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Eleições

Violência, corrupção e relações com os EUA: os três desafios do futuro presidente mexicano

Andrés Manuel Lopez Obrador, líder nas pesquisas para as eleições presidenciais no México, durante o encerramento da sua campanha | Alejandro Cegarra/Bloomberg
Andrés Manuel Lopez Obrador, líder nas pesquisas para as eleições presidenciais no México, durante o encerramento da sua campanha (Foto: Alejandro Cegarra/Bloomberg)

O México vive uma situação desafiadora. E não é por causa do jogo contra o Brasil, nas oitavas de final da Copa, na segunda-feira, em Samara (Rússia). Mergulhada em uma violência crescente, motivada pelo narcotráfico, e com corrupção galopante, a segunda maior economia da América Latina vai às urnas, neste domingo, para escolher o próximo presidente.

O líder nas pesquisas é Andrés Manuel Lopez Obrador, ex-prefeito da Cidade do México e uma figura enigmática. Segundo o jornal americano Washington Post, tanto pode ser um reformador pragmático, como se mostrou no comando de uma das maiores cidades do mundo entre 2000 e 2005, como um demagogo populista, como tem se mostrado na campanha eleitoral. 

O barômetro eleitoral da Bloomberg aponta que ele tem a preferência de 51,2% dos eleitores, mais do que o dobro do segundo colocado, Ricardo Anaya, ex-presidente da Câmara de Deputados e representante do Partido de Ação Nacional (centro-direita), que esteve no poder entre 2000 e 2012. 

“O futuro presidente vai enfrentar uma série de problemas: a violência, os problemas gerados pela corrupção, e as relações com Estados Unidos”, diz Pablo Calderon-Martinez, professor da Universidade de Aston (Inglaterra). 

 Corrupção 

 O México é o sexto pior país das Américas em percepção da corrupção, segundo dados da Transparência Internacional. E, no mundo, ocupa a 135° posição entre 180 países. Numa escala que vai de zero (pior resultado) a 100, ele obteve 29 pontos. Só para comparar, o Brasil está na 96° posição, com 36 pontos. “Houve uma grande expansão durante o atual governo”, destaca Luis Gómez Romero, professor da Universidade de Wollongong (Austrália). 

Segundo a Freedom House, uma organização dedicada à promoção da democracia e dos direitos humanos, escândalos envolveram funcionários de alto escalão ligados ao Partido Revolucionário Institucional (PRI), atualmente no poder. E não há sinais de que isso vá mudar. A criação de um sistema de combate à corrupção foi paralisada no ano passado. 

Ativistas da sociedade civil e jornalistas têm sido vítimas de tentativas de espionagem em suas comunicações eletrônicas, provavelmente por parte de agências governamentais, aponta a organização. A situação dos jornalistas não é confortável.

Segundo a Economist Intelligence Unit (EIU), que produz o Índice da Democracia, a imprensa mexicana, em grande parte, não é livre. O Comitê de Proteção de Jornalistas (CPJ) aponta em 2017 foram mortos seis jornalistas em função de seu trabalho. Mas outra organização, a Article 19, que defende a liberdade de expressão no mundo, fala em números maiores: 11, fazendo com que 2017 fosse um dos piores anos para os profissionais da mídia no país. 

 Violência e narcotráfico 

A violência é uma das grandes preocupações no México. Segundo dados do Sistema Nacional de Segurança Pública, em 2017, aconteceram 25,3 mil homicídios, 23,2% a mais do que no ano anterior. “O governo fracassou por completo por não ter nenhuma estratégia de combate”, diz Calderon-Martinez, da Universidade de Aston.

O tema era uma das principais promessas de campanha de Enrique Peña Nieto, o atual presidente. Em 2012, ele disse que mudaria a estratégia de combate ao narcotráfico, marcada pela forte violência. Ele prometeu reduzir à metade o número de assassinatos ao longo de seu mandato. Mas, na realidade, cresceu 18% nesse período, de acordo com dados do Sistema Nacional de Segurança Pública. 

Uma das razões para esta expansão, apontam os professores, foi a manutenção da estratégia de militarização no combate aos cartéis da droga. Esse procedimento começou a ser adotado no governo de Felipe Calderon, que foi presidente entre 2006 e 2012. “O exército é feito para a luta, para o confrontamento. E isso teve amplo impacto negativo”, avalia Romero. Ao mesmo tempo, aponta que o orçamento das polícias municipais e estaduais encolheu, o que dificultou o acesso a treinamentos mais modernos. 

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O resultado desse cenário é que o narcotráfico pode ter um papel nas eleições locais. As eleições podem ser uma das mais violentas da história. Segundo o Washington Post, entre setembro e maio, foram assassinados, pelo menos, 36 candidatos. Os homicídios também atingem outros políticos e funcionários da campanha eleitoral. “Se o candidato não agrada ao narcotráfico, ele é morto”, afirma o professor da universidade australiana. Segundo ele, o estado mexicano está perdendo o monopólio de ser a força pública. 

Para piorar mais a situação, há uma fragilidade da Justiça mexicana. “Não há processos justos”, diz Calderon-Martinez. A Freedom House aponta que o judiciário mexicano é dominado por atrasos, imprevisibilidade e corrupção, o que acaba contribuindo para a impunidade. 

Relações com os Estados Unidos 

Outro dos grandes desafios do futuro presidente mexicano será o relacionamento com Donald Trump, não acostumado às tradições diplomáticas e defensor de uma abordagem mais pessoal com os líderes de outros países.

Há, também, muita mágoa contra ele por parte dos mexicanos. Na campanha eleitoral americana, o republicano acusou o México de enviar criminosos, como estupradores, e drogas aos Estados Unidos. E, também, sugeriu que o México pagasse pela construção de um muro da fronteira entre os dois países para inibir a entrada de imigrantes. 

O americano quer rever o NAFTA, o acordo de livre comércio que os Estados Unidos têm com o Canadá e o México. A justificativa é que teria favorecido os dois países em detrimento dos Estados Unidos, que estaria gerando menos oportunidades de trabalho. E, em um capítulo da guerra comercial, a maior economia mundial impôs tarifas ao aço e ao alumínio importados do México. Em contrapartida, o país latino-americano retaliou, sobretaxando produtos siderúrgicos e agrícolas que vem do outro lado da fronteira. 

O acordo de livre comércio, que foi implantado em 1994, trouxe benefícios para a economia mexicana. Os maiores, conforme Romero, foram o crescimento econômico e a criação de empregos. Dados do Fundo Monetário Internacional (FMI) mostram que desde a implantação do NAFTA, o PIB mexicano cresceu 70%. A movimentação comercial entre os dois países superou os US$ 610 bilhões no ano passado, segundo o US Bureau of Economic Analysis. 

Um dos motivos da preocupação de Trump, é que a balança comercial é favorável aos mexicanos. O saldo foi de US$ 68,7 bilhões e vem aumentando desde 2013. Os principais produtos que os americanos compram do México são carros, autopeças e motores. Eles correspondem a um terço das importações. 

O NAFTA teve um impacto psicológico sobre os mexicanos, diminuindo o antiamericanismo na população local. “Os Estados Unidos deixaram de ser enxergados como uma nação hostil, mas desde que Trump se candidatou à Casa Branca, essa situação mudou”, diz Romero, da Universidade de Wollongong. 

O ponto de inflexão foi o convite que o presidente Peña Nieto fez, durante a campanha eleitoral americana, em 2016, para que os dois principais candidatos – Trump e a democrata Hillary Clinton – visitassem o país. Apenas o republicano compareceu. “Logo depois veio o episódio dele chamando os mexicanos de criminosos. Foi uma humilhação internacional.” As declarações foram mal recebidas e tiveram um impacto negativo para o atual líder mexicano 

A crise na política migratória pode aumentar a margem de negociação do México com os Estados Unidos. O país é ponto de passagem para guatemaltecos, hondurenhos e salvadorenhos que tentam fugir da violência em seus países. Eles ficam, muitas vezes, esperando dias ou semanas no lado mexicano para poderem entrar nos EUA e requerer asilo. O impacto é a ampliação das pressões sociais em um país que já é marcado pela desigualdade social. 

“A questão migratória é uma situação delicada para o presidente americano. Em algum momento ele terá de negociar sobre isso com o México”, acredita o professor da universidade de Aston. Mas, por enquanto, não há nada em vista.

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