O aviso era para que todos ficassem em casa, evitar ao máximo sair às ruas, não se expor a um risco desnecessário. Mas como fazer isso depois de uma noite que passou entre ligações para amigos e parentes para saber se todos estavam salvos, notícias que insistiam em aumentar a quantidade de mortos e de feridos? Sair de casa era uma necessidade.
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Leia a matéria completaComo em qualquer tragédia, o que mais choca é observar que, apesar da barbárie, a vida continua. As pessoas vão ao supermercado, à farmácia ou à padaria. Mas o silêncio insistente mostrava que aquele sábado não era igual aos outros.
Depois de avisar os amigos que estava saindo de casa e estabelecer uma rede de contatos para ser avisada caso algo de mais grave eclodisse, finalmente saí. Mas só depois de prometer para todo mundo que, sob hipótese alguma, pegaria o metrô. Muita gente pensou a mesma coisa e as Velibs, as eficientes bicicletas que podemos alugar para andar por Paris, ocupavam as ruas da cidade.
Segui pelas avenidas do 12° arrondissement, rumo à Place de la Bastille. Lojas fechadas, pouca gente na rua. O objetivo era chegar à região dos ataques, nos 10° e 11° arrondissements. De longe já dava para ver as dezenas de furgões de televisão, muitos jornalistas e fotógrafos, além de inúmeros anônimos que tentavam avistar além do bloqueio policial a casa de show Bataclan, como que para tentar acreditar realmente na tragédia que assolou aquela região poucas horas antes.
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Leia a matéria completaE, mais uma vez, o que chocava era o silêncio. Centenas de pessoas e quase ninguém falava.
A calçada livre de repórteres e furgões virou um altar improvisado. Uma moça me deixou fazer uma foto para depois acender uma vela e chorar por alguém que não conseguiu sair dali com vida.
Voltei para a bicicleta. Andei pelas margens do Canal Saint Martin. Nova aglomeração de pessoas, desta vez sem as equipes de TV. Outro cordão de isolamento policial e mais homenagens a outras vítimas, desta vez de uma pizzaria. Os vidros com marcas de bala impressionam quem passa. Uma lavanderia vizinha também foi alvejada.
Em frente ao Café Carillon e ao restaurante Petit Cambodge, a cena é ainda mais triste. Um mar de flores e velas enfeitam as fachadas ainda marcadas pelas balas dos fuzis dos terroristas. Três crianças estão ao lado da mãe colocando flores para alguma vítima. Mais silêncio que se interrompe com uma mulher que chega com uma vela e chora desesperadamente. Os curiosos ao redor se calam. Os fotógrafos aproveitam as lágrimas dela para registrar de alguma forma o tamanho da tristeza.
Como não acontecia desde o início do ano, policiais e soldados armados com fuzis andam pelas calçadas. No fim de janeiro, quando cheguei em Paris, o clima de tensão decorrente aos atentados ao jornal Charlie Hebdo ainda pairava no ar e estes mesmos policias faziam rondas nas estações de metrô. Vê-los de volta às ruas traz o mesmo sentimento de insegurança, insistindo em relembrar o que aconteceu e o medo de que algo igual ou pior volte a ocorrer.
A noite vai chegando e sigo de bicicleta. Sábado à noite e aquela animação tão típica de Paris não está no ar.
A prefeita Anne Hidalgo decidiu materializar a dor que assola a França: nessa noite, a Torre Eiffel não brilhou. A cidade-luz apagou seu símbolo mais precioso como forma de retratar um pouco da estupefação que toma conta da cidade.
Testemunhar esta tragédia em Paris dá medo pelo que pode acontecer. Sinônimo de alegria, festa e liberdade, Paris está apagada. Nenhum museu ou ponto turístico abriu no fim de semana. Flanar por Paris deixou de ser um prazer. A gente só torce para que seja por pouco tempo.
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