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O contestado projeto da reforma da previdência na França ficou sem votação na Assembleia Nacional, e por isso avançou diretamente para o Senado. O período legislativo para debate e votação do texto em primeira leitura terminou à meia-noite de sexta-feira (20 horas de Brasília) sem que os deputados pudessem debater e votar grande parte do seu conteúdo devido às milhares de emendas apresentadas pela formação de esquerda A França Insubmissa (LFI). Em particular, os deputados não puderam discutir ou votar o polêmico artigo 7, que estabelece a elevação da idade mínima de aposentadoria de 62 para 64 anos.
Um afônico ministro do Trabalho, Olivier Dussopt, que perdeu a voz depois de duas intensas semanas de debate, lamentou que grande parte da proposta não pudesse ser discutida, enquanto criticava os deputados da LFI que “me insultam há 15 dias, mas não me fizeram cair”. A tentativa da LFI de forçar a continuação dos debates além do prazo estabelecido no regimento da Assembleia foi rejeitada. “Desprezaram os franceses e até os seus próprios parceiros de coligação” ao impedir o debate, disse a chefe do grupo parlamentar pró-governo, Aurore Bergé, para criticar o que considera ser uma táctica obstrucionista da LFI. “Temos o direito de ter respostas às nossas questões”, respondeu o deputado François Piquemal, da LFI.
Senado tem dois meses para discutir texto
Vários deputados ambientalistas e socialistas, parceiros da LFI na coalizão progressista Nupes (que também agrupa os comunistas), também lamentaram a estratégia dos “insubmissos”, que, segundo a ambientalista Sandrine Rousseau, foi “um fracasso estratégico”. Após os debates na Assembleia terminarem sem votação, o projeto de lei passou em sua versão original ao Senado, que tem prazo de dois meses para debater o texto.
O último dia de debates na Câmara ofereceu uma discussão intensa, cheia de injúrias, gritos e vaias, como é tradição na belicosa Assembleia Nacional Francesa. Depois da meia-noite e já encerrado o debate sobre a previdência, os deputados deveriam discutir e votar uma moção de censura ao governo apresentada pelo grupo de direita Reagrupamento Nacional (RN), pela forma como está fazendo a gestão desta reforma. Enquanto isso, os sindicatos continuam preparando a greve geral de 7 de março, para a qual buscam paralisações mais intensas e extensas que as dos cinco dias de protestos realizados desde 19 de janeiro.
Além de aumentar a idade mínima de aposentadoria de 62 para 64 anos, a reforma busca antecipar para 2027 o aumento de um ano (de 42 para 43) do tempo de contribuição necessário para o benefício da aposentadoria integral, que agora está previsto para 2035. O governo argumenta que sem estas alterações o sistema de pensões vai gerar um déficit crescente que chegará aos 12,5 bilhões de euros até 2030, enquanto a esquerda questiona estes números e propõe a taxação das grandes fortunas e dos benefícios das principais empresas para compensar o rombo. A reforma tem a oposição frontal tanto da esquerda (LFI, socialistas, comunistas e ecologistas) como da extrema-direita. Por isso, o governo, que não tem maioria no Parlamento, precisa do apoio do único partido que resta como respaldo possível: o conservador Republicanos.