Milhares de pessoas protestaram pedindo mais segurança às autoridades após a confirmação de morte dos três jovens| Foto: ULISES RUIZ/AFP

No mês passado, três universitários mexicanos estavam criando um filme para um projeto escolar quando desapareceram. Na última vez que foram vistos vivos, eles tinham sido forçados a entrar em um carro por dois homens armados vestidos como policiais em Guadalajara, a segunda maior cidade do México, no estado de Jalisco.

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O desaparecimento dos três estudantes de cinema, Javier Salomón Aceves Gastélum, de 25 anos, Marco Ávalos e Jesús Daniel Díaz, ambos de 20 anos, provocaram protestos em todo o México e a indignação da indústria cinematográfica internacional, incluindo a do diretor, vencedor do Oscar, Guillermo del Toro. Nos últimos dias, milhares de pessoas, muitas delas estudantes, marcharam pelas ruas de Guadalajara e da Cidade do México, exigindo que as autoridades levassem os três jovens para casa em segurança. “Somos estudantes, não criminosos”, gritavam eles. “Eu serei o próximo?”

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O caso dos alunos desaparecidos permaneceu um mistério por mais de um mês até que, nesta segunda-feira (23), as autoridades mexicanas revelaram detalhes horríveis da investigação.

Depois que eles foram sequestrados, os estudantes de cinema foram espancados e mortos, e seus corpos dissolvidos em ácido, informou a procuradoria-geral em Jalisco.

Os estudantes, sem conexão com gangues criminosas, viram-se inadvertidamente enredados em um conflito entre dois cartéis de drogas. Membros do cartel mais poderoso do México, o Cartel Jalisco New Generation, podem ter confundido os estudantes com membros de um cartel de drogas rival, disse o gabinete do procurador-geral. As autoridades prenderam dois suspeitos de conexão com o crime e emitiram mandado de prisão para outros seis.

As mortes dos estudantes tornaram-se o mais recente símbolo do alto índice de violência no México, que teve mais de 25 mil homicídios em 2017.

“Não há palavras para compreender a magnitude dessa loucura”, afirmou Guillermo del Toro, natural de Guadalajara, em um tuíte, nesta terça-feira (24). “Três alunos são mortos e dissolvidos em ácido. O ‘motivo’ é impensável e o ‘como’ é aterrorizante”.

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Linha do tempo

Os três jovens, de diferentes partes do México, eram estudantes da Universidade de Mídia Audiovisual de Guadalajara. Eles estavam trabalhando em um projeto de filme em uma casa que pertencia à tia de um deles, localizada em Tonalá, uma cidade nos arredores de Guadalajara.

A casa, porém, também foi usada como abrigo para uma gangue conhecida como cartel “Nueva Plaza”, liderada por um líder conhecido como “El Cholo”. Em 2015, um membro importante desse cartel, Diego Gabriel Mejía, foi detido na casa ao lado de outros membros. (Autoridades disseram que Mejía e a tia do aluno tinham vínculo com um salão de massagens que servia como um negócio de prostituição).

Como Mejía logo seria libertado da prisão, membros de sua gangue rival, o Cartel Jalisco New Generation, começaram a vigiar de perto o esconderijo. A presença dos três jovens na propriedade pode ter levantado suspeitas, informaram as autoridades.

“Sem saber, os estudantes estavam em um lugar de grave risco, visado por uma célula criminosa do Cartel Jalisco New Generation”, disse um porta-voz da procuradoria-geral.

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Então, em 19 de março, os três estudantes, com um quarto colega de classe e três outros jovens, estavam deixando o local quando um dos carros quebrou. Duas picapes estacionaram e seis homens fortemente armados, vestidos como policiais, se aproximaram e ordenaram que todos se estendessem no chão.

Então, eles forçaram os três estudantes, Gastelum, Avalos e Diaz, a entrar em um dos veículos e os levaram para uma casa usada pelo cartel para interrogar e torturar as vítimas, disseram as autoridades.

“É aqui que eles começam a bater em um deles”, disse a chefe da investigação, Lizette Torres, em entrevista coletiva. Enquanto interrogavam os estudantes, os suspeitos acabaram por espancar um deles tão brutalmente que ele morreu. Portanto, “eles tiveram que executar os outros dois”, disse Torres.

Depois, os suspeitos levaram os corpos dos estudantes para outro local, onde os dissolveram em ácido. Os investigadores descobriram 46 barris de ácido sulfúrico no local e acreditam que outros corpos podem ter sido eliminados lá. Os cartéis mexicanos são conhecidos por dissolver, queimar ou desmembrar corpos como forma de eliminar evidências de crimes.

Autoridades disseram ter encontrado evidências de DNA ligadas a dois dos estudantes em duas das três casas. Quando perguntada se ela tinha certeza se todos os três estudantes estavam mortos, Torres disse que os investigadores “inferiram logicamente” que esse seria o caso.

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A declaração provocou novas críticas à polícia, censurada por inúmeros assassinatos não resolvidos ou parcialmente solucionados. Muitas pessoas recorreram às mídias sociais para exigir mais evidências e respostas com melhor fundamentação.

Violência

Jalisco experimentou um ano de violência recorde em 2017, com um total de 1.369 homicídios. É o lar do poderoso Cartel Jalisco New Generation, uma rede de traficantes e assassinos que “abateram um helicóptero do exército, emboscaram a polícia federal e enviaram uma cabeça de porco para a casa do ex-procurador-geral”, como apontou uma matéria do The Washington Post, em 2017. O cartel se originou dos remanescentes de outro grupo, o cartel Milenio, e ganha dinheiro com a venda de armas, roubo de gasolina, extorsão e sequestro.

Os casos de pessoas desaparecidas no México geralmente não são resolvidos. Em uma ocorrência de 2014, 43 estudantes desapareceram depois de protestar por reformas educacionais. Eles nunca foram vistos novamente. O caso teve repercussão internacional, sendo condenado por personalidades como o ex-presidente Barack Obama e o papa Francisco, e tornou-se uma pedra no sapato para a administração do presidente mexicano Enrique Peña Nieto.

Mais tarde, o governo disse que os 43 estudantes teriam sido capturados pela polícia e entregues aos assassinos do cartel de drogas, que atiraram neles e queimaram seus corpos. Mas, em um relatório, auditores independentes apontaram falhas na narrativa do governo.

Na segunda-feira à noite, as pessoas se reuniram em uma vigília em Jalisco para homenagear os três estudantes de cinema. Dezenas de mexicanos expressaram sua raiva e frustração sobre os supostos assassinatos - e muitas outras mortes em todo o país - nas redes sociais, usando a hashtag #NoSonTresSomosTodos, que significa “não são três, somos todos”.

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“Eles assassinaram os estudantes de cinema e dissolveram seus corpos em ácido por fazer a lição de casa. Por fazer a lição de casa”, disse um tuíte. “Este país é o inferno.”

“A raiva, a impotência, as coisas não podem continuar assim”, disse outro.

“O mais vil e nauseante, a história que nunca termina, a realidade que ultrapassa a ficção”, escreveu outro. “Continuamos a sofrer todos os dias... Chega!”