O 20º Congresso do Partido Comunista da China (PCCh), que começa neste domingo (16) em Pequim, não deve ser um daqueles momentos que abrem uma era, mas sim um daqueles pontos na história que indicam uma escalada numa tendência há muito anunciada – e com consequências imprevisíveis.
Já se sabe desde pelo menos 2018, quando o Parlamento chinês aboliu o limite de mandatos presidenciais, que o ditador Xi Jinping, que está no poder desde 2013, não seguiria a tradição de deixar a presidência após dois mandatos de cinco anos e apontar um sucessor.
No evento da próxima semana, que vai reunir cerca de 2,3 mil delegados do PCCh, Xi deve ser reconduzido ao cargo de secretário-geral da legenda, para no começo de 2023 iniciar um inédito terceiro mandato na presidência chinesa.
Nos seus quase dez anos de governo, o ditador se tornou conhecido por um crescente autoritarismo e um caminho de culto à personalidade que o fizeram ser considerado o líder mais tirânico da China desde Mao Tsé-Tung.
“Ele pensa que o único instrumento com o qual pode governar a China internamente e obter ganhos no exterior é um Partido Comunista unificado, forte e poderoso. Então, ele assumiu a missão de fortalecer o partido sob seu governo. Xi se fortaleceu e fortaleceu o partido como um veículo para si mesmo”, disse Richard McGregor, membro sênior do Lowy Institute, da Austrália, à CNN.
A pretexto de combater a corrupção e evitar golpes de estado, Xi promoveu uma intensa perseguição dentro do PCCh, e depois levou essa visão autoritária para assuntos internos da China (o que incluiu a política econômica, com maior interferência no setor privado) e externos.
Alegando enfrentar o radicalismo e o terrorismo, perseguiu violentamente os uigures e outras minorias muçulmanas em Xinjiang, política que foi considerada genocida pelos Estados Unidos.
Em Hong Kong, a autonomia da região caiu por terra com a repressão a protestos e mudanças posteriores na legislação que serviram de base para perseguições contra políticos e ativistas pró-democracia, organizações da sociedade civil e a imprensa independente (que praticamente não existe mais).
Na política externa, os investimentos militares, a retórica cada vez mais agressiva contra Taiwan (que Pequim considera uma província rebelde, a ser reincorporada até 2049) e a aproximação com a Rússia, com quem aprofundou laços econômicos após a invasão do Kremlin à Ucrânia, afastaram ainda mais a China do Ocidente, com quem as relações já estavam abaladas devido às ações comerciais predatórias de Pequim.
A aproximação com governos latino-americanos e africanos, por meio dos investimentos em infraestrutura do programa Nova Rota da Seda e outras parcerias, aumenta a preocupação de Washington e aliados.
Curiosamente, Xi deve se tornar ainda mais poderoso no momento em que a economia do país, que transformou a China em protagonista na geopolítica mundial recente, vive seu pior momento em décadas.
Devido aos sucessivos lockdowns da política de Covid-zero e a outros fatores, como a seca que atingiu o país este ano, o PIB chinês deve crescer apenas 2,8% em 2022, segundo a previsão mais recente do Banco Mundial. Isso representaria o segundo pior resultado desde 1976 – o desempenho mais fraco foi o crescimento de 2,2% de 2020, primeiro ano da pandemia.
Mesmo com os sinais de insatisfação do povo chinês tomando as redes sociais (manifestações prontamente censuradas pelo PCCh) e os primeiros protestos surgindo, Xi não sinaliza abertura alguma – e muito menos que deixará o poder ao final dos próximos cinco anos.
“Ele cumprirá o terceiro mandato, mas as pessoas ficam tipo, bem, e daqui a cinco anos? E daqui a dez anos? Haverá um plano para a sucessão de Xi Jinping?”, questionou Victor Shih, especialista em política e finanças chinesas da Universidade da Califórnia, à NPR.