A Rússia anunciou na terça-feira (4) que os navios que transportam grãos a partir de portos da Ucrânia devem deixar o Mar Negro antes que expire, no dia 17 deste mês, o acordo de Istambul. O país liderado por Vladimir Putin considera que “não há fundamentos” para uma nova prorrogação do pacto.
"A parte russa continua abordando de maneira muito consciente e responsável suas obrigações como parte do acordo, fazendo os esforços necessários no rígido cumprimento das regras de procedimento, para que todos os navios que participam possam completar com sucesso sua missão e deixar o Mar Negro antes que expire sua vigência", indicou o Ministério das Relações Exteriores russo.
Em um comunicado, a chancelaria russa destacou ser "óbvio que não há razões para seguir com a iniciativa do Mar Negro", pactuada há um ano, com a mediação da Turquia e da Organização das Nações Unidas (ONU), para permitir a exportação de alimentos ucranianos em meio à guerra, com o objetivo de garantir a segurança alimentar mundial.
A Rússia destacou que o acordo não pode ser prolongado sem o consentimento de todas as partes, ou seja, do próprio país, além de Ucrânia e Turquia.
Moscou reiterou que a iniciativa, cujo propósito era garantir assistência aos países necessitados de África, Ásia e América Latina "tornou-se uma exportação puramente comercial de alimentos ucranianos para países bem alimentados". cidade ucraniana que fica às margens do Mar Negro,
A Rússia alega que, das 32,6 milhões de toneladas de cereais exportados a partir dos portos de Odessa, Yuzhni e Chornomorsk (cidades ucranianas na costa do Mar Negro) desde 1º de agosto do ano passado, 81% foram enviadas para nações com receitas altas ou média-altas, enquanto apenas 2,6% chegaram a nações pobres, como Etiópia, Iêmen, Afeganistão, Sudão e Somália.
Além disso, segundo destacou a chancelaria russa, o memorando entre Moscou e a ONU para a formalização das exportações de produtos agrícolas e fertilizantes russos, projetado há três anos, "continua se degradando".
Esse pacto não requer nenhuma decisão especial sobre sua extensão, mas, como não é “cumprido”, na opinião da Rússia, Moscou também não “deve renovar o acordo” sobre a exportação dos grãos ucranianos.
A diplomacia russa destacou que, desde julho de 2022, a União Europeia (UE) lançou cinco novos pacotes de sanções contra Moscou, enquanto persistem as restrições extraterritoriais "cada vez maiores" de Estados Unidos e Reino Unido, que bloquearam as exportações russas.
As exigências das Rússia para manter a iniciativa eram a reconexão do seu banco agrícola (Rosseljozbank) ao sistema internacional Swift, o levantamento de sanções sobre a reposição para maquinário agrícola, o desbloqueio da logística de transporte e seguros, o descongelamento de ativos e a retomada do duto de transporte de amônia Togliatti-Odessa, que explodiu em 5 de junho.
"Falamos de um amonioduto pelo qual eram bombeados, anualmente, cerca de 2 milhões de toneladas de matéria-prima para a produção de fertilizantes suficientes para alimentar 45 milhões de pessoas", ressaltou a chancelaria russa.
A nota informou ainda que, das 262 mil toneladas de fertilizantes russos previstas para doação a países necessitados, só foram enviados dois lotes desde setembro de 2022, para o Malaui (20 mil toneladas) e para o Quênia (34 mil toneladas), ambos países situados no continente africano.
A ONU, segundo a Rússia, "permanece em silêncio" sobre o assunto, enquanto o Ocidente "declara publicamente que não pode relaxar as sanções, inclusive, sobre alimentos e fertilizantes".
ONU tenta convencer a Rússia a estender acordo com a Ucrânia
Nesta quarta-feira (5), a ONU afirmou que continuará seus esforços para fazer com que a Rússia concorde em estender o acordo que permite a exportação de grãos da Ucrânia para os mercados internacionais, embora reconheça que há "problemas a serem resolvidos" em relação à exportação de alimentos e fertilizantes russos, uma questão que faz parte do acordo.
"Sem dúvida, nossos esforços possibilitaram avanços em muitas questões, como os entraves à exportação de grãos e fertilizantes, que foram apresentados pela Rússia, mas ainda há problemas com as movimentações financeiras de seu banco agrícola", disse à EFE a chefe da Conferência da ONU Sobre Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD, sigla em inglês), Rebeca Grynspan, que representa a entidade nessas negociações.
O governo russo acredita que não há razão para estender o acordo porque os problemas para suas próprias exportações não foram resolvidos, embora o porta-voz do Kremlin tenha relativizado esses comentários nesta quarta-feira, apontando que o Ocidente ainda tem alguns dias para resolver esses “obstáculos”.
De acordo com a UNCTAD, o acordo facilitou a exportação de mais de ‘32 toneladas de alimentos da Ucrânia para 45 países em três continentes”, ao mesmo tempo em que permitiu que países da “África subsaariana e nações menos desenvolvidas de outras regiões recebessem uma quantidade de trigo semelhante ao período pré-guerra na Ucrânia”.
Como destacou o Ministério das Relações Exteriores russo na terça-feira, as exigências da país consistem na reconexão de seu banco agrícola, o Rosseljozbank, ao sistema bancário internacional SWIFT e na retomada do duto de transporte de amônia Togliatti-Odessa. No entanto, a titular da UNCTAD reconheceu, que persistem obstáculos no que diz respeito ao Rosseljozbank e ao duto de transporte de amônia.
Em relação aos avanços, Grynspan garantiu que há melhorias no acesso de países terceiros às exportações alimentares da Rússia via Europa, no descongelamento de alguns ativos de empresas russas (nos setores dos fertilizantes e de alimentos, que não são afetados por sanções internacionais) e no acesso e redução dos preços dos seguros das embarcações do país.
"Os preços dos seguros das companhias de navegação para produtos russos caíram, embora não para o nível que eles gostariam", comentou.
Grynspan argumentou que as próprias associações russas de produtores de grãos e fertilizantes publicaram números mostrando que desde julho de 2022 (quando o acordo foi assinado) as exportações aumentaram.
"Estamos onde gostaríamos de estar? Não, ainda há problemas a serem resolvidos", ressaltou ela, que não descartou uma viagem a Moscou em breve para tentar convencer o governo de Putin a levar adiante o acordo.