, o Banco Mundial informou que a China era credora de mais de 40% da dívida que os países mais pobres do mundo tinham junto a instituições públicas e privadas. E a relutância de Pequim em renegociar esses débitos tem intensificado crises mundo afora.
Uma reportagem da Forbes apontou que o programa Nova Rota da Seda, por meio do qual a China financia projetos de infraestrutura em todo o mundo, é um dos principais fatores para o aumento da dívida de países pobres junto ao gigante asiático.
Segundo a revista americana, no final de 2020, dos 97 países para os quais havia dados disponíveis, estavam envolvidos no programa todos os que apresentavam as maiores dívidas junto à China, como Paquistão (US$ 77,3 bilhões), Angola (US$ 36,3 bilhões), Etiópia (US$ 7,9 bilhões), Quênia (US$ 7,4 bilhões) e Sri Lanka (US$ 6,8 bilhões).
Um levantamento divulgado este mês pela agência Associated Press apontou que 12 países pobres (como Paquistão, Quênia, Zâmbia, Laos e Mongólia) têm a China como credora de até 50% de seus empréstimos estrangeiros e a maioria deles já destina mais de um terço da sua arrecadação para o pagamento da dívida externa.
Dessa forma, a receita para custear despesas fundamentais, como educação e infraestrutura, está cada vez mais comprometida. Dois dos países da lista da AP, Zâmbia e Sri Lanka, incapazes de pagar sequer os juros dos empréstimos, anunciaram calotes nos pagamentos da sua dívida externa, em 2020 e 2022, respectivamente.
Além da relutância em renegociar dívidas, a China guarda segredo sobre quanto dinheiro empresta e em quais termos, o que dificulta a intervenção de outros grandes credores desses países. Pequim também obriga os mutuários a colocar dinheiro em contas caução ocultas para que o gigante asiático fique à frente na fila de credores a serem pagos.
Em nota enviada à AP, o governo da China refutou a acusação de que se nega a renegociar dívidas e alegou que estendeu prazos de pagamento, concedeu empréstimos de emergência e foi o maior colaborador de um programa que suspendeu temporariamente o pagamento de juros durante a pandemia de Covid-19.
Entretanto, não parece suficiente: no ano passado, após o encontro anual do FMI e do Banco Mundial em Washington, a secretária do Tesouro dos Estados Unidos, Janet Yellen, disse que os países em desenvolvimento já vêm sendo pressionados nos últimos anos por fatores como a disparada da inflação, a fuga de capitais e o câmbio, e a recusa da China em renegociar dívidas aumenta essa pressão.
“Realmente, a barreira que impede maior progresso tem sido um importante país credor, ou seja, a China”, declarou Yellen. “Portanto, tem havido muita discussão sobre o que podemos fazer para fazer a China negociar e promover uma solução mais eficaz.”
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