A primeira-ministra britânica Theresa May ganhou voto de confiança em sua liderança no partido Conservador por 200 votos a 117, nesta quarta-feira (12). Ela precisava de 158 votos dos membros de seu partido para vencer e garantir a sua posição contra outro desafio de liderança por pelo menos um ano.
Se ela perdesse a liderança do Partido Conservador, deveria renunciar e uma nova votação dentro do partido escolheria um novo líder.
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May enfrentou o voto de desconfiança no Parlamento Britânico que ameaçava sua liderança enquanto tenta garantir um acordo para que o Reino Unido deixe a União Europeia. A decisão dos parlamentares de realizar a votação veio depois que May adiou por tempo indeterminado a votação sobre o acordo do Brexit que o seu governo fechou com a União Europeia, que estava marcada para esta terça-feira (11). A expectativa, segundo a própria primeira-ministra, era de que o acordo fosse rejeitado por ampla margem.
O secretário de transporte Chris Grayling disse à rede de notícias BBC que esse foi um “voto forte de apoio” à May. Ela teve mais votos do que tinha recebido na votação que a elegeu líder em 2016, segundo o secretário.
Jeremy Corbyn, líder do partido Labour, de oposição, fez uma declaração sobre o resultado e desafiou May a colocar o acordo do Brexit em votação na semana que vem. “A primeira-ministra perdeu a maioria no Parlamento, o seu governo está um caos e ela é incapaz de entregar um acordo para o Brexit que funcione para o país e que coloque empregos e economia em primeiro lugar”, disse Corbyn, segundo o jornal The Guardian.
Após a vitória, May falou em frente à sua residência oficial na Downing Street, em Londres. Ela reconheceu que um “número significativo” de seus membros do Parlamento votaram contra ela e diz que está ouvindo o que eles têm a dizer, mas que vai seguir adiante com o Brexit, segundo relatou o jornal The Guardia. Ela acrescentou que, embora o Brexit seja importante, também é preciso se concentrar em outras questões que as pessoas sentem que são “vitais” a elas. “Construir uma economia mais forte, oferecer serviços públicos de primeira classe, construir as casas que as famílias precisam”, afirmou.
Apesar da vitória, os membros do partido de May não estão muito entusiasmados com as concessões que May fez na negociação de um acordo para deixar a União Europeia. A UE tem relutado em fazer novas concessões. E ganhar o voto de confiança não fortalece necessariamente o seu poder de negociação.
Negociações
Para derrubar a moção de desconfiança por 200 votos a 117, entretanto, a chefe de governo precisou dar uma cartada alta.
Em reunião a portas fechadas com seu campo, anunciou que não pretendia estar à frente da legenda em 2022, quando devem acontecer as próximas eleições gerais – se não houver antecipações, o que é relativamente comum na política britânica.
Segundo a imprensa britânica, a sinalização foi recebida com alívio pelos parlamentares mais ariscos a May e tristeza pelos mais alinhados. Mas os dois lados teriam sido pegos de surpresa pela notícia.
A consulta interna sobre a liderança conservadora acontece sempre que um comitê do partido recebe no mínimo 48 cartas de parlamentares questionando a capacidade do(a) atual chefe de fileira de seguir na posição.
O responsável por esse colegiado afirmou na manhã de quarta que o piso numérico, equivalente a 15% da bancada, havia sido atingido.
No caso de May, o que um contingente robusto de colegas “tories” (como são conhecidos os conservadores britânicos) critica é a forma como ela conduziu as negociações com a União Europeia (UE) para o Brexit, o desligamento do Reino Unido do bloco continental.
O que está em jogo
O “divórcio” foi decidido em plebiscito realizado em junho de 2016 e deve se concretizar em 29 de março de 2019. Uma fase de transição que em grande parte mantém intacto o statu quo da relação vai até o fim de 2020 (com possibilidade de extensão).
Para a ala que defende uma ruptura mais radical com a UE, May se apequenou nas conversas com seus homólogos europeus e, com isso, o Reino Unido continuará submetido a normas e legislações coletivas das quais o voto majoritário no “leave” (sair) pretendia libertá-lo.
O principal ponto de atrito é o dispositivo que prevê a instauração temporária de uma zona aduaneira reunindo UE e Reino Unido após o Brexit, caso não seja encontrada outra solução para o não fechamento da fronteira entre a República da Irlanda (que faz parte do bloco europeu) e a Irlanda do Norte (integrante do Reino Unido).
O que todos querem é evitar reacender as disputas no Norte entre unionistas (pró-Londres) e nacionalistas (partidários de uma só e grande Irlanda), que deixaram alguns milhares de mortos e estão apaziguadas há 20 anos, desde a assinatura de um acordo entre as partes.
A facção mais eurocética do Partido Conservador, porém, teme que a zona tarifária comum vire um arranjo permanente, uma “armadilha” europeia visando a minar os diferenciais competitivos de um país então recém-“alforriado” do fardo legal, trabalhista e ambiental da UE. O grupo acha que Londres não saberá ou não terá meios de se desvencilhar da arapuca.
Vitória após sequência de fracassos
Antes da vitória desta quarta, Theresa May acumulou reveses nas últimas semanas. Quando anunciou a conclusão das conversas com a União Europeia, em meados de novembro, viu ao menos cinco de seus ministros abandonarem o barco por se negarem a defender os termos do texto acordado.
Com o documento logo referendado por líderes europeus, a primeira-ministra iniciou a “operação-charme” doméstica, mas a empreitada não surtiu efeito. Na segunda (10), véspera da votação do acordo pelo Parlamento britânico, antevendo uma derrota humilhante, o governo tirou o item da pauta legislativa.
Adiada a sessão parlamentar, May embarcou num “tour” europeu com escalas em Haia, Berlim e Bruxelas, esta sede da governança europeia. Queria mais garantias de que a união aduaneira seria um recurso extremo – e que, se eventualmente tivesse de ser utilizado, vigoraria por tempo curto, limitado.
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Ouviu de todos os interlocutores que não havia margem para emendas aos textos aprovados (tanto o acordo para saída do Reino Unido quanto a mais sucinta declaração política sobre as linhas mestras da relação futura entre as partes). Cruzou de volta a Mancha sem ter o que oferecer ao coro de descontentes, que se avolumava.
Com informações da Folhapress e do Washington Post