Encontre matérias e conteúdos da Gazeta do Povo
Crise política

Tribunal Supremo adia posse de Chávez

A presidente do Supremo, Luisa Estella Morales, ao anunciar decisão que favorece Chávez | Manaure Quintero/EFE
A presidente do Supremo, Luisa Estella Morales, ao anunciar decisão que favorece Chávez (Foto: Manaure Quintero/EFE)

Pela primeira vez desde 1959, ano da redemocratização na Venezuela, não haverá cerimônia de posse para marcar o início do novo mandato presidencial de Hugo Chávez (2013-2019), numa decisão chancelada ontem pelo Tribunal Supremo de Justiça (TSJ) venezuelano.

A Corte, dominada por juízes alinhados ao chavismo, avalizou o plano do governo de adiar indefinidamente a posse, mesmo com o novo mandato começando hoje. Foi aberta inclusive a possibilidade de a posse se realizar em Cuba, onde Chávez se trata de um câncer.

A mais alta corte do país concordou com a interpretação dos governistas de que artigo 231 da Constituição permitiria postergar o juramento de posse.

Mesmo sem o "formalismo" da juramento, o novo mandato de Chávez começa nesta quinta-feira, segundo o TSJ, porque se trata de uma reeleição.

"Sabemos que é necessário e que, indubitavelmente, vai ser cumprido o juramento. Mas neste momento não poderíamos antecipar quando, como nem onde se juramentaria o presidente", disse a presidente do TSJ, Luisa Estela Morales, quando questionada se Chávez poderia tomar posse em Havana.

No lugar da posse, o chavismo prepara amanhã em Caracas uma grande festa popular, com convidados como os presidentes Evo Morales (Bolívia) e José Mujica (Uruguai).

Protesto

O bloco parlamentar da Mesa da Unidade (MUD), coalizão dos partidos da oposição, declarou que a sentença da Justiça é "política". Os parlamentares se declararam em "emergência" ante a "grave violação da ordem constitucional".

Apesar de ter recebido 44,3% dos votos nas presidências de outubro e possuir 40% das cadeiras da Assembleia, a oposição pode pouco mais que protestar. Sem maioria na Assembleia e com o Judiciário alinhado ao governo, resta aos opositores fazer apelos internacionais, inclusive ao Mercosul, com pouca ressonância e efeito prático tendente a zero.

AnáliseEspecialistas divergem sobre a posição da justiça venezuelana

O embaixador Rubens Ricupero, que já foi encarregado de assuntos venezuelanos no Itamaraty, considera polêmico o adiamento da posse de Hugo Chávez, mas diz que o aval do Tribunal Supremo de Justiça dá à decisão caráter "democrático".

"Teria sido grave se houvesse adiamento sem o pronunciamento do Judiciário. Pode-se dizer que a decisão não foi equilibrada, mas as regras democráticas foram cumpridas", avaliou Ricupero.

Para ele, porém, a decisão só se sustentará se o afastamento do presidente não se prolongar por muito tempo.

Já o professor de Relações Internacionais do Iuperj e da UFRJ, Marcelo Coutinho, avalia que houve "contorcionismo constitucional" que configura um atentado ao Estado democrático de Direito.

Para ele, o correto teria sido o presidente da Assembleia assumir o poder e convocar eleições dentro de um prazo que poderia ser negociado com o Supremo.

"A democracia não concebe que o detentor do poder não seja eleito", disse, lembrando que na Venezuela o vice não disputa eleições ao lado do presidente, mas é nomeado por ele posteriormente, assim como os ministros.

Entrevista"O Tribunal virou um braço do Executivo"

Blanca Rosa Mármol de León, ex-integrante do Tribunal Supremo de Justiça (TSJ) da Venezuela

Após 38 anos dedicados ao Direito – o que a levou a ocupar por 12 anos um dos 32 postos do Tribunal Supremo de Justiça (TSJ) da Venezuela, Blanca Rosa Mármol de León foi afastada em 31 de dezembro de forma, segundo ela e outros especialistas, inconstitucional. Ela era uma das poucas juízas que votavam de forma independente do chavismo. Na entrevista abaixo, à Agência O Globo, ela afirma que a Venezuela fica a partir de hoje "sem governo legítimo".

O TSJ poderia ter adiado a posse de Chavez?

Claro que não. Pela Constituição, o presidente, a partir do dia 10 teria de ser o presidente da Assembleia (Diosdado Cabello). Isso de manter o vice Nicolás Maduro à frente do governo é uma ruptura institucional e constitucional gravíssima, prova que as instituições da Venezuela ruíram. Juizes sérios e isentos jamais poderiam ter dado esta interpretação à Carta. Podemos dizer hoje: não há mais governo legítimo aqui.

A comissão médica para avaliar o estado de saúde do presidente também não foi e pelo visto nem será nomeada...

Mais um desrespeito à Constituição e ao povo venezuelano. Todas as entidades jurídicas internacionais concordam que a população tem o direito, como eleitora, de saber a quantas anda a saúde de um chefe de Estado. A saúde do presidente é uma questão de segurança nacional.

Ao contrário do Brasil, o vice-presidente da Venezuela não faz parte da chapa eleita pelo povo, ele foi nomeado pelo presidente. O mandato de Nicolás Maduro é menos legítimo por isso?

O mandato dele acaba e, a partir desta quinta-feira, perde totalmente a legitimidade. O cargo de Maduro precisaria ser oficialmente renovado por Chávez, a partir da data da nova posse, assim como os cargos dos ministros.

Por que o afastamen­­­­­­to da senhora foi inconstitucional?

Meu período de 12 anos de Supremo venceria em dezembro, estava certo eu me aposentar, assim como outros sete juízes, três deles que votavam de forma independente como eu. O problema é que a gente tinha suplentes, cujos mandatos também venciam, para que a Assembleia Nacional (responsável na Venezuela pela nomeação da Corte Suprema) designasse, assim, novos juízes. Com o fim do nosso mandato, simplesmente mandaram a gente embora e puseram os suplentes lá. E adivinha?! Todos os suplentes são chavistas! O TSJ virou um braço armado do Executivo, o Legislativo foi desrespeitado. Todos os juízes agora fazem o que o chavismo manda.

Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Principais Manchetes

Receba nossas notícias NO CELULAR

WhatsappTelegram

WHATSAPP: As regras de privacidade dos grupos são definidas pelo WhatsApp. Ao entrar, seu número pode ser visto por outros integrantes do grupo.