O Serviço Postal dos EUA, equivalente aos Correios no Brasil, passou a estar no centro da briga partidária sobre as eleições gerais de 3 de novembro no país. Os democratas do Congresso estão exigindo que o diretor da empresa estatal, Louis DeJoy, testemunhe diante dos legisladores ainda neste mês sobre o que eles dizem ser “uma sabotagem” do sistema de votação por correspondência, orquestrada pela Casa Branca.
Contexto
Os democratas defendem que a votação por correspondência seja adotada em larga escala por causa da pandemia de Covid-19 no país, enquanto os republicanos alegam que, se isso acontecer, o processo eleitoral estará sujeito a fraudes - seriam as eleições mais fraudadas da história, segundo Trump.
Essa divisão tem raízes mais profundas: tradicionalmente, os democratas defendem acesso mais facilitado às urnas e os republicanos, o contrário, com base na premissa de que uma participação maior dos eleitores beneficiaria o Partido Democrata.
Apesar desse fundamento, um pequeno estudo feito por pesquisadores da Universidade de Stanford, com base em três estados que adotam a votação por correspondência em maior escala do que no resto do país, concluiu que a prática não parece aumentar o percentual de votos em favor de nenhum dos dois partidos, embora aumente modestamente a média de participação geral.
Entenda como funciona o voto por correio nos EUA.
Judicialização
A diferença de posicionamento sobre a votação por correspondência levou o assunto para a esfera judicial. Enquanto alguns governadores e autoridades democratas começaram a permitir que todos os eleitores registrados recebam uma cédula de votação em casa para votar pelo correio, o Comitê Nacional Republicano, a campanha de Trump e grupos conservadores abriram processos para tentar bloquear essas medidas, alegando que os democratas estariam mudando regras eleitorais sem a devida consideração.
Fraudes
Especialistas em eleições americanas alertaram sobre o risco de possíveis fraudes nas votações por correio quando todos os eleitores registrados recebem uma cédula porque, ao tirar do cidadão a responsabilidade de solicitar o papel de votação, elimina-se algumas das barreiras do processo eleitoral que garantem que o eleitor ainda está vivo, apto a votar e ainda vive no mesmo endereço. Havaí, Colorado, Oregon, Utah e Washington já adotam esse sistema. Por causa da pandemia, Nevada, Vermont, Califórnia e o Distrito de Columbia também passaram a enviar cédulas a todos os eleitores registrados. Apesar das preocupações, considera-se que o sistema de votação por correspondência seja praticamente imune a fraudes.
O Serviço Postal
Foi neste cenário em que a empresa estatal que presta o serviço postal durante as eleições avisou 46 estados e o Distrito de Columbia que não conseguirá garantir que todos as cédulas de votação cheguem a tempo de serem incluídas nas urnas. Isso significa que, mesmo que sigam todos as regras, muitos eleitores correm o risco de não ter seu voto contado na eleição se optarem pela modalidade de voto por correio.
Os democratas já estavam de olho na atuação do Serviço Postal antes disso. No início de agosto, a líder da Câmara de Deputados, Nancy Pelosi, afirmou que a empresa estatal havia reduzido horas extras, restringido viagens extras para entregas de correspondências e reduzindo equipamentos de processamento - medidas confirmadas pelo chefe da empresa, Louis DeJoy. Aliado de Trump, ele assumiu a agência, que há anos está mal financeiramente, com a promessa de torná-la mais eficiente, aumentando o escrutínio sobre as operações da empresa, impondo restrições sobre traslados e reduzindo a quantidade de postos de processamento de cartas.
Fazendo aumentar as especulações da oposição sobre um ação coordenada entre a Casa Branca e o Serviço Postal, Trump disse na semana passada que se opõe ao financiamento emergencial para a agência por causa dos esforços dos democratas em expandir a votação por correspondência - eles querem que o Executivo entre com US$ 25 bilhões para fortalecer o Serviço Postal.
“O presidente declarou explicitamente sua intenção de manipular os Correios para negar aos eleitores aptos o acesso à cédula em busca de sua própria reeleição”, escreveram os democratas em uma declaração conjunta divulgada neste domingo (16). Eles ainda disseram que DeJoy é um “mega doador” da campanha de Trump e que ele "agiu como cúmplice na campanha do presidente para trapacear na eleição", lançando "novas mudanças operacionais abrangentes que degradam os padrões de entrega e atrasam as entregas de correspondência". Por isso os democratas querem que DeJoy testemunhe diante o Congresso.
Pelosi também convocou sessão extraordinária da Câmara - que está em recesso neste mês de agosto - para discutir a elaboração de um projeto de lei proibindo o Serviço Postal do país de realizar mudanças operacionais neste ano.
Afinal, votação universal por correio é necessária?
O candidato democrata Joe Biden afirmou recentemente que a votação por correspondência é a única forma de garantir uma eleição segura em meio à pandemia de Covid-19. Contudo, Anthony Fauci, diretor do Instituto Nacional de Alergia e Doenças Infecciosas e uma das lideranças em saúde mais respeitadas dos EUA, afirmou que “não há razão” pela qual os americanos não possam votar presencialmente nas eleições de 3 de novembro, contanto que sigam as regras de distanciamento e uso de máscaras.
“Se você vai e usa uma máscara, se observa o distanciamento físico e não há uma situação de aglomeração, não há razão para que [as pessoas] não sejam capazes de fazer isso”, disse Fauci à ABC News, citando o exemplo de como os supermercados vem funcionando desde que a pandemia começou.
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