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Cuba

Saúde precária, ânsia por liberdade: o que levou os cubanos a protestar contra a ditadura

protestos cuba
Policiais prendem manifestantes em frente ao capitólio de Cuba durante os protestos de 11 de julho em Havana. (Foto: Ernesto Mastrascusa/Agência EFE/Gazeta do Povo)

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Cuba viveu neste domingo (11) um dia sem precedentes em sua história recente. Milhares de cubanos saíram nas ruas de várias cidades do país, de forma espontânea, para clamar por liberdade, no que já está sendo considerada a maior manifestação contra a ditadura castrista em 60 anos.

Gritos de “Cuba livre”, “Pátria e Vida” e “Basta de mentiras” foram entoados por cubanos cansados com o cerceamento à liberdade, com a escassez de alimentos e remédios, os apagões, a elevada inflação, o aumento de casos de Covid-19 e os constantes cortes de conexão da internet.

“Em meus 53 anos, nunca vi nada igual”, disse ao site de notícias cubano 14yMedio um morador de Santiago de Cuba que se juntou às manifestações. Outro manifestante, morador de San Antonio de los Baños, disse à BBC Mundo que o protesto “é pela liberdade do povo”. “Queremos uma mudança, não queremos mais ditadura”.

Os protestos começaram pacíficos, mas a resposta do regime comunista foi violenta. Centenas de pessoas foram presas, levadas em veículos da polícia ou sem qualquer identificação por membros de forças de segurança à paisana. Também há relatos na imprensa independente de várias pessoas que apanharam de policiais e apoiadores do regime, inclusive dois jornalistas da Associated Press.

Em rede nacional de televisão, o secretário-geral do Partido Comunista de Cuba e líder do país, Miguel Díaz-Canel, apelou aos seus aliados que lutem contra os manifestantes. “A ordem do combate é dada: às ruas os revolucionários”, disse neste domingo (11). E ainda acrescentou: “Terão que passar por cima de nossos cadáveres se querem enfrentar a revolução. Estamos dispostos a tudo”.

A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) recebeu denúncias de uso da força, prisões, ataques a manifestantes e jornalistas e cortes no sinal da Internet. A Anistia Internacional e a Organização dos Estados Americanos (OEA) também condenaram a violência estatal. Díaz-Canel deu de ombros a esses comentários dizendo nesta segunda-feira que os manifestantes “tiveram a resposta que mereciam”, referindo-se a eles como “delinquentes”.

O agravamento das condições econômicas e de saúde na ilha e o aumento das prisões arbitrárias de artistas cubanos são alguns pontos importantes para entender o pano de fundo dos protestos.

Crise econômica

Em 2019, Cuba já vinha sofrendo com uma grave crise econômica, influenciada por três fatores principais: a queda da produção de petróleo na Venezuela; o fim do “programa mais médicos” em vários países – que também tem relação com a crise venezuelana; e as sanções impostas pelos EUA durante o mandato de Donald Trump.

Com a pandemia, o fechamento de fronteiras afetou drasticamente o setor de turismo na ilha, uma das principais fontes de entrada de divisas no país. Isso levou o regime a implantar uma reforma econômica no começo deste ano que acabou disparando a inflação, muito acima do aumento salarial. Além de pagar mais caro por alimentos, os cubanos precisam enfrentar grandes filas para comprar itens de necessidade básica. Os cortes de energia, um problema que sempre afligiu os moradores da ilha, passaram a ser mais frequentes.

Além disso, Cuba registrou neste ano uma das piores safras açucareiras de sua história. A colheita de cana-de-açúcar foi apenas 66% do estimado de 1,2 milhão de toneladas para a safra, de acordo com o grupo açucareiro estatal Azcuba.

Crise sanitária

A pandemia e falta de dinheiro também se refletiram no sistema de saúde cubano. O país está sofrendo com uma preocupante escassez de medicamentos: as despensas de farmácias e hospitais da ilha estão praticamente vazias e a população está mais vulnerável do que nunca a doenças como diabetes, artrite e sarna. Algumas pessoas se veem pressionadas a contrabandear medicamentos essenciais.

O agravamento da pandemia de Covid-19 também está pressionando os hospitais. Na semana passada o país registrou recordes diários de novos casos, segundo dos dados oficiais. Com isso, surgiram vários relatos na internet e na imprensa independente de cubanos reclamando da qualidade do atendimento aos pacientes, da falta de leitos e de respiradores, especialmente na província de Matanzas, no litoral norte da ilha.

Em um vídeo publicado recentemente nas redes socais, um morador denunciou que sua mãe morreu de Covid-19 depois que ele passou quatro dias tentando, sem sucesso, transferi-la para um hospital. Denúncias semelhantes também foram feitas na imprensa internacional. A situação sanitária nesta região obrigou o regime a enviar para lá reforços de médicos e enfermeiros.

De acordo com a plataforma Our World in Data, Cuba é o país americano que mais registrou casos de Covid-19 por milhão de habitantes neste domingo: foram 6.750 casos, embora opositores de denunciem que os números oficiais são subnotificados. No mesmo dia, 31 pacientes cubanos faleceram em decorrência da doença.

Repressão

Apesar das restrições de acesso à internet impostas pela ditadura, mais cubanos estão usando as redes sociais para ter uma fonte de informação diferente da oficial e até mesmo para denunciar as mazelas do país. Um exemplo desta mudança é a grande popularidade da canção “Patria y Vida”, gravada por vários artistas cubanos em fevereiro que questiona o governo comunista e denuncia a crise política e econômica da ilha. Os protestos deste domingo também são um exemplo: a adesão de milhares de cubanos em várias cidades do país veio depois que as imagens de um ato contra o regime em San Antonio foram divulgadas nas redes sociais.

Isso, porém, fez a ditadura castrista aumentar a repressão a jovens, artistas, ativistas e jornalistas independentes, que são impedidos de se reunir e de se manifestar livremente, e também enfrentam vigilância e assédio policial. A ONG Prisoners Defenders afirma que o número de prisioneiros políticos em Cuba é o maior em 18 anos. Um relatório da organização divulgado em 1º de junho atesta que há 150 presos e condenados políticos no país.

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