O “outsider” multimilionário Donald Trump prestou juramento nesta sexta-feira (20) como o 45° presidente dos Estados Unidos e anunciou, em seu discurso inaugural, marcado por um forte tom protecionista, que todas as decisões de Washington serão orientadas a priorizar o país.
“A partir deste dia, uma nova visão governará nossa pátria. A partir deste dia, os Estados Unidos vêm em primeiro lugar”, disse Trump em seu discurso de 20 minutos.
O altivo ex-astro de ‘reality show’ sem qualquer experiência política assumiu as rédeas da primeira potência mundial das mãos do democrata Barack Obama.
Trump, que pretende deportar milhões de imigrantes e construir um muro nos 3,2 mil km de fronteira com o México, também enumerou “duas regras simples: compre [produtos] americanos e empregue [funcionários] americanos”.
“A cerimônia de hoje tem um significado muito especial porque não estamos meramente transferindo o poder de um governo a outro, de um partido a outro. Estamos transferindo o poder de Washington DC e devolvendo-o a vocês, o povo”, disse Trump à multidão.
Ele lamentou que o país “enriqueça as indústrias estrangeiras” e “subsidie exércitos estrangeiros”.
“Defendemos as fronteiras de outros países, enquanto nos negamos a defender as nossas (...) Devemos proteger nossas fronteiras dos estragos de outros países que fabricam nossos produtos, roubam nossas empresas e destroem nossos empregos”, acrescentou.
Na cerimônia de posse, celebrada nas escadarias em frente ao Capitólio, sede do Congresso americano, também prestou juramento mais cedo o novo vice-presidente, Mike Pence.
A vitória de Trump, que deixou o planeta atônito, está ancorada sobretudo nos votos de uma classe trabalhadora branca que desconfia dos políticos tradicionais e que sente que a globalização a prejudicou, transferindo empregos do México à China.
Os aliados tradicionais dos Estados Unidos observam o magnata imobiliário nova-iorquino com inquietação: após uma campanha que dividiu o país, o republicano Trump, de 70 anos, chega à Casa Branca com a menor popularidade de um novo presidente em quatro décadas.
Incidentes violentos
A capital do país foi tomada por dezenas de milhares de simpatizantes e opositores de Trump.
Um dos muitos protestos contra o futuro presidente, no centro de Washington, registrou incidentes: dezenas de manifestantes, muitos vestidos de preto e encapuzados, atiraram pedras e quebraram a vitrine de uma cafeteria Starbucks, e foram dispersados pela polícia com bombas de gás lacrimogênio, constataram jornalistas da AFP.
“Não às deportações, não à Ku Klux Klan, não a uns Estados Unidos fascista!”, repetiam.
Os atos de investidura começaram com uma cerimônia religiosa na pequena igreja episcopal de Saint John, de onde Trump e sua terceira esposa, Melania, uma ex-modelo de 46 anos nascida na Eslovênia, chegaram à Casa Branca.
Obama e sua esposa Michelle os aguardavam de pé na porta, ela com um elegante vestido vermelho longo. Melania, de vestido azul celeste Ralph Lauren ao estilo de Jackie Kennedy, entregou um presente a eles.
Os dois casais presidenciais tomaram um chá na Casa Branca e posteriormente percorreram juntos em uma limousine os 4 km da avenida Pensilvânia até o Capitólio.
Na escadaria do Congresso, Trump prestou juramento ao meio-dia local (15h00 de Brasília) sobre duas bíblias: uma presenteada a ele por sua mãe, em 1955, e a de Abraham Lincoln, que lutou pela abolição da escravidão, também utilizada por Obama há quatro anos.
Foram observados atentamente por três ex-presidentes: Jimmy Carter, George W. Bush e Bill Clinton.
A esposa de Bill, Hillary, que perdeu para Trump a chance de se tornar a primeira mulher presidente dos Estados Unidos, também esteve presente.
“Agora teremos fronteiras fortes, e isso criará mais empregos. Agora os Estados Unidos voltarão a ser grandes, a ser fortes. Apenas um outsider como Trump pode limpar o desastre que é Washington”, disse à AFP um de seus eleitores, Michael Hippolito, um policial aposentado de 54 anos, vestido com roupa camuflada que viajou de Nova York para a posse.
Em Moscou, o porta-voz do presidente russo, Vladimir Putin, afirmou que o chefe de Estado não assistiria ao vivo a posse de Trump.
Trump promete unificar o polarizado eleitorado, mas isto se contradiz com seus constantes ataques a opositores, geralmente pelo Twitter: da imprensa à atriz Meryl Streep ou ao herói dos direitos civis John Lewis, das agências de inteligência à chanceler alemã Angela Merkel ou à Europa.
Do front diplomático surgem as maiores dúvidas. Os líderes do planeta se perguntam sobre como interpretar suas declarações, desmentidas muitas vezes por seus futuros ministros.
México, castigado
O gabinete de Trump é o mais branco e o mais rico em décadas. Inclui apenas um negro e, pela primeira vez em quase 30 anos, nenhum hispânico, o que lhe valeu fortes críticas da primeira minoria do país, com mais de 55 milhões de pessoas (17% da população).
A ausência de hispânicos no gabinete não é surpreendente para um presidente que promete deportar entre dois e três milhões de imigrantes ilegais, construir um muro na fronteira com o México e cobrá-lo dos mexicanos talvez através de impostos às remessas de imigrantes.
E também quer renegociar ou eliminar o TLCAN, o acordo de livre comércio com México e Canadá, assim como o Acordo Transpacífico de Cooperação Econômica (do qual são signatários Chile, México e Peru, entre outros), medidas que, junto à perda de investimentos, podem arrastar o vizinho do sul dos Estados Unidos a uma recessão em 2017.
Trump também pode voltar atrás na aproximação com Havana impulsionada por Obama e tudo indica que será mais agressivo com a Venezuela.