| Foto: Roberto Custódio / Gazeta do Povo / Arquivo

As autoridades russas atrapalham o trabalho de ONGs de prevenção da Aids por considerá-las “agentes do exterior”, apesar da ameaça de que a epidemia se agrave no país, onde há um milhão de soropositivos.

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Em junho, duas organizações passaram a integrar a lista desses agentes estrangeiros, um qualificativo que lembra o que era aplicado aos dissidentes na época soviética. Trata-de da ONG Esvero e da Fundação Andrei Rylkov, que há anos ajudam os doentes de Aids e a população mais vulnerável.

“Que tipo de agentes estrangeiros somos? Todos os dias vamos às ruas para ajudar nossos concidadãos que sofrem de dependência de drogas e que estão abandonados pelo Estado!”, afirma, indignado, Maxime Malychev, da Fundação Rylkov, na liderança do único programa de conscientização sobre os perigos da Aids para os toxicômanos em Moscou.

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Desde julho de 2012, uma lei russa obriga as organizações com financiamento estrangeiro e consideradas implicadas em uma “atividade política” a se registrarem como “agentes do exterior”.

Tais associações recebem mais multas e são expostas a auditorias com mais frequência. Na lista de “agentes do exterior” já figuram mais de 130 ONGs, cujas áreas de atuação vão desde os direitos humanos e a ecologia até a fotografia.

As organizações de luta contra a Aids não tinham sido afetadas até fevereiro deste ano, quando os tribunais qualificaram de “agentes do exterior” duas pequenas ONGs, uma na Sibéria e outra na região do Volga.

Meses depois, entraram na lista as duas principais ONGs moscovitas de luta contra a Aids, Esvero e a Fundação Rylkov.

“Já perdemos cinco colaborações com outras associações porque agora as pessoas têm medo”, declara Elena Romaniak, diretora de Esvero, que ficou sabendo da decisão judicial pela imprensa.

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Em 2014, as autoridades fizeram uma inspeção em todas as ONGs que trabalham com a prevenção da Aids, sem classificar nenhuma delas como “agente do exterior”.

A Esvero e a Fundação Rylkov vão recorrer da sentença. Ambas admitem receber dinheiro do exterior, principalmente do Fundo Global de Luta Contra Aids, Tuberculose e Malária, com o qual a Rússia colabora, mas afirmam que o fazem devido à indolência das autoridades.

“Gostaríamos de passar para um financiamento puramente russo, mas nossas cinco tentativas de petição de ajuda financeira pública foram rejeitadas”, explica Romaniak.

“O dinheiro público destinado à luta contra o HIV vai parar em organizações com poucos vínculos reais com a prevenção”, protesta Maxime Malychev.

‘Cada vez há mais doentes’

Os poderes públicos preferem se concentrar no tratamento da Aids, em vez de focar na prevenção.

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A Rússia proibiu a metadona (narcótico administrado como substituto da heroína) que, segundo muitos especialistas, reduz o risco de contágio, e também substituiu as campanhas informativas por apelos à abstinência.

Em junho, as autoridades proibiram a venda dos preservativos Durex alegando problemas com o registro sanitário.

A fundação da esposa do primeiro-ministro russo, Dimitri Medvedev, lançou em maio uma campanha preventiva, mas esta é insuficiente ante uma ameaça que pode se transformar em epidemia generalizada em cinco anos.

“Não podemos continuar com os métodos de luta atuais. O acesso aos cuidados é caro, cada vez há mais doentes”, afirma Elena Romaniak.

Atualmente há apenas algumas dezenas de ONGs ativas em cerca de 40 cidades russas com programas preventivos para os toxicômanos.

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Em 2015, o número de soropositivos ultrapassou um milhão, e mais de 200.000 deles morreram, segundo o centro federal russo de luta contra a Aids.

“Por que ninguém tem em conta o que está acontecendo?”, se pergunta Romaniak. “É como se as autoridades considerassem que não é problema delas”.