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Apoiadores do presidente interino Juan Guaidó participam de manifestação em Caracas, 11 de maio
Apoiadores do presidente interino Juan Guaidó participam de manifestação em Caracas, 11 de maio| Foto: YURI CORTEZ / AFP

Esperando no aeroporto de Caracas, ao lado de uma pilha de malas que continham todos os seus pertences, Mercedes Vasquez não chorou.

Ela olhava fixamente para o chão enquanto tentava processar tudo: que estava deixando a Venezuela, sua casa por mais de seis décadas, e não sabia quando voltaria. Que ela não tinha um plano concreto para quando chegasse à Espanha, o país onde nasceu em 1959 e de onde fugiu quando criança, após a Guerra Civil Espanhola.

Ela não queria ir. Mas aos 70 anos, com problemas cardíacos e em meio à crise política e humanitária desencadeada pelo regime de Nicolás Maduro, ela sentiu que não tinha escolha.

"Eu posso viver sem arroz. Eu posso viver sem farinha", Vasquez contou mais tarde. "Mas o que estava me matando era ver meu país desmoronando dia após dia, vendo pessoas comendo de latas de lixo, vagando de farmácia em farmácia à procura de remédios. Era terrível."

No aeroporto, no outono de 2018, ela temia que os guardas a barrassem por algum motivo arbitrário. "Eles podem dizer coisas como: 'Você tem bolsas sob seus olhos, então você deve estar drogada. Vamos levar você para o hospital'". "Mas eles a deixaram passar. Nove horas depois, Vasquez desembarcou em Madri, uma cidade que ela não via desde que era jovem.

Caminho de volta

Enquanto refugiados e exilados venezuelanos chegavam em peso a países vizinhos na América do Sul e na América Latina, a Espanha emergiu como o destino escolhido por muitos venezuelanos, incluindo aqueles cujas famílias a deixaram sob a ditadura de Francisco Franco.

O número de pessoas da Venezuela que vivem na Espanha mais do que dobrou nos últimos cinco anos, de acordo com o Instituto Nacional de Estatísticas da Espanha. Muitos dos recém-chegados podem reivindicar cidadania espanhola com base em sua ascendência. Outros se inscreveram para o programa "visto de ouro" da Espanha, que concede residência a qualquer pessoa que invista mais de US$ 560.000 em imóveis. E aqueles com recursos mais limitados podem solicitar asilo. De fato, nos últimos três anos, os venezuelanos lideraram a lista de solicitantes de asilo na Espanha – foram apresentados mais de 19.000 pedidos de asilo de venezuelanos no ano passado.

Para aqueles que conseguem ficar, o idioma comum e as semelhanças culturais podem ajudar a facilitar a transição. Alguns venezuelanos também estão se reunindo com familiares que ficaram na Espanha ou que os precederam lá. Vasquez, por exemplo, reuniu-se com sua filha adulta, que decidiu anos antes que queria experimentar a vida na Espanha e, desde então, teve seus próprios filhos.

Ainda assim, pode ser difícil reconectar-se com uma pátria que por tanto tempo era pouco mais do que uma lembrança distante.

"Tenho um certo sentimento pela Espanha – os serviços sociais, a qualidade de vida", disse Vasquez, sentada em um café em Madri no mês passado. "Mas eu não gosto de futebol e não gosto de touros. Não gosto de comer em um bar. Vou morrer venezuelana."

Crueldade das ditaduras

Como Vasquez, Sebastian de la Nuez nasceu na Espanha – no seu caso, em 1953 – e partiu com sua família para a Venezuela durante os anos de Franco.

De la Nuez fez a viagem de volta em outubro de 2016. Pouco antes de sua partida, ele disse, ele testemunhou um confronto com a polícia estatal venezuelana logo em frente à janela de seu apartamento. "Eles atiraram em estudantes", lembrou.

Ele disse que seus anos na Venezuela de Maduro não deixaram dúvidas em sua mente sobre a crueldade inerente a uma ditadura de qualquer tipo. "É contra o projeto humano."

Mas seu pai serviu Franco por um breve período, e de la Nuez viajou recentemente para Ferrol, a pequena cidade na Galícia onde Franco nasceu e onde sua casa de infância é frequentemente vandalizada. O que ele estava procurando, exatamente, não sabia dizer.

"Voltar para a Espanha despertou algo em mim", disse ele. "Meu pai nunca quis falar sobre isso."

'Startup' diplomática

Representantes diplomáticos da oposição também estão entre a comunidade de imigrantes venezuelanos na Espanha. Eles estão trabalhando para polir a reputação internacional de Juan Guaidó, que foi reconhecido como o presidente legítimo do país por uma série de nações estrangeiras, incluindo Brasil, Estados Unidos, Espanha, França e Reino Unido.

O problema, disse William Davila, embaixador de Guaidó em Viena e professor de economia em Madri, é que enquanto os países europeus deram seu apoio a Guaidó, eles ainda reconhecem os embaixadores e embaixadas de Maduro.

"Minha resposta para isso é que eles não representam ninguém", disse ele sobre os representantes de Maduro. "Nós já sabemos que qualquer coisa que eles dizem é uma mentira."

Enquanto isso, a equipe Guaidó funciona como uma startup, disse ele. "Meus escritórios são os maravilhosos cafés vienenses. E meus motoristas são motoristas do Uber."

Antonio Ecarri Bolívar, embaixador de Guaidó na Espanha, disse: "A Espanha estabelece o ritmo das relações com a Venezuela na Europa. Por isso, estamos pressionando a Espanha para finalmente nos reconhecer como embaixadores [da Venezuela], para que os outros países europeus também o façam. Esperamos que seja em breve, porque a situação venezuelana não pode durar muito tempo".

Ecarri disse que o governo espanhol permitiu que ele representasse a crescente população venezuelana na Espanha, negociando o uso interno de passaportes venezuelanos expirados como identificação legal e gerenciando bebês nascidos na Espanha e a capacidade de suas famílias de registrar seus nascimentos legalmente.

Ecarri aponta os laços históricos e culturais entre a Espanha e a Venezuela.

"É incomum que uma família na Espanha não conheça alguém que foi para a Venezuela e prosperou. E muitos dos que retornaram à Espanha voltaram com fortunas", disse Ecarri. "A Venezuela sempre foi um país que acolheu a imigração. Nunca a emigração. Esta é a primeira vez na história venezuelana que há um êxodo e as pessoas estão deixando a Venezuela. Durante os 40 anos de democracia, as portas foram abertas para imigrantes e eles prosperaram porque era um país próspero".

Por enquanto, no entanto, existe a memória do lar e também a esperança do que aquele lar pode um dia se tornar.

"É um sentimento", disse de la Nuez. "Eu estava andando em uma rua outro dia, e foi a coisa mais estranha – pareceu-me que era idêntica à uma rua de Caracas. Eu sonho muito frequentemente com Caracas."

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