O tiroteio na escola em Parkland, na Flórida, provocou um grande salto no debate sobre o controle de armas nos Estados Unidos, dando a ativistas esperança de que os políticos possam estar dispostos a tomar algum tipo de ação bipartidária - já que as tomadas até então têm sido insuficientes para prevenir os tiroteios em massa.
Os estudantes que sobreviveram ao massacre na escola secundária Marjory Stoneman Douglas na quarta-feira passada agora estão elevando o tom para falar sobre controle de armas, exigindo que nenhum outro aluno enfrente um destino semelhante. Eles esperam ser o catalisador que vai acabar com os posicionamentos inflexíveis em relação a armas na sociedade americana - e parece que Washington está prestando atenção no que eles estão dizendo.
O presidente Donald Trump disse na segunda-feira (19) que está disposto a melhorar o sistema de verificação de antecedentes usado para pesquisar aqueles que compram armas de fogo no país, uma medida que tem apoio de Democratas, Republicanos e da Associação Nacional de Rifles da América (NRA). Trump falou sobre a legislação com um dos autores do projeto, Senador John Cornyn (Republicano/Texas), na sexta-feira (16).
O senador Marco Rubio (Republicano/Flórida) disse que apoia leis que garantam medidas preventivas para restringir a violência armada, as quais permitem que as armas de fogo sejam apreendidas antes que uma pessoa cometa um ato violento. Tais leis estão ganhando apoio de conservadores após o massacre de Parkland que matou 17 pessoas - a maioria adolescentes.
"O apoio de Trump à Lei FixNICS [pune agências governamentais que não passarem informações ao sistema nacional de checagem de antecedentes criminais] é outro sinal de que as políticas para contenção da violência armada estão mudando rapidamente", disse o senador Chris Murphy (Democratas/Connecticut) na segunda-feira. Entretanto ele também afirmou que o projeto de lei por si só não é uma resposta adequada para os tiroteios em massa.
Estudantes mobilizados
Estudantes estão convocando políticos e a NRA nas redes sociais, na televisão e em protestos, para exigir leis que ajudem a manter as armas fora das mãos de pessoas como Nikolas Cruz, o suposto atirador. Cruz, um jovem de 19 anos considerado violento, supostamente levou um rifle a escola secundária Douglas no dia dos namorados (Valentine’s Day é comemorado no dia 14 de fevereiro nos EUA) e começou a efetuar disparos sem aviso prévio. Um estudante que sobreviveu ao tiroteio prometeu não voltar às aulas até que as leis de armas mudem.
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Desde o tiroteio a NRA não não comentou o caso.
Cruz comprou pelo menos 10 armas, incluindo uma semelhante ao AK-47, de acordo com um policial a par da investigação. As autoridades ainda estão investigando como ele conseguiu essas armas, mas todas as que foram rastreadas até agora foram adquiridas legalmente pelo jovem. Cruz comprou legalmente o rifle AR-15, que supostamente usou no tiroteio, há cerca de um ano, segundo as autoridades.
"Em nenhum momento ele foi impedido de comprar armas de fogo por causa de seu histórico criminal e verificação de antecedentes", disse o policial.
O presidente do grupo de controle de armas Everytown for Gun Safety, John Feinblatt, espera que o massacre possa estimular um acordo bipartidário em relação às medidas de segurança no controle de armas.
Para Feinblatt os Estados Unidos esperam que seus líderes trabalhem juntos,"mas se não o fizerem, os estados vão tomar a iniciativa e o público americano vai garantir que vejamos um novo Congresso". O grupo tem uma nova campanha chamada Throw Them Out (Tire eles de lá, em tradução livre), com o objetivo de minar a candidatura de políticos que, segundo eles, estão ligados ao lobby das armas.
Cinco estados - Califórnia, Washington, Oregon, Indiana e Connecticut - aprovaram leis que garantam medidas preventivas, as quais permitem que armas de fogo sejam temporariamente confiscadas de pessoas que a justiça considere uma ameaça para si ou para outros. Em nível nacional, a senadora Dianne Feinstein (Democratas/Califórnia) e o deputado Salud Carbajal (Democratas/Califórnia) apresentaram uma legislação no ano passado solicitando que os Estados adotem tais leis.
Pelo menos 18 estados, incluindo a Flórida, têm projetos similares pendentes em suas legislaturas. Não está claro se tal lei impediria Cruz de comprar uma arma, especialmente porque ele nunca foi condenado por um crime e porque o Departamento de Crianças e Famílias da Flórida determinou que ele não representava riscos.
As falhas do Congresso
Para o governador Rick Scott (Republicano) "todas as opções são consideradas" quando o controle de armas está em debate na Flórida, embora ele não tenha sequer falado se apoia a legislação que prevê as medidas preventivas. A Flórida possui uma das leis de controle de armas mais brandas dos Estados Unidos, além de uma legislatura pró-arma. Há muito tempo o estado é visto como um laboratório de leis pelo direito às armas, que são posteriormente testadas em outros estados.
Estudantes da Douglas planejaram uma manifestação em frente à sede do governo da Flórida nesta quarta-feira (22). O deputado Carlos Curbelo (Republicano/Flórida), em entrevista à ABC, elogiou os estudantes pelo seu ativismo.
"Herdamos esse mundo de escolhas binárias, onde queremos revogar a Segunda Emenda ou não ter regulamentos de segurança para armas, mas as gerações mais jovens não vêem o mundo desse jeito", disse Curbelo.
"Há muitos republicanos que estão preparados para apoiar leis razoáveis e de bom senso que protejam os direitos dos cidadãos responsáveis, dos donos de armas responsáveis, mas que evitarão aqueles que querem prejudicar pessoas inocentes de obter armas", continuou ele.
O gabinete do governador da Flórida comunicou que organizou reuniões com líderes estaduais e locais para discutir melhorias na segurança escolar e maneiras de manter as armas longe de pessoas que possuem doenças mentais.
Inspiração
Muitos acreditam que os alunos da Douglas estão fazendo a diferença na conversa em nível federal.
"Essas crianças, esses adolescentes estão inspirando o país e estão responsabilizando os adultos de uma maneira que eu não acho que já vimos antes", disse Robin Lloyd, diretor de relações institucionais da Giffords, uma organização pró controle de armas. "Acho que isso é uma mudança de paradigma em relação a outros tiroteios que já vimos no passado, e é realmente corajoso que esses jovens exijam uma ação do governo e estejam tão envolvidos com isso, especialmente com tudo o que eles acabaram de passar ".
Mas também há ceticismo de que mais um massacre mudará substancialmente o debate sobre armas no país, que é profundamente político. Curbelo é um dos autores de um projeto de lei que proibiria os bump stocks, dispositivos que fazem um rifle semiautomático se comportar como uma arma totalmente automática, disparando tiros mais rapidamente. Eles foram usados em outubro por Stephen Paddock, no atentado que matou 58 pessoas e feriu mais de 500 em um show de música country em Las Vegas.
Uma coalizão bipartidária no Congresso e a NRA quase imediatamente afirmaram que os dispositivos devem estar sujeitos a regulamentos adicionais. Legisladores republicanos passaram a bola para o Departamento de Álcool, Tabaco, Armas de Fogo e Explosivos, que afirmou não poder regulamentar bump stocks, a menos que o Congresso altere a lei - a questão está sob revisão administrativa. Foram propostos projetos de lei no Senado e na Câmara para proibir completamente os bump stocks, mas nenhum foi aprovado. A NRA se opõe às medidas.
“Sempre há uma chance de o Congresso fazer algo", disse Lloyd. "Mas eles já provaram uma e outra vez que não irão agir".
Mesmo que o Congresso atue, muitos acreditam que uma ação efetiva só será tomada em nível estadual. Pelo menos 15 estados estão considerando leis que proíbem os bump stocks. Massachusetts e New Jersey os proibiram após o tiroteio de Las Vegas, e na Califórnia eles já eram ilegais.
Existe agora a esperança de que leis que garantam medidas preventivas para restringir a violência armada, também conhecidas como mandados de proteção de extremo risco, ganhem impulso nos legislativos estaduais.
"É uma lei que permite o devido processo e dá às famílias e à polícia ferramentas para que seja possível eliminar as armas de uma tragédia antes que uma tragédia ocorra", disse Andrew Patrick, porta-voz do grupo Coalition to Stop Gun Violence.
Patrick disse que é "um enorme avanço" o fato de Rubio apoiar estas leis e de haver um artigo na revista National Review pedindo que os republicanos apoiassem as medidas propostas.
O governador do Ohio, John Kasich (Republicano), disse em uma entrevista à CNN que gostaria de ver algo semelhante às leis de ordem preventiva - mas sem apoiá-las especificamente - e que agora é hora para Trump e o Congresso aprovarem medidas de "senso comum", como aumentar o rigor das verificações de antecedentes.
"Esta é uma oportunidade", disse Kasich. "E acredito que aqueles que são defensores da Segunda Emenda percebem que reformas reais de senso comum podem acontecer neste país para responder aos gritos e à angústia de pessoas em todo o país que perderam as pessoas que amavam".
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