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Se a África prosperar, a dieta vai melhorar?

A maioria dos africanos depende basicamente do amido para sobreviver. Produtores ruandeses cultivam produtos básicos, como arroz, que alimentam doze milhões de pessoas | Ben Curtis/Associated Press
A maioria dos africanos depende basicamente do amido para sobreviver. Produtores ruandeses cultivam produtos básicos, como arroz, que alimentam doze milhões de pessoas (Foto: Ben Curtis/Associated Press)

Durante décadas, os países africanos foram os retardatários da economia mundial, mas, ao longo dos últimos dez anos, a renda per capita do continente cresceu a um nível quase idêntico ao do resto do mundo.

O que nos leva a imaginar que o continente está nos estágios iniciais de uma trajetória que pode se assemelhar a da América Latina ou, mais ambiciosamente, algumas partes da Ásia. Com o mundo vivendo uma das maiores reduções estendidas de pobreza já registrada, a África finalmente faz parte da história. Uma classe média começa a surgir na África Ocidental, de Gana e Nigéria a Angola. Países extremamente pobres, como Etiópia e Libéria, estão progredindo rapidamente.

Com as mudanças no continente surgem as mesmas questões que confrontam o resto do mundo em desenvolvimento, principalmente em relação aos alimentos: será o crescimento econômico duradouro e inclusivo a ponto de acabar com o efeito trágico da fome? Os africanos que hoje vivem praticamente só de amido, como o da mandioca, poderão ter uma alimentação mais variada e nutritiva? No continente que deve sofrer as piores consequências das mudanças climáticas, como os produtores vão sobreviver? A Fundação Bill & Melinda Gates, que doou mais de US$3 bilhões para a agricultura africana, há pouco anunciou seus planos para os próximos quinze anos, entre eles programas para ajudar a África a se alimentar.

Atualmente, os agricultores ali são bem menos produtivos que os de outras regiões do mundo, obtendo menos de vinte por cento da colheita de milho de um norte-americano, por exemplo. A fundação pretende financiar mais pesquisas científicas, novos programas para disseminá-las, melhores condições de armazenamento e mais celulares. Em sua carta anual, os Gates escreveram: "Um setor agrícola mais eficiente pode levar à redução maciça da pobreza e melhorar a qualidade de vida em todo o continente". A preocupação com a disponibilidade de alimentos vem de longe, e não só na África. O ponto-chave que tornou o artigo de Thomas Malthus famoso, em 1798, dizia que a produção alimentar crescia aritmeticamente enquanto a população aumentava geometricamente, condenando assim a espécie humana a um futuro tenebroso.

Acontece que os frutos da engenhosidade humana também se desenvolveram geometricamente, com rapidez suficiente para manter o ritmo do crescimento populacional, pelo menos. A fatia do ganho que as sociedades dedicam à comida caiu drasticamente, mesmo com a população mundial já batendo em 7,3 bilhões.

Bill e Melinda Gates estão bem otimistas. "A vida das pessoas nos países pobres vai melhorar mais rapidamente nos próximos quinze anos do que em qualquer outro período da história", eles escreveram.

Quando falei com eles, há pouco tempo, perguntei por que a produção de alimentos estava entre seus novos objetivos – afinal, em geral, as economias de mercado conseguem produzir o suficiente, pelo menos nos países em crescimento.

Mencionei também Paul Ehrlich e sua famosa aposta de US$10 mil com o economista Julian Simon, em 1980, sobre o preço da cesta básica. Ehrlich achava que os custos subiriam até 1990, sinal de que os recursos não conseguiriam manter o ritmo do crescimento populacional; Simon pensava o contrário – e ganhou.

"Ele achava que o ser humano tinha que mudar para inovar", disse Bill Gates. Na verdade, a mudança não é predeterminada; de fato, ela acontece muito mais em algumas sociedades que em outras – devido, segundo ele, a pessoas e instituições que romperam as barreiras ao progresso.

Em termos da agricultura africana, elas incluem estradas estreitas demais para o transporte rápido dos grãos, falta de conhecimento sobre o desenvolvimento das plantações em relação ao local e escassez de informações básicas – de preços de mercado, por exemplo – que prejudicam os produtores. "Eles viram reféns do intermediário; se tiverem um celular, conseguem se manter informados", explicou Bill.

É muito cedo para saber se os esforços da Fundação Gates na África darão frutos.

As mudanças climáticas, se ignoradas, representam graves perigos para todos, mas grande parte do planeta está aproveitando um dos aumentos mais rápidos na prosperidade global de todos os tempos: desde 1990, a expectativa de vida subiu mais de seis anos.

Como Bill Gates diz: "O fato é que o mundo está melhorando muito; o que estamos fazendo é tentar facilitar o progresso e a possibilidade de fazer mais".

Ela, sem dúvida, existe, mas em várias questões, fazer mais e melhor vai exigir mudanças. O avanço não é inevitável só porque já aconteceu antes.

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