O presidente russo, Dmitri Medvedev, assinou neste sábado (16) o plano de paz com a Geórgia, mas, na prática, as forças russas parecem reforçar suas posições em território georgiano, situando-se a 40km de Tbilisi.
Blindados e tanques russos bloqueiam a entrada principal de Gori, um ponto estratégico a 60km da capital e perto da Ossétia do Sul, região detonadora do atual conflito, constatou neste sábado um fotógrafo da agência de notícias France Presse (AFP).
Inúmeros movimentos de tanques e veículos blindados de infantaria, armados com canhões de 30mm, foram vistos por um jornalista da AFP perto de Igoieti, a cerca de 30km de Tbilisi. O motivo dos deslocamentos dessas forças, que deixaram Gori na sexta, avançando ainda mais no território georgiano, continua sendo desconhecido.
O presidente Medvedev assinou neste sábado o plano de seis pontos negociado pela França para acabar com os conflitos na Geórgia, anunciou o Kremlin.
O acordo, firmado na sexta (15) pelo presidente georgiano, Mikhail Saakachvili, não estabelece nenhuma área na Geórgia na qual as tropas russas estariam autorizadas a patrulhar, frisou o embaixador da França em Tbilisi, Eric Fournier.
Fournier desmentia, assim, matéria publicada no jornal russo "Kommersant", que cita um perímetro de 10km para as patrulhas russas, dentro de seu dispositivo de segurança.
Condições de retirada
As condições para que as forças russas garantam sua segurança até a adoção de um mecanismo internacional foram negociadas entre Washington, Paris e Moscou. Ontem, a secretária de Estado americana, Condoleezza Rice, comunicou os detalhes do acordo a Tbilisi, mas sem divulgá-los publicamente.
Hoje, o presidente americano, George W. Bush, comentou, em seu rancho em Crawford (Texas), que a aceitação pela Rússia do plano de paz, visando ao fim do conflito com a Geórgia, é um "passo animador".
"Agora, a Rússia deve honrar o acordo e retirar suas tropas", continuou, insistindo em que "a Abkházia e a Ossétia do Sul devem continuar fazendo parte da Geórgia".
"As duas regiões separatistas, que estão no centro dos conflitos sangrentos entre a Rússia e a Geórgia, fazem parte da Geórgia, e elas vão continuar fazendo", disse, acrescentando "que não há nenhuma discussão possível sobre o assunto".
Rice defende que o Exército russo deve "iniciar a retirada, de forma imediata, das tropas" que entraram na Geórgia, depois que os georgianos tentaram, em vão, no dia 7 de agosto, assumir o controle da Ossétia do Sul.
A Grã-Bretanha se posicionou no mesmo sentido, enquanto a Alemanha voltou a insistir na manutenção da integridade territorial da Geórgia.
Segundo Tbilisi e Washington, a Rússia deve iniciar a retirada das tropas que estão na Geórgia, mas o chefe da diplomacia russa, Serguei Lavrov, já declarou que o acordo de cessar-fogo assinado pelas partes envolvidas não fixa limites de tempo, nem de número, para o contingente russo de manutenção da paz na Geórgia.
"As forças russas ficarão o tempo que for necessário na Geórgia e vão se retirar à medida que o contingente de manutenção da paz previsto no acordo for chegando", frisou Lavrov.
"Não precisa haver um teto para o contingente de manutenção de paz que ficará na Ossétia do Sul ao final da retirada", acrescentou.
Segundo uma carta enviada pelo presidente francês, Nicolas Sarkozy, a seu homólogo georgiano para esclarecer o alcance do acordo, as forças russas de manutenção de paz poderão ficar "em uma área de vários quilômetros de amplitude, partindo do limite administrativo entre a Ossétia do Sul e o restante da Geórgia".
Conta-gotas
Na prática, na tarde desse sábado, a retirada das forças russas ainda parecia longe de se concretizar. A estrada que liga Tbilisi a Gori, onde as forças russas se posicionaram, foi aberta à circulação, mas alguns soldados russos cavavam trincheiras no acostamento da rodovia perto de Igoieti.
O ministro georgiano do Interior relatou à AFP que testemunhas viram outros movimentos de tropas russas, e que essas forças também se posicionaram em Katchuri e Akhalgori, a nordeste de Gori.
"A situação é ainda mais alarmante do que ontem. Os russos cometem saques em Akhalgori e em Katchuri, e há ladrões na região", denunciou o porta-voz desse ministério, Chota Outiachvili, calculando em 1.000 o número total de soldados russos e de milicianos ossetas na região.
Segundo o embaixador francês, Eric Fournier, a situação humanitária é absolutamente dramática em Gori.
A Geórgia acusa os russos de detonar uma ponte ferroviário estratégico, a 50km de Tbilisi, o que a Rússia nega.
Além disso, o famoso parque natural do desfiladeiro de Borjomi estava em chamas neste sábado após um bombardeio da aviação russa, denunciou o Ministério georgiano das Relações Exteriores, em um comunicado.
"O desfiladeiro de Borjomi está queimando desde um bombardeio incendiário, ontem (sexta-feira), de helicópteros russos na floresta desse parque nacional", declarou a Chancelaria georgiana.
A Geórgia pediu ajuda à Turquia para "responder a essa catástrofe natural, mas a Força Aérea russa patrulha a região com helicópteros e se nega a dar direito de navegação à aeronave turca", destacou.
Desde sexta-feira, permite-se a entrada, a conta-gotas, de comboios humanitários e de ambulâncias em Gori, onde se ignora o número de mortos e feridos. Ainda no âmbito humanitário, espera-se a chegada de outros dois aviões americanos a Tbilisi.
Em Tskhinvali, capital da Ossétia do Sul, o procurador geral do território separatista pediu à Geórgia que retire os corpos de seus soldados, que podem ser "centenas".
A reportagem da AFP viu mais de 40 caixões expostos ao sol sobre a grama, devido a uma falha no sistema de refrigeração do necrotério local.
A chanceler alemã, Angela Merkel, viajará no domingo a Tbilisi, e o presidente do Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICR), Jacob Kellenberger, deve ir no mesmo dia para avaliar o impacto humanitário do conflito. Em paralelo, uma missão de quatro especialistas foi ao país para proporcionar à UE um balanço da situação.
Hoje, as autoridades georgianas atualizaram o balanço de vítimas: 182 mortos, entre eles 115 soldados, e 479 feridos.
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