O terremoto de 6 de fevereiro já provocou mais de 5,8 mil mortes na Síria (e 41 mil na Turquia). Mas as áreas afetadas pelo tremor na Síria são divididas entre territórios opositores ao ditador Bashar al-Assad ou controladas pelo governo. Essa divisão tem provocado maior desassistência de ajuda humanitária no noroeste sírio, em especial nas províncias de Idlib e Aleppo.
Denúncias de bloqueios do acesso pela travessia de Umm Jalud, na fronteira entre Síria e Turquia, foram relatadas desde o terremoto. Um comboio da autoproclamada Administração Autônoma do Norte e Leste da Síria (AANES), liderada pelos curdos, conseguiu apenas na última segunda-feira (13) entrar na região com 53 caminhões carregados de suprimentos após conseguir liberação de milícias turcas. Esses itens foram doados pela população da região nordeste da Síria.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) também pretende levar auxílio para o noroeste da Síria, tendo também que conseguir as autorizações necessárias. A ajuda humanitária da ONU conseguiu chegar nessas localidade apenas quatro dias após os terremotos, em especial pela dificuldade de acesso devido a única rota ser o posto fronteiriço de Bab al Hawa, que liga Idlib e Turquia.
Essa rota, além de apresentar dificuldades logísticas, ainda é ocupada por tropas ligadas ao regime ditatorial da Síria. A ONU tem tentado ampliar os acessos de ajuda humanitária no país, mas tem encontrado resistência no Conselho de Segurança, em especial da Rússia, principal aliada de al-Assad, e que insiste que as operações devam ser iniciadas dentro de território sírio e não saindo de outros países, como a Turquia.
“Até agora, falhamos com o povo do noroeste da Síria. Eles têm razão ao se sentirem abandonados, à procura de ajuda internacional que ainda não chegou", afirma o chefe humanitário da ONU, Martin Griffiths.
A ONU pediu na última sexta-feira (17) a criação de um fundo internacional de apoio à Turquia. Com valor estimado em US$ 1 bilhão, os valores arrecadados devem auxiliar a população em termos de alimentação, proteção, educação, água e abrigo. As Nações Unidas avaliam que 5,2 milhões de pessoas devem ser impactadas.
Até o fechamento dessa reportagem, a ONU não havia anunciado a intenção de criar um fundo de emergência similar para a Síria.
Entidades trabalham no auxílio humanitário à opositores da ditadura
Com a dificuldade da chegada do auxílio humanitário da ONU e de outros países na região noroeste da Síria, o trabalho de ajuda à população local antes mesmo do terremoto tem sido realizado em sua maioria por entidades não governamentais, como a Portas Abertas e o Médico Sem Fronteiras.
A Portas Abertas é uma organização não governamental que promove o auxílio a cristãos perseguidos pela fé ao redor do mundo. Na Síria, a entidade tem trabalhado junto de igrejas e outras organizações do setor para o desenvolvimento de 16 Centros de Esperança. Essas localidades permitem distribuição de alimentos, assistência médica, aconselhamento pós-trauma, treinamento vocacional e auxílio financeiro para a população carente.
“Um terremoto dessa extensão e gravidade pega a todos de surpresa. Além de traumas físicos e emocionais, a população síria se vê diante da falta de alimentos, água potável, abrigo, desaparecimento e morte de família e amigos. Dentro deste contexto toda a ajuda vinda de Organizações, igrejas, instituições estrangeiras é de suma importância. A falta de comunicação, fechamento de estradas e falta de luz só piora a situação e impede, muitas vezes, que o socorro chegue até os locais mais atingidos ou às pessoas mais vulneráveis”, explica Marco Cruz, secretário-geral da Portas Abertas no Brasil.
Segundo a Portas Abertas, as vítimas dos terremotos na região noroeste da Síria têm conseguido refúgio em igrejas da localidade. Na província de Latakia, um templo tem sido abrigo para mil pessoas.
“A Portas Abertas está mobilizando o envio de recursos para que o trabalho das igrejas locais continue na região. A necessidade de abrigo, cobertores e sacos de dormir está maior do que a capacidade de nossos parceiros e das igrejas locais. Além disso, o medo de novos tremores mantém as pessoas em pânico”, completa Cruz.
Já o Médicos Sem Fronteiras está atuante há mais de uma década na região noroeste da Síria e tem tentado receber autorização para poder trabalhar em outras áreas. A entidade aponta que 4 milhões de pessoas vivem nessas localidades, com maior carência por eletricidade, saneamento básico e o acesso a medicamentos e a cuidados de saúde, ampliada ainda mais após o terremoto.
“Um dos problemas nessa região é que há entraves para o ingresso de ajuda humanitária, o que fez com que os hospitais da área já estivessem desabastecidos mesmo antes do tremor. A maioria das organizações humanitárias que atuam na região teve de utilizar os estoques que possuíam para atender as necessidades imediatas, e é necessário que seja restabelecido um fluxo regular de suprimentos”, aponta Leanne Neale, diretora de captação de recursos de MSF-Brasil.
A entidade conta com 11 clínicas móveis na região, tendo realizado 1 milhão de consultas, 18 mil partos naturais e cesarianas e 12 mil cirurgias, com mais de 60 mil famílias sírias impactadas. Após o terremoto a organização enviou equipes médicas e ambulâncias para atendimentos nos locais afetados, além de construir clínicas móveis para o socorro dos feridos.
“Números preliminares referentes às doações recebidas em 2022 indicam que arrecadamos cerca de R$280 milhões destinados a nossos projetos no Brasil e também internacionais. Em situações emergenciais, como a que estamos lidando agora, promovemos as arrecadações via fundo emergencial para poder atender de maneira mais imediata a forte demanda por recursos”, prossegue Neale.
Para conhecer mais sobre os trabalhos dessas organizações e também auxiliar na ajuda humanitária às vítimas do território da Síria acesse o site do Portas Abertas e do Médicos sem Fronteiras.
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