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As primárias eleitorais da Carolina do Sul, realizadas no sábado (29), foram um ponto de virada para Joe Biden na disputa pela nomeação democrata à presidência. Em menos de quatro dias, o pré-candidato, que vinha tendo desempenhos pífios nas três primeiras prévias eleitorais, passou a liderar a corrida interna do partido.
Impulsionado por uma grande vitória na Carolina do Sul e pelo apoio de dois importantes pré-candidatos desistentes, Amy Klobuchar e Pete Buttiegeg, Biden conseguiu superar o senador Bernie Sanders, que vinha liderando a disputa até então, ao conquistar pelo menos nove dos 14 estados que votaram nesta Superterça (3).
O número de delegados projetado até o momento mostra uma clara liderança de Biden (305 contra 243). Mas isso não quer dizer que este seja o fim da linha para Sanders. O pré-candidato autodeclarado “socialista democrata” está com uma boa vantagem sobre Biden na Califórnia, onde estão sendo disputados 415 delegados. Junto com a vitória que obteve em Nevada, isso demonstra a força de Sanders no oeste americano.
Na próxima terça-feira (10), outros estados da região votam: Washington e Idaho, onde serão alocados 109 delegados. Também vão às urnas os eleitores democratas de estados que Sanders ganhou de Hillary Clinton em 2016: Michigan (125 delegados) e Dakota do Norte (14 delegados). Como a corrida democrata ficará depois disso ainda está para ser visto.
No fim de março, quando mais de dois terços dos 3.979 delegados em disputa já terão sido designados, ficará mais fácil ter uma imagem de como vai terminar a convenção nacional democrata, que ocorre entre 13 e 16 de julho.
Decisões de última hora
Dois fatores impulsionaram a virada de Biden nesta Superterça: os eleitores afro-americanos, que formam uma boa parte do eleitorado democrata, e aqueles que decidiram seus votos de última hora.
Em primeiro lugar, foram os afro-americanos que proporcionaram a vitória de Biden na Carolina do Sul - e, portanto, sua sobrevida na disputa. Ele é querido por essa porção do eleitorado especialmente por sua atuação como vice do ex-presidente Barack Obama, o primeiro presidente negro dos Estados Unidos, embora Sanders tenha um amplo apelo entre os mais jovens. Mulheres que vivem em subúrbios também são mais propensas a votar em Biden. Na Carolina do Norte, por exemplo, onde esses dois estratos da população são mais relevantes, a vantagem de Biden sobre Sanders foi de 20 pontos percentuais.
Após a vitória de Biden na Carolina do Sul, dois importantes candidatos moderados desistiram da disputa. O ex-prefeito de South Bend, Indiana, Pete Buttigieg e a senadora Amy Klobuchar passaram a endossar a campanha de Joe Biden neste domingo (1º), em uma tentativa de unir os moderados em torno de um só nome para evitar uma vitória do radical Bernie Sanders na convenção nacional do Partido Democrata.
Essas notícias promissoras sobre a campanha do ex-vice-presidente fizeram com que boa parte do eleitorado que estava em dúvida sobre em quem votar optasse, de última hora, por Biden. Segundo analistas, esses eleitores são mais pragmáticos e consideram que Biden, neste momento, pode ter mais chances de vencer o republicano Donald Trump na eleição presidencial de 3 de novembro.
Sanders e o apoio dos jovens
As primárias democratas realizadas até agora mostram que a base de apoio do candidato socialista Bernie Sanders está no eleitorado jovem e latino, além dos brancos com maior nível educacional.
No Texas, apesar de ter perdido para Biden, o senador ganhou em condados ao longo da fronteira com o México, onde a população latino-americana é maior. Sua vitória em Nevada, que tem uma grande eleitorado latino-americano, é outro exemplo. Sanders tem como uma de suas promessas de campanha reverter imediatamente as políticas anti-imigração implementadas pela gestão Trump, que inclui também uma moratória temporárias nas deportações “até que uma auditoria completa de práticas e políticas passadas seja concluída”. Outras promessas de campanha, como o Medicare For All, também têm boa aceitação entre os latinos.
O eleitorado jovem, da mesma maneira, é uma peça importante da campanha de Sanders. Nos comícios que realizou até agora, grande parte do público tinha menos de 30 anos. Ele também conta com o apoio da jovem deputada Alexandria Ocasio-Cortez, que se conecta com este eleitorado de maneira única nas redes sociais, por meio de lives informais - uma maneira de aproximação que, inclusive, foi elogiada recentemente pelo ex-estrategista da campanha de Trump, Steve Bannon.
Esse apoio, em parte, se explica pela promessa de “revolução” que Bernie Sanders prega. Muitos jovens estão começando sua independência financeira em um cenário pós-crise econômica mundial menos promissor do que viveram as gerações anteriores e enfrentam dificuldades para conseguir uma casa própria, bancar as despesas com saúde e pagar uma faculdade. Eles também não viveram o período da Guerra Fria e parecem não se importar tanto quanto os eleitores mais velhos com o termo “socialista” usado por Sanders.
Porém, apostar no eleitorado jovem pode se mostrar arriscado para a campanha de Sanders, porque historicamente eles não têm um grande percentual de comparecimento nas urnas.
Elizabeth Bishop, professora de estudos da juventude na City University de Nova York, citou ao Business Insider pelo menos duas barreiras que dificultam a mobilização dos jovens nos dias de votação: uma de nível logístico, porque essa faixa etária tende a mudar de cidade com mais frequência e a cada mudança precisa de registrar novamente para votar; e outra que se dá pelas próprias regras das primárias em alguns estados, que não permitem a participação de eleitores não filiados aos partidos, como em Nova York.
Nesta Superterça, pesquisas de boca de urna revelaram que apenas 1 em cada 8 eleitores tinha entre 18 e 29 anos de idade. Por outro lado, quase dois terços tinham 45 anos ou mais e cerca de 3 a cada 10 tinham 65 anos ou mais, segundo o Washington Post.
Bloomberg e Warren
O bilionário ex-prefeito de Nova York Michael Bloomberg, que gastou US$ 500 milhões em três meses de campanha, teve um desempenho abaixo do esperado - o que também acabou beneficiando Biden, já que ambos competem como moderados. Ele ficou com menos de 15% dos votos no Alabama, Maine, Massachusetts, Minnesota, Carolina do norte, Oklahoma, Virginia e Vermont, o que pode ser explicado, em parte, pelo seu péssimo desempenho nos dois debates de que participou nas últimas semanas.
Com o resultado, o empresário decidiu, nesta quarta-feira (4), abandonar a corrida presidencial e apoiar Biden.
"Três meses atrás, entrei na corrida para derrotar Donald Trump. Hoje vou embora pela mesma razão. Derrotar Trump começa com a união pelo candidato com a melhor chance de fazê-lo. Está claro que este candidato é o meu amigo e um grande americano, Joe Biden", escreveu Bloomberg no Twitter.
Após a Superterça, analistas da política americana estão questionando a viabilidade da campanha de Elizabeth Warren, que ficou em terceiro lugar em seu próprio estado natal, Massachusetts. O coordenador da campanha da senadora, Roger Lau, enviou um e-mail à equipe agradecendo pelo trabalho de todos, mas reconhecendo que ficaram "muito aquém das metas e projeções de viabilidade" e que estão "decepcionados com os resultados".
Warren está revendo a sua participação na corrida democrata e, se optar por sair, tende a ajudar Sanders, já que os dois possuem plataformas eleitorais parecidas, como o apoio ao Medicare for All e ao Green New Deal.
Independentemente de qual seja a decisão da senadora, a Superterça mostrou que, a partir de agora, a nomeação democrata é uma disputa de dois homens: Biden e Sanders.