Após os surpreendentes resultados das eleições britânicas de quinta-feira (8), a primeira-ministra conservadora, Theresa May, deve tentar salvar seu cargo ao formar uma aliança com um pequeno partido norte-irlandês. O Partido Conservador recebeu 318 assentos, mas é necessário ter ao menos 326, que no Parlamento correspondem à metade dos 650 disponíveis mais um. A imprensa local afirma que May travou um acordo com o DUP (Partido Unionista Democrático), da Irlanda do Norte, que tem 10 assentos. Em segundo lugar, o Partido Trabalhista, terá 261 cadeiras.
Não estão claros os termos das negociações e que contrapartida os norte-irlandeses esperam. Os dois partidos têm visão próxima quanto ao "brexit", a saída britânica do Reino Unido, então já há nessa área um interesse em comum.
Com fiasco, cresce pedidos por renúncia
Os resultados da eleição foram especialmente impactantes para May, que havia antecipado as eleições em abril passado para ampliar sua maioria parlamentar, então de 330 assentos.
Com o fiasco -ela perdeu cadeiras, em vez de ganhar- crescem os pedidos para que renuncie ao cargo, o que por ora ela se recusa a fazer. O direito da primeira tentativa de formar um governo cabe aos conservadores, que venceram as eleições, mesmo sem chegar à maioria.
Se falharem, a prerrogativa passa aos trabalhistas, que anunciaram sua disponibilidade durante a manhã. "Nós vamos nos apresentar para servir o país e formar um governo de minoria", disse John McDonnell, um porta-voz trabalhista. "A razão para isso é que eu não creio que os conservadores sejam estáveis, e que a primeira-ministra seja estável." O líder trabalhista, Jeremy Corbyn, pediu a renúncia de May e disse que o resultado mostra que "o povo votou pela esperança". "A política mudou. Não vai voltar ao padrão de antes. O povo já está cansado de austeridade e de cortes nos serviços públicos."
Theresa May não está considerando renunciar ao cargo, informa a mídia britânica. A instabilidade política fez com que a libra esterlina chegasse a seu valor mais baixo em relação ao euro em cinco meses, 1,1322 euro.
Procurando uma fórmula para governar
O cenário em que um partido não tem a maioria para governar é conhecido no Reino Unido como "hung Parliament", que significa um "Parlamento suspenso".
A primeira-ministra pode, em tese, manter-se na chefia até a primeira reunião do Parlamento na semana que vem, quando precisará encontrar uma fórmula para governar sem a maioria.
Nesse cenário, se May quiser manter o cargo, ela terá poucas alternativas. Ela pode, por exemplo, formar coalizão com partidos menores. Ela precisaria acenar aos pequenos partidos na Irlanda do Norte, mas provavelmente seria boicotada pelo restante do Parlamento.
Outra saída é um acordo de confiança, em que negocia apoio das siglas em troca de políticas -mas elas não recebem cargos no governo, diferentemente da coalizão. May pode, por fim, tentar governar em minoria, negociando os votos no Parlamento caso a caso. Mas a posição seria bastante frágil.
Caso fique claro que ela é incapaz de fechar qualquer um desses acordos, o manual parlamentar sugere que ela renuncie e assim abra caminho para o segundo colocado, o Partido Trabalhista.
O que o Partido Trabalhista propõe, por enquanto, é formar seu próprio governo de minoria -mas por ora descarta ter uma coalizão.
Os parceiros naturais seriam os nacionalistas escoceses e os Liberais Democratas, mas há uma divergência séria. Esses dois partidos se opõem ao "brexit", a saída britânica do Reino Unido, enquanto os trabalhistas aceitam esse processo.
A última vez em que o Reino Unido teve um "Parlamento suspenso" foi em 2010, no que levou à primeira coalizão desde a Segunda Guerra Mundial (1939-1945). Era a aliança dos conservadores e os Liberais Democratas, que pouco provavelmente vão voltar a se unir.
Resultado dá a siglas menores papel decisivo
Entre as muitas consequências da eleição está o crescimento da importância dos pequenos partidos. Eles poderão ser fundamentais para a formação tanto de uma coalizão quanto de um governo de minoria, saídas que terão que ser adotadas pela primeira-ministra, Theresa May, se quiser continuar no cargo, ou pelo líder trabalhista, Jeremy Corbyn, que será chamado a formar o governo se May renunciar.
O Reino Unido funciona há séculos como um bipartidarismo de fato, com dois grandes partidos e outros tantos menores. Mas nas últimas décadas dois pequenos cresceram muito, por razões diferentes. O Liberal-Democrata, nascido da fusão do Liberal (que foi o segundo grande partido do século 19, até ser superado pelos trabalhistas) com o Social-democrata.
O casamento dos dois partidos deu força ao "Lib-Dem" para reivindicar uma posição de terceira via nacional. Foi nessa condição que formou um governo de coalizão com os conservadores, em 2010, quando ninguém conseguiu maioria absoluta. Depois de cinco anos, em 2015, os conservadores ganharam maioria e desfizeram a coalizão.
Até a véspera desta eleição, os "lib-dems" pareciam ter feito uma campanha sem brilho, mas a boca de urna lhes deu cinco cadeiras a mais no Parlamento.
Com 14 deputados, podem dar a maioria que os Conservadores precisam. Há problemas, no entanto, pois eles são contra o "brexit", e May diz querer um mandato claro para negociar numa posição de força a saída com a União Europeia.
Jovens mudaram panorama político
Os pedidos para a renúncia de May se concentram na avaliação de que, em primeiro lugar, não deveria ter convocado as eleições -quis ampliar a margem parlamentar quando não precisava.
Sua campanha foi também bastante criticada por, entre outras coisas, ter se mantido distante dos eleitores. Enquanto Jeremy Corbyn mobilizava multidões em seus comícios, May se recusava a participar de debates públicos e na televisão.
Corbyn foi favorecido pelo que parece ser uma alta participação dos jovens, sua base eleitoral. A porcentagem de britânicos entre 18 e 34 anos que votaram subiu 12 pontos em relação a 2015, segundo pesquisas de boca de urna disponíveis -e 60% deles votaram nos trabalhistas.
UE pede que Reino Unido inicie negociações sobre "Brexit"
Autoridades europeias demonstraram preocupação com o eventual impacto do resultado da eleição geral do Reino Unido nas negociações sobre o "Brexit" e pediram que as conversas tenham início o quanto antes. Em Berlim, uma porta-voz da chanceler alemã, Angela Merkel, afirmou nesta sexta-feira que o governo da Alemanha espera que as discussões sobre o Brexit comecem em breve.
Já Donald Tusk, presidente do Conselho Europeu, deixou claro que continuará seguindo o cronograma do Brexit, que prevê o fim das negociações num período de dois anos, ou seja, até o fim de março de 2019. "Não sabemos quando as conversas do Brexit começam. Nós sabemos quando devem terminar. Façam o possível para evitar a falta de um acordo, como resultado da falta de negociações", disse Tusk no Twitter.
O principal negociador da UE para o Brexit, Michel Barnier, pediu que as discussões comecem em 19 de junho e adiantou que ele e sua equipe já estão divulgando suas posições. Em mensagem no Twitter, porém, Barnier reconheceu que a data exata para o início das conversas está indefinida. "As negociações do Brexit devem começar quando o Reino Unido estiver preparado; o cronograma e as posições da UE são claras. Vamos nos concentrar em chegar a um acordo", afirmou Barnier na rede social.
O Reino Unido notificou oficialmente sua intenção de deixar a UE em março, dando início ao processo de dois anos para o rompimento com o bloco. Recentemente, Barnier tem defendido que esse tempo é curto para negociar os termos da separação e as condições das futuras relações entre Reino Unido e EU.
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