Donald Trump, presidente dos EUA: opositores tentam frear nova agenda da Casa Branca| Foto: Shawn Thew/EFE/EPA
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Antes mesmo da vitória esmagadora de Donald Trump sobre os democratas em novembro do ano passado, corporações, políticos e ativistas de esquerda já vinham retratando o novo presidente dos EUA como uma "ameaça à democracia".

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O discurso, amplamente vendido pela oposição política que se encontra perdida desde a derrota eleitoral, se intensificou em meio aos planos do republicano de remodelar a política dos EUA, com destaque para sua luta abrangente contra a agenda woke que tomou conta do governo federal sob a gestão de seu antecessor, Joe Biden.

Como resultado dessas medidas, Trump tem sido apontado como um "risco" para as instituições públicas pelos democratas, com alguns mais radicais mobilizando apoiadores para um embate contra a política implementada pelo novo governo.

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Um exemplo recente disso foi uma declaração da deputada democrata LaMonica McIver, que condenou as ações do Departamento de Eficiência Governamental (DOGE), cuja figura central é Elon Musk. Segundo a parlamentar, sob Trump, o país está "em guerra". Mas será que o republicano é mesmo essa ameaça anunciada pelos críticos?

Para o economista Igor Lucena, doutor em Relações Internacionais e CEO da Amero Consulting, essa visão de que o presidente dos EUA é uma ameaça à democracia parte de uma ideia simplista da realidade. "Acho que essa é uma visão extremamente simplista e baseada em uma concepção de democracia como uma luta entre o bem e o mal".

Segundo o analista, "se Trump fosse realmente uma ameaça à democracia, não haveria eleições. Ele teria permanecido no poder, e isso não ocorreu. É verdade que ele não aceitou o resultado? Sim, mas, no fim, aceitou. Reclamou, mas aceitou". Em novembro, o republicano teve uma vitória democrática, dentro das regras do sistema eleitoral americano, de forma legal, livre e justa. 

Na opinião de Lucena, a vitória eleitoral representou, na verdade, "um grito de uma parte considerável da sociedade que perdeu o American Dream (Sonho Americano, em tradução livre) e busca, em Trump, uma nova forma de representação".

"Quando o establishment critica radicalmente essas visões, o primeiro reflexo costuma ser rotular essas pessoas como fascistas, racistas e antidemocráticas. Vimos isso acontecer no Brasil e no restante do mundo", lembrou o analista, destacando que Trump foi eleito em meio a uma luta contra quase toda a imprensa americana. "Essa elite intelectual e midiática está distante do pensamento do americano médio", acrescentou.

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O analista político e professor de Direito das Relações Internacional do Ibmec Eduardo Galvão aponta que essa noção de "risco" à democracia é um alarmismo montado enquanto o presidente avança com sua nova política. "Trump não rasgou a Constituição, mas tem dobrado suas bordas. Ele ainda joga dentro das regras, mas está claramente tentando redesenhar o tabuleiro a seu favor."

Segundo Galvão, "por mais barulho que Trump faça, as regras [democráticas] ainda o limitam". A Constituição dos EUA é o mais antigo e consolidado instrumento jurídico que estabelece os limites que os governos têm e garante uma base robusta para a conservação da democracia americana.

Uma reforma constitucional, por exemplo, é muito difícil de ser aprovada justamente pelos obstáculos impostos pelo sistema.

Nos EUA, qualquer emenda constitucional sugerida precisaria ter o apoio de dois terços do Congresso e ser ratificada por três quartos dos Estados, algo quase impossível de se conseguir com a polarização política e a alternância de poder observada na história do país.

Embate

No momento, o governo Trump enfrenta um embate com o Judiciário sobre a política migratória estabelecida pela Casa Branca, que vem sendo fortemente freada pelos tribunais.

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O presidente usou um meio cabível com a Lei do Inimigo Estrangeiro, que vem sendo alvo de discussões na Justiça, enquanto um magistrado federal bloqueou a medida invocada.

Esta semana, em meio à pressão do magistrado para repassar informações sobre os voos de deportação, Trump mais uma vez invocou um recurso legal para não ser obrigado a responder à ordem judicial: o privilégio do segredo de Estado.

Para Lucena, "a partir do momento em que os agentes democráticos, tanto de esquerda quanto de direita, não conseguiram, dentro do sistema capitalista, resolver os problemas das sociedades e do funcionamento atual do sistema, as pessoas elegeram alguém que desafia esse modelo e busca novas alternativas", como ocorreu com Trump.

Na análise do economista, os partidos mais ao centro do espectro político, não só nos EUA, estão enfrentando grandes desafios. "Vemos, por exemplo, uma queda radical dos conservadores e liberais no Reino Unido, além de mudanças significativas na França e na Itália. As sociedades estão se sentindo sufocadas e buscam líderes que proponham mudanças radicais."

Para o professor Eduardo Galvão, "a democracia não é feita da ausência de conflitos, mas da capacidade de enfrentá-los dentro das regras", portanto haverá resistência de juízes, imprensa, promotores e sociedade civil que, segundo ele, são "uma linha de defesa crucial".

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