Um incidente diplomático entre Peru e Venezuela está prejudicando as chances eleitorais de Ollanta Humala, o nacionalista apoiado por Hugo Chávez nas eleições de junho, mesmo entre alguns pobres que formam a sua base de apoio.
O candidato de esquerda continua sendo visto como herói por muitos indígenas peruanos, que aplaudiram entusiasticamente uma peça, encenada nesta semana, em que um peão indígena expulsa seu patrão de origem européia.
- Ollanta vai ganhar porque vai trazer dignidade ao povo peruano - disse o artesão Jorge Eduardo Encizo, 25, que assistia à apresentação em Chosica, nos arredores de Lima.
Mas as pesquisas mostram Humala, vencedor do primeiro turno, atrás do seu adversário, o ex-presidente social-democrata Alan García, com quem disputa o segundo turno. Chávez certamente não está sendo útil na campanha.
O presidente venezuelano apóia ostensivamente o candidato nacionalista, um ex-militar de passado golpista como Chávez, e chama García de ladrão.
O governo do Peru queixou-se da "persistente e flagrante interferência" de Chávez. O incidente se agravou em abril, quando os dois países retiraram seus embaixadores das respectivas capitais.
Agora alguns peruanos que apoiavam Humala por sua mensagem nacionalista se perguntam se ele não será íntimo demais de Chávez e se não teria em comum com ele o caráter de "ditador brando", que alguns atribuem ao líder venezuelano.
- A intervenção de Chávez na política peruana lhe causou muito mal, e até as pessoas nas fileiras de Humala não gostaram disso - afirmou Ernesto Velit, professor de Ciências Políticas na Universidade San Marcos, de Lima.
O apoio de Evo Morales, o presidente boliviano que recentemente nacionalizou os recursos energético do seu país, também pode estar sendo nocivo a Humala.
A popularidade do candidato parece ter caído rapidamente nas primeiras pesquisas divulgadas desde o início da campanha para o segundo turno, na semana passada, algo que não passa despercebido a Humala.
- Obviamente, não está ajudando. Não estou em contato direto com ele, mas dizemos a ele, por favor, deixem-nos fazer nosso trabalho e comandar nossa campanha - disse Humala ao programa de TV Cuarto Poder, no domingo.
Segundo pesquisa do instituto CPI divulgada na terça-feira, García tem 61,4% das intenções de voto, contra 38,6% de Humala, uma vantagem aparentemente irreversível.
- Votei em Humala no primeiro turno, mas estou olhando de novo para ele e tenho minhas dúvidas - disse o engenheiro Leonardo Rupiri, na periferia limenha de Villa El Salvador. - Ambos são militares, e Chávez pode manipulá-lo.
As pesquisas mostram que García está recebendo quase integralmente os votos que no primeiro turno foram para a conservadora Lourdes Flores.
Muitos peruanos pobres, que não vêem os 15 anos de políticas neoliberais se traduzirem em água potável, escolas e hospitais, têm simpatia pelas propostas de Humala, que promete rever os contratos de mineração e gás natural e impedir investimentos do rival Chile nos portos peruanos.
Mas, nos arredores de Chosica, na estrada que leva aos Andes, até os mais ardorosos seguidores de Humala temem que Chávez e Evo Morales sejam fardos pesados demais para a campanha.
- Eles estão fazendo muito mal a Humala - disse o indígena quéchua Osvaldo Landeo, que votou em García no seu primeiro governo (1985-90) e agora apóia Humala. - Ele poderia ter ganhado, mas vai perder - previu o desanimado e experiente Landeo, de 60 anos.
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