Logo que a crise da concentração de tropas russas na fronteira com a Ucrânia começou, no ano passado, um ano veio imediatamente à cabeça de quem acompanha geopolítica internacional: 2014.
Foi quando a Rússia anexou a península ucraniana da Crimeia e apoiou os separatistas que declararam as repúblicas de Donetsk e Lugansk, localizadas na região do Donbass, no leste da Ucrânia – este, um conflito que permanece até hoje. Os dois movimentos ocorreram após a destituição de um governo ucraniano pró-Moscou, que os russos ainda consideram um golpe de Estado.
O embaixador russo na ONU, Vassili Nebenzia, disse no final de janeiro que os Estados Unidos foram os responsáveis pela deposição em 2014 da gestão simpática ao Kremlin, o que, segundo ele, levou ao poder “nacionalistas, radicais, russófobos e nazistas puros”.
Esta semana, com acusações de quebra do cessar-fogo entre Ucrânia e os separatistas pró-Rússia, temeu-se que Moscou tivesse encontrado o pretexto para uma invasão da ex-república soviética que os Estados Unidos e seus aliados denunciam há semanas que Vladimir Putin vem procurando.
Independente disso, o episódio serviu para lembrar: assim como a maior parte da população ucraniana é favorável à entrada do país na União Europeia (58% manifestaram essa posição em pesquisa divulgada em dezembro pelo International Republican Institute) e na Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan, com uma hipotética adesão respaldada por 54%), esta a desculpa oficial para a escalada militar de Putin, que alega que visa apenas a autodefesa, também há gente dentro da Ucrânia que torce pelo presidente russo.
Oficialmente, Putin segue sendo favorável ao cumprimento dos Acordos de Minsk, para a resolução do conflito no leste da Ucrânia, em referência aos documentos que reconhecem como parte do vizinho os territórios que o governo de Kiev não controla. A Rússia, assim como todos os outros países integrantes da ONU, nunca reconheceu as duas repúblicas.
Entretanto, essa posição e o apoio russo aos separatistas não são contraditórios, porque a intenção de Moscou é que os acordos deem status especial à região de Donbass para que atenda a interesses russos, como veto à entrada ucraniana na Otan.
Embora Putin negue que apoie militar e financeiramente os separatistas, sua relação com eles é escancarada. No início da semana, a Duma, a câmara baixa do Parlamento russo, controlada pelo presidente, aprovou um pedido para que Putin reconheça a independência das autoproclamadas repúblicas populares de Donetsk e Lugansk.
A Rússia entregou mais de 700 mil passaportes a cidadãos destas duas regiões, e o presidente já chegou a descrever que está ocorrendo “genocídio” contra os separatistas em Donbass.
Segundo reportagem do site Politico, em dezembro, os dois principais líderes separatistas, Denis Pushilin, de Donetsk, e Leonid Pasechnik, de Lugansk, participaram em Moscou do congresso anual do partido de Putin, o Rússia Unida, e se filiaram à legenda.
“Após o colapso da União Soviética, milhões de russos se viram fora de sua pátria histórica, tornando-se cidadãos de um estado criado artificialmente”, declarou Pushilin na semana passada. “No início dos anos 90, assim que a Ucrânia surgiu, os habitantes de Donbass tiveram que lutar por seus direitos devido à política ativa de ucranização.”
Ou seja, ao invés de criar duas repúblicas independentes, o objetivo explícito é uma anexação pela Rússia, a exemplo do que ocorreu na Crimeia. Sergei Harmash, jornalista de Donetsk que representa a Ucrânia no Grupo de Contato Trilateral sobre a Ucrânia, disse ao Politico que as duas “‘repúblicas’ são completamente dirigidas por Moscou”.
“Hoje, todos os líderes, agentes de segurança e funcionários das ‘administrações’ da República de Donetsk também têm passaportes russos. Todos eles declaram constante e abertamente a adesão à Rússia como seu objetivo. Isso contradiz completamente os objetivos dos Acordos de Minsk”, alegou.
Essa fidelidade a Moscou pode ser útil a Putin em caso de uma invasão da Ucrânia. Um ex-separatista russo, que em entrevista à Al Jazeera se identificou apenas como Fiodor, disse que não pretende voltar ao front, mas que o movimento contrário à autoridade de Kiev pode se expandir.
“Se uma guerra estourar, espero que pelo menos cheguemos à Carcóvia”, afirmou, se referindo à segunda maior cidade da Ucrânia e capital da região homônima, vizinha de Donetsk e Lugansk. “Noventa e nove por cento da população de lá já nos apoia, de qualquer maneira.”
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