Análise
Exposição pública de diplomata sugere um propósito político
Para Mark Galeotti, professor da Universidade de Nova York, que estuda os serviços de segurança russos, a exposição pública do diplomata Ryan Fogle e as imagens divulgadas pela televisão russa sugerem que há um propósito político por trás de sua detenção. Segundo ele, este tipo de incidente com espiões acontece com alguma frequência, mas é raro que se faça tanto estardalhaço com algo no gênero.
"Geralmente, essas questões são tratadas com calma, a menos que se queira enviar uma mensagem", disse Galeotti. "Se você identifica um funcionário de uma embaixada que é um espião para o outro lado, o impulso natural é deixá-lo onde está porque, uma vez identificado, você pode manter o controle, ver com quem conversa e tudo mais. Não há razão para tanto estardalhaço, para detê-lo, expulsá-lo."
A Rússia e os Estados Unidos têm estado em desacordo ultimamente a respeito da Síria, da adoção de crianças russas por norte-americanos e as sanções de Washington contra autoridades russas por supostos abusos aos direitos humanos. Porém, Galeotti disse que o caso Fogle não deve afetar a cooperação entre as agências de contraespionagem dos Estados Unidos e da Rússia sobre o atentado contra a maratona de Boston e os dois suspeitos da ação.
"Todos os que compartilham informações de inteligência sabem que existe um processo paralelo no qual todos espionam todos sobre tudo", disse ele.
Agência Estado
Um diplomata norte-americano disfarçado com uma peruca loira foi pego em flagrante quando tentava recrutar um agente de contraespionagem russo em Moscou, informaram ontem os serviços de segurança da Rússia, afirmando que o representante diplomático é um funcionário da CIA (Agência Central de Inteligência, em inglês), órgão norte-americano de espionagem internacional.
Ryan Fogle, terceiro-secretário da embaixada dos EUA em Moscou, levava consigo equipamento técnico especial, disfarces, instruções por escrito e uma grande quantidade de dinheiro quando foi detido durante a noite, informou o Serviço Federal de Segurança (FSB, na sigla em inglês, agência que sucedeu a KGB) em comunicado. Fogle foi entregue a funcionários da embaixada norte-americana.
Segundo o FSB, Fogle tentava recrutar um agente de contraterrorismo russo especializado na região do Cáucaso, área do sul da Rússia que inclui a Chechênia e o Daguestão. Os suspeitos do ataque à Maratona de Boston eram chechenos e o mais velho dos irmãos, que morreu num confronto com a polícia, passou seis meses no Daguestão, que atualmente é um foco de insurgência islâmica.
Investigadores norte-americanos têm trabalhado com colegas russos para determinar se Tamerlan Tsarnaev havia estabelecido contatos com militantes que operam no Daguestão. Autoridades russas expressaram indignação ontem com o fato de os EUA realizarem operações de espionagem num período no qual os presidentes dos dois países trabalham para melhorar a cooperação de contraterrorismo.
Fogle foi declarado persona non grata e recebeu ordens para sair da Rússia imediatamente, informou o Ministério de Relações Exteriores russo. Ele tem imunidade diplomática, o que impede que seja preso.
Espionagem
Apesar do fim da Guerra Fria, Rússia e EUA ainda mantêm operações de espionagem um contra o outro. No ano passado, vários russos foram condenados em diferentes casos por espionar para os EUA e submetidos a longas sentenças de prisão.
A prisão de Fogle, porém, parece ser a primeira de um diplomata norte-americano acusado de espionagem em cerca de uma década e deve agravar as já tensas relações entre os dois países.
A televisão estatal russa mostrou fotografias de um homem identificado como Fogle, usando um boné, com o que parece ser uma peruca loira, de bruços, no chão. O homem, sem a peruca, também é mostrado sentado numa cadeira no escritório do FSB. Duas perucas e pacotes com notas de 500 euros estão entre os itens mostrados sobre uma mesa.
Russo ganharia até US$ 1 mi por ajuda
Das agências
A emissora estatal russa também mostrou uma carta descrita como instruções ao agente russo que era alvo da suposta tentativa de recrutamento. A carta, escrita em russo, é endereçada ao "amigo querido" e oferece US$ 100 mil para "discutir sua experiência, perícia e cooperação" e até US$ 1 milhão por ano por cooperação de longo prazo.
A carta também inclui instruções para a abertura de uma conta de e-mail no Gmail que seria usada para as comunicações e um endereço, para onde as mensagens seriam enviadas.
Ainda ontem, o Ministério de Relações Exteriores da Rússia informou que convocou o embaixador dos EUA, Michael McFaul, para explicar a situação. A chancelaria russa disse que Fogle deve retornar aos EUA "o mais rápido possível" e declarou que tais "atos provocativos no espírito da Guerra Fria de forma alguma ajudam a fortalecer a confiança mútua" entre Moscou e Washington.
A porta-voz do Departamento de Estado Jen Psaki confirmou que um funcionário da embaixada em Moscou foi detido por um breve período de tempo e depois liberado.
"Nós vimos o anúncio do Ministério de Relações Exteriores russo e não temos mais comentários a fazer neste momento", disse Psaki, que está na Suécia com o secretário de Estado John Kerry. A CIA se recusou a comentar o caso.
Pouco se sabe sobre Fogle, que é terceiro-secretário, um posto de início de carreira no Departamento de Estado, o nível mais baixo do serviço diplomático.
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