O Parlamento do Sri Lanka elegerá um novo presidente interino no próximo dia 20. Por pressão popular, o atual presidente do país, Gotabaya Rajapaksa, e o primeiro-ministro cingalês, Ranil Wickremesinghe, prometeram renunciar na próxima quarta-feira (13). O anúncio foi feito no sábado (09) em resposta às manifestações que se agravaram no último fim de semana, depois de meses de protestos intensos no país.
Manifestantes ainda ocupam a residência e o gabinete de Rajapaksa, além da casa de Wickremesinghe, que foi incendiada. Eles afirmam que só sairão quando o presidente e o primeiro-ministro deixarem o poder.
A oposição ao governo incentiva os protestos e teme que o anúncio de demissão tenha sido feito apenas para ganhar tempo na busca de soluções. “O presidente Rajapaksa deve honrar seu compromisso e pedir demissão, se quiser resolver a crise política que impede qualquer progresso na resolução da crise econômica do país”, disse Vijitha Herath, parlamentar do partido National People’s Power [Partido do Poder Popular], em entrevista coletiva.
Crise econômica
O país vive a pior crise econômica da história do país e, em maio, registrou inflação recorde pelo oitavo mês consecutivo, No mesmo mês, o índice de preços de consumo da capital do país (CCPI, na sigla em inglês) aumentou 39,1% e a inflação dos alimentos atingiu 57,4%.
Desde o começo do ano, há cortes de eletricidade no país, que duram até 13 horas por dia, além de filas de espera nos postos de gasolina. Isso se deve à alta inflação e ao derretimento das reservas internacionais do país, situação que leva também à falta de outros produtos essenciais como medicamentos e comida.
Especialistas apontam o principal erro na gestão da ilha de 22 milhões de habitantes: em abril do ano passado, o governo de Gotabaya Rajapaksa proibiu a importação e o uso de fertilizantes e pesticidas sintéticos e ordenou que a produção nacional seja feita exclusivamente de produtos orgânicos no prazo máximo de 10 anos.
Em entrevista à Gazeta do Povo, a analista de mercado da AgRural, Daniele Siqueira, explicou que “o experimento ambiental reduziu a atividade econômica e criou despesas extras, reforçando problemas econômicos e, de quebra, aumentando a insegurança alimentar”.
A iniciativa reduziu a produção agrícola, obrigando o país a importar alimentos que antes não importava e a reduzir as exportações de produtos agrícolas que até então garantiam a entrada de divisas. O programa foi cancelado em algumas culturas, mas as consequências dele se manifestam na pior crise desde a independência da Grã-Bretanha, em 1948.
Além disso, recentemente o governo aumentou as taxas e impostos em todas as áreas. A iniciativa reforçou as manifestações pedindo a demissão do presidente do Sri Lanka.
Crise política
Com a intensificação dos protestos, Rajapaksa decretou estado de emergência no país, permitindo que militares usassem a força para conter as manifestações. Em entrevista coletiva, a embaixadora americana para o país, Julie Chung, anunciou preocupação em relação ao decreto, afirmando que o Sri Lanka precisa de ações a longo prazo para controlar a crise.
A União Europeia também se pronunciou, opinando que o posicionamento do presidente poderia ser “contraprodutivo”. Sob pressão popular, no dia 9 de maio, o primeiro-ministro cingalês, Mahinda Rajapaksa, também irmão do atual presidente, renunciou ao cargo.
Apesar do anúncio de renúncia do presidente e do primeiro-ministro ser uma resposta positiva aos protestos, está longe de ser uma resolução para a crise política do país.
De acordo com a constituição local, se o presidente e o premiê renunciam, quem assumiria interinamente seria o presidente do Parlamento, Mahinda Yapa Abeywarda, mas os legisladores não concordaram em nomeá-lo. No domingo, políticos se reuniram na tentativa de formar uma coalizão para um governo temporário, mas nenhum acordo foi firmado.
Nesta segunda-feira, Abeywarda fez um comunicado, informando que, após formalizada a renúncia de Rajapaksa, a Câmara receberá as nomeações em 19 de julho, e, no dia seguinte, um novo presidente interino.
O cientista político cingalês Jayadeva Uyangoda acredita que a crise social só se apaziguará com novas eleições definitivas, devido à desconfiança política da população. “O Parlamento precisa refletir a opinião da sociedade”, opina o analista ao jornal Le Monde, alertando também sobre a necessidade do novo governo de fazer uma negociação emergencial com o Fundo Monetário Internacional (FMI).