A oposição da Venezuela começou uma abordagem diplomática após o levante fracassado do mês passado, incluindo conversas com o regime do ditador Nicolás Maduro. Mas o mais importante apoiador internacional da oposição - os Estados Unidos - está cético em relação à boa fé de Maduro, ou que as conversações levarão à sua destituição do cargo.
A oposição, liderada por Juan Guaidó, enviou emissários a Oslo na semana passada para negociações intermediadas pelo governo norueguês com dois altos funcionários leais a Maduro, incluindo Jorge Rodríguez, ministro das Comunicações do regime.
Quatro pessoas com conhecimento das negociações disseram que os lados não se encontraram diretamente - eles trocaram pontos de vista e propostas através de intermediários diplomáticos.
Um alto funcionário do governo Trump descreveu as propostas do regime na reunião como vagas e carentes de detalhes importantes, particularmente sobre a exigência da oposição de que Maduro renuncie, e sobre a composição de qualquer governo de transição.
Os noruegueses se aproximaram dos americanos "há algumas semanas" para abordar as conversas, disse a autoridade. O governo americano continua profundamente cético de que Maduro estaria disposto a deixar o poder e disse aos noruegueses que é preciso pressionar por manifestações de boa fé, incluindo a libertação de presos políticos.
"É uma tentativa de ganhar tempo? De distrair? Ou eles estão falando sério?" perguntou o oficial. Ele disse que as conversações de Oslo foram "inerentemente falhas" em parte porque não incluíram gestos de boa fé do governo de Maduro.
"Você não pode ter negociações honestas quando alguns [da Assembleia Nacional controlada pela oposição] estão na prisão", disse ele.
Outro alto funcionário do governo disse que a demanda central da oposição venezuelana e dos Estados Unidos não mudou: "Maduro deve sair".
Os funcionários falaram sob condição de anonimato para discutir a formulação de políticas a portas fechadas.
No planejamento de um governo pós-Maduro, eles enfatizaram a necessidade de manter as instituições intactas. Eles citaram o colapso do Iraque em 2003, depois que os EUA desmantelaram o exército e outras instituições.
Qualquer "transição presidida por Maduro é falsa", disse o segundo funcionário, mas o envolvimento de outros altos funcionários do governo e garantias de que eles podem permanecer em suas posições atuais serão fundamentais para o sucesso.
As conversações entre o regime e a oposição podem continuar nos próximos dias e semanas.
Publicamente, pelo menos, os lados permanecem distantes.
Eleições antecipadas
Maduro divulgou nesta semana uma proposta que a oposição considera um cinismo: eleições antecipadas para a Assembleia Nacional (AN), agora chefiada por Guaidó, controlada pela oposição e reconhecida internacionalmente como a única instituição democrática do país. O regime de Maduro retirou os poderes da AN em 2017, e os críticos da oposição dizem que uma nova eleição serviria apenas para fortalecer o poder de Maduro.
"A Venezuela está em uma crise humanitária sem precedentes", disse Guaidó em uma sessão da Assembleia Nacional na terça-feira. "Qual é a resposta do regime? Tirar sarro do povo falando sobre eleições parlamentares, enquanto nossa proposta tem sido clara: fim da usurpação, governo de transição e eleições livres. Eleições verdadeiramente livres. É isso que eles temem… Não há dúvida de que uma eleição livre abriria as portas para a mudança na Venezuela."
Guaidó transmitiu a sessão nas mídias sociais, porque os agentes da Guarda Nacional Bolivariana que cercavam o palácio legislativo impediram que a imprensa entrasse.
O grupo de contato internacional - que inclui a União Europeia, Reino Unido, Itália, Espanha, França, Alemanha, Portugal, Suécia, Bolívia, Costa Rica, Uruguai e Equador - enviou uma delegação a Caracas na semana passada para falar com os dois lados. Não houve sinais específicos de progresso. Uma pessoa informada sobre as negociações disse que a reunião com Maduro não foi bem, e que ele disse que qualquer nova eleição presidencial antes do final de seu mandato de cinco anos seria "impensável".
"Parece que Maduro ainda está preso à ideia de que ele é constitucional e legítimo, e isso não mudou, e até que haja uma mudança de tom, não haverá um grande avanço", disse a pessoa.
Luis Vicente León, diretor da agência de pesquisas de opinião Datanálisis em Caracas, disse o fato de que ambos os lados estão concordando em fazer negociações é um passo significativo em direção a uma possível solução negociada para a crise. Ele disse que as primeiras reuniões eram parte de um "processo mais longo".
"Isso significa que ambos os lados estão começando a se sentir exaustos", disse ele. O governo está isolado, dividido e mal consegue governar, disse ele, enquanto a oposição percebeu que sua estratégia para derrubar Maduro ao cortejar os militares e seus partidários até agora falhou.
Levante fracassado
Os esforços de mediação internacional vêm semanas após a fracassada revolta liderada por Guaidó e seu mentor, Leopoldo López.
Nos dias que se seguiram, a oposição lutou para permanecer unida enquanto a comunidade internacional, alarmada, reforçava os pedidos por uma solução negociada. Até mesmo o Grupo de Lima, um coletivo regional de nações que apoia amplamente a agenda de Guaidó, anunciou sua intenção de abordar tanto o grupo de contato quanto Cuba, que apoia Maduro.
Maduro e a oposição, enquanto isso, estão enviando sinais contraditórios. Maduro prometeu aliviar as tensões e concordou em conversar com os países que querem mediar um acordo. No entanto, seu governo também aprisionou o vice-presidente da Assembleia Nacional, Edgar Zambrano, e acusou 10 legisladores de traição em relação à conspiração de 30 de abril.
"Vou focar todos os meus esforços para que a Venezuela, o quanto antes, chegue a um acordo com a oposição venezuelana", disse Maduro em discurso televisionado na segunda-feira.
A oposição tornou-se mais favorável à opção de uma intervenção militar estrangeira para expulsar Maduro. Guaidó disse ao Washington Post neste mês que aceitaria uma oferta hipotética de assistência militar dos EUA à Assembleia Nacional. E na segunda-feira, seu representante nos Estados Unidos, Carlos Vecchio, se reuniu com o Departamento de Estado dos EUA para "avaliar os mecanismos conjuntos de cooperação e planejamento estratégico para avançar em uma solução", disse Vecchio no Twitter. Ele disse que estava "satisfeito com o progresso alcançado".
Muito a perder
Maduro reivindicou a vitória no ano passado em eleições amplamente consideradas fraudulentas. Guaidó declarou-se presidente interino em janeiro e foi reconhecido como líder legítimo da Venezuela por mais de 50 países.
Com o passar do tempo, ambos os lados têm muito a perder. Maduro mostrou-se incapaz de deter a queda livre da Venezuela na crise humanitária sem precedentes que provocou um êxodo em massa da nação rica em petróleo. Conforme as condições se deterioram, ele arrisca mais divisões internas, especialmente nas forças armadas. Sinais dessas brechas já foram evidenciados.
Mais recentemente, seu embaixador na Itália, Julián Isaías Rodríguez, pediu demissão na terça-feira, dizendo que ele deixa seu posto "sem arrependimentos e sem dinheiro. Minha esposa acabou de vender joias que seu ex-marido havia dado a ela para nos manter em frente ao bloqueio dos EUA." Ele disse que os "gringos" o sancionaram e que ele não tem uma conta bancária.
Guaidó corre o risco de perder o apoio interno enquanto seus esforços para derrubar Maduro fracassam. Seu índice de aprovação caiu cinco pontos percentuais de fevereiro para abril, segundo a empresa de pesquisa de opinião de León. A queda não é dramática, mas pode piorar se ele não alcançar resultados tangíveis que os venezuelanos possam ver, disse León.
Durante as negociações da semana passada em Oslo, Guaidó disse que elas eram apenas parte da estratégia maior de sua equipe para destituir Maduro.
"Repetimos: estamos trabalhando em todas as opções para acabar com a ditadura e estamos avançando em cada uma delas: mediação de países que abordam uma solução na Venezuela, cooperação internacional e incentivo ao apoio constitucional de nossas Forças Armadas", ele twittou.
Os falcões da administração Trump pressionaram por opções militares na Venezuela, mesmo quando o presidente Donald Trump indicou pouco apetite por uma intervenção, particularmente às vésperas do ciclo eleitoral de 2020.
Um alto funcionário do governo reconheceu que "ninguém quer fazer isso, certamente o [Departamento de Defesa] não quer".
No entanto, o funcionário acrescentou: "as pessoas que pensam que não há opção militar estão erradas. Não é nossa política, mas quem sabe o que acontecerá amanhã?"
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