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Vizcachas

Rio coloca agricultores chilenos em pé de guerra com a Argentina: oposição a Boric quer processo em Haia

Leito do Vizcachas seco na região de Magalhães e da Antártida Chilena: produtores rurais e empresários chilenos argumentam que a alteração no fluxo do rio representaria uma violação de tratado entre os dois países (Foto: Reprodução/TV 24 Horas)

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Um rio que atravessa a Argentina e o Chile está sendo motivo de um constrangimento diplomático entre os dois países. No final de abril, o Ministério das Relações Exteriores do governo Gabriel Boric enviou aos argentinos um comunicado pedindo explicações sobre a vazão do rio Vizcachas, que nos últimos meses sofreu redução do lado chileno.

A chancelaria argentina confirmou na semana passada que pediu à Subsecretaria de Gestão e Planejamento de Projetos Hídricos do Ministério de Obras Públicas que forneça as informações solicitadas.

A polêmica começou em fevereiro, quando produtores rurais e empresários de Torres del Paine, na região chilena de Magalhães e da Antártida Chilena, denunciaram que o fluxo do rio, que nasce no sudeste da Argentina, em Santa Cruz, e segue até o território do Chile, havia secado completamente no lado chileno. O motivo seria uma série de obras no lado argentino.

Técnicos da Direção Nacional de Fronteiras e Limites do Estado (Difrol) visitaram uma fazenda na região e destacaram que a secagem do rio “não ocorre devido a causas naturais” e só poderia ser atribuída a alguma “intervenção” em território argentino.

Sergio Rodríguez Oro, advogado dos proprietários de uma fazenda local, disse ao jornal El Mercurio que “pela primeira vez na história o canal [do rio Vizcachas] secou”. “Concretamente, existem pelo menos seis obras que conduzem e desviam completamente a água a dezenas de quilômetros do canal”, destacou.

Os produtores rurais e empresários chilenos argumentam que a alteração no fluxo do rio representaria uma violação de um tratado ambiental, que inclui um protocolo sobre recursos hídricos compartilhados e foi assinado entre os dois países em 1991.

A subsecretária de Relações Exteriores do Chile, Gloria de la Fuente, disse em entrevista à Rádio Pauta que a resposta chilena, ao enviar o comunicado à Argentina, seguiu “os parâmetros da institucionalidade”. “Não passa disso, não tem nota de protesto. O que estamos fazendo é levantar os devidos antecedentes”, afirmou.

Entretanto, a oposição a Boric pediu uma postura mais dura do governo chileno. O deputado Christian Matheson, representante da região de Magalhães e da Antártida Chilena, sugeriu levar o assunto ao Tribunal de Haia.

“Isso não pode ficar só em um documento que tem pouco ou nenhum efeito. O que o Estado do Chile deveria exigir é que se interrompa qualquer intervenção no rio Vizcachas e se restabeleça o fluxo natural deste canal internacional, já que afeta não só os produtores rurais da região de Magalhães, mas também a flora e a fauna do entorno de Torres del Paine. Por isso, não se deve descartar ir ao Tribunal Internacional de Haia para restaurar o direito internacional, que hoje está afetado”, declarou Matheson.

“Eu me pergunto, o que a Argentina diria se interviéssemos no rio Rubens e no rio Penitente, que fazem parte do início do rio Gallegos na República Argentina?”, acrescentou.

A Comissão de Defesa da Câmara dos Deputados chilena informou que enviaria um ofício ao Ministério das Relações Exteriores para questionar a pasta sobre o ocorrido e sobre as ações que pretende tomar a seguir.

Carências expostas

Em artigo para o site El Mostrador, Jorge Guzmán, professor e pesquisador da Universidade Autônoma do Chile, disse que a polêmica sobre o rio Vizcachas não deve levar a uma crise bilateral entre os dois países, mas, no contexto do protocolo sobre recursos hídricos compartilhados de 1991, deixa claras “duas deficiências estruturais” da política externa chilena.

A primeira, segundo o pesquisador, é que nenhum órgão de Estado do Chile mantém monitoramento ou acompanhamento atualizado da aplicação dessa e de outras obrigações acordadas com a Argentina, com quem o país tem cerca de 5,3 mil quilômetros de fronteira comum.

“Com uma regularidade preocupante, essa deficiência acaba se tornando uma circunstância que ameaça os interesses do país”, disse Guzmán, citando o Acordo sobre o Campo de Gelo Patagônico Sul, de 1998, considerado lesivo para o Chile e que diz respeito a um dos maiores reservatórios de água doce do planeta.

O segundo ponto, destacou o pesquisador, é que o protocolo sobre recursos hídricos compartilhados conferiu à Argentina o poder de administrar bacias hidrográficas chilenas que somam cerca de 27% do território terrestre do país.

“Por outro lado, a maior parte dos recursos hídricos argentinos está concentrada nas fronteiras com Paraguai, Brasil e Uruguai; menos de 3% da água argentina pode ser cogerida com o Chile”, comparou.

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