São Paulo A abrupta aceleração do aquecimento global ao longo dos últimos anos tem feito cada vez mais cientistas alertarem para a urgente necessidade de se desenvolver fontes alternativas de energia, capazes de evitar uma catástrofe ambiental precipitada pela queima de combustíveis fósseis. Ao mesmo tempo, o teste nuclear promovido pela Coréia do Norte em 9 de outubro de 2006 e as suspeitas em torno da finalidade do programa de enriquecimento de urânio do Irã trazem de volta o fantasma de uma possível corrida armamentista de conseqüências imprevisíveis, especialmente quando se leva em conta que pelo menos três países fabricam armas atômicas, apesar de não serem signatários do Tratado de Não-Proliferação Nuclear (TNP): Paquistão, Índia e Israel. Os israelenses não admitiam isso abertamente, mas sua situação foi posta às claras pelo próprio primeiro-ministro, Ehud Olmert. O chamado "ato falho", cometido no fim do ano passado, custou a Olmert a desaprovação de seu próprio gabinete.
Os acontecimentos recentes realimentam a discussão sobre o uso da energia nuclear, mundialmente satanizada por causa das sucessivas mostras de como ela pode ser nociva à humanidade e ao ambiente quando mal utilizada ou precariamente monitorada.
Tragédias
Os exemplos negativos mais notórios são os ataques aéreos norte-americanos contra as cidades japonesas de Hiroshima e Nagasaki, no fim da Segunda Guerra, os acidentes nas usinas atômicas de Three Mile Island (nos Estados Unidos, em 1979) e Chernobyl (na Ucrânia, em 1986) e a disputa armamentista travada entre os Estados Unidos e a extinta União Soviética ao longo da Guerra Fria.
Rogério Cezar de Cerqueira Leite e José Goldemberg, duas das maiores autoridades brasileiras na questão nuclear, têm pontos de vista pragmáticos sobre o ressurgimento da corrida nuclear e suas conseqüências futuras. Para o professor Goldemberg, apenas a vontade política seria capaz de impedir que um país com reatores nucleares buscasse dessas aplicações militares desses instrumentos. "Do ponto de vista técnico, a produção da energia nuclear, tanto com o enriquecimento de urânio quanto com o tratamento dos resíduos radioativos, permite o desenvolvimento de armas nucleares. Então é preciso que haja um esquema complicadíssimo de fiscalização por parte da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), o que cria problemas políticos, como no caso do Irã, ao passo que não se tem garantias de que um determinado país não vá deslocar seu foco para a produção de armas nucleares", explica ele.
Sem impedimento
"A única coisa que impede um país que tenha energia nuclear de aproveitá-la para produzir armas é sua vontade política. O Brasil, por exemplo, conta com dois reatores e enriquece urânio. O que impede o Brasil de produzir armas nucleares é a resolução política de não desenvolvê-las. Do ponto de vista técnico, não há barreiras. O Japão possui muitos reatores nucleares e o que o impede de produzir armas nucleares é sua política", justifica o professor Goldemberg, secretário de Meio Ambiente de São Paulo.
O professor Rogério Cezar de Cerqueira Leite diz não se considerar no direito de desconfiar dos esforços dos países desenvolvidos e também da preocupação de que quem domina essa tecnologia está próximo de fazer uma bomba.
"O enriquecimento de urânio é um passo fundamental para isso", lembra. Existem outros roteiros tecnológicos que dispensam o enriquecimento para se fazer uma bomba nuclear. Entretanto, o enriquecimento também é fundamental para o desenvolvimento das tecnologias usuais, não bélicas", contemporiza.
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