O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, está questionando a estratégia de sua administração na crise da Venezuela, após o fracasso de um levante da oposição, apoiado pelos EUA, para derrubar Nicolás Maduro. De acordo com funcionários do governo e assessores da Casa Branca, Trump está se queixando de que foi enganado sobre como seria fácil substituir o ditador por uma figura jovem da oposição.
A insatisfação do presidente se cristalizou em torno do conselheiro de segurança nacional, John Bolton, e do que Trump reclamou ser uma posição intervencionista, que está em desacordo com sua opinião de que os Estados Unidos deveriam ficar de fora de conflitos estrangeiros.
Trump disse nos últimos dias que Bolton quer colocá-lo "em guerra" – um comentário que ele fez em tom de brincadeira no passado, mas que agora esconde preocupações mais sérias, segundo uma importante autoridade do governo.
Cenário e estratégia
A política do governo americano não mudou depois da tentativa frustrada de um levante cívico-militar contra Maduro na semana passada, liderado pelo presidente interino da Venezuela, Juan Guaidó, e apoiado pelos EUA. Mas, desde então, as autoridades americanas têm sido mais cautelosas em suas previsões para a queda de Maduro e estão reavaliando a possibilidade de um "longo trajeto" diplomático.
Os funcionários do governo citaram o comprometimento de Trump com a crise da Venezuela, desde as suas primeiras semanas na presidência, como prova de que ele tem uma visão realista dos desafios que a situação apresenta e de que ele não acredita haja um solução rápida para o conflito.
Na semana passada, no entanto, Trump se queixou de que Bolton e outros assessores subestimaram Maduro, segundo três altos funcionários do governo que, como outros entrevistados para esta matéria, falaram sob condição de anonimato para discutir deliberações privadas.
Trump disse que Maduro é "osso duro de roer" e que assessores não deveriam tê-lo levado a acreditar que ele seria deposto em 30 de abril – que deveria ter sido a fase final da Operação Liberdade, liderada por Guaidó.
Em vez disso, Maduro rejeitou uma oferta para deixar o país e duas figuras-chave em seu governo recuaram do que Bolton disse ter sido um plano para que eles desertassem do regime. Em resposta, Maduro zombou publicamente de Trump e disse que não ia a lugar nenhum, dizendo que os Estados Unidos haviam tentado um "golpe idiota".
Em retaliação à tentativa de levante, o serviço de inteligência chavista, com seus homens mascarados, deteve o vice-presidente da Assembleia Nacional, Edgar Zambrano, em uma operação dramática em Caracas, que marcou a primeira prisão de um alto funcionário da oposição. Zambrano é um dos 10 oficiais da oposição acusados pelo Supremo Tribunal chavista de traição, conspiração e rebelião por participação na Operação Liberdade.
Bolton revelou publicamente o plano de deserção para pressionar Maduro, o que, segundo autoridades dos EUA, funcionou. Elas alegam que Maduro está dormindo em um bunker, paranoico que auxiliares próximos o atacarão.
Mas Trump expressou preocupação com o fato de Bolton tê-lo colocado em uma posição na qual ele não se sente confortável, segundo um oficial americano familiarizado com a política EUA-Venezuela.
Os tuítes de Bolton, incitando Maduro a começar uma "aposentadoria antecipada" em uma "praia agradável" e pedindo deserções em massa, têm sido amplamente vistos como arrogantes, elevando a expectativa irrealista de quão rapidamente sua saída pode ser projetada.
Apesar de Trump ter reclamado que Bolton o colocou em um limbo na Venezuela, dois altos funcionários da Casa Branca afirmaram que Bolton continuará no cargo, concentrando seu trabalho na Venezuela.
Intervenção militar
A ameaça aberta do envolvimento militar dos EUA na Venezuela cresceu junto com a abordagem cada vez mais agressiva do governo com o Irã. Na semana passada, Bolton anunciou que um porta-aviões americano seria enviado para o Oriente Médio a fim de combater conspirações iranianas para prejudicar os interesses dos EUA na região.
Em ambos os casos, o governo adotou uma política de resistência que apela aos instintos de Trump para projetar o poder americano no exterior, mas que também ecoa o tipo de aventureirismo militar que ele há muito tempo ridiculariza.
Trump parece mais à vontade com a política do Irã, que se baseia em sua forte crença de que o ex-presidente Barack Obama calculou mal ao conseguir uma barganha nuclear com Teerã. Ele está menos à vontade com a crescente retórica sobre a Venezuela, que não representa uma ameaça militar direta aos Estados Unidos. Qualquer envolvimento militar dos EUA corre o risco de gerar uma 'guerra por procuração' com a Rússia, o principal aliado internacional de Maduro.
Trump falou positivamente sobre as ações russas na Venezuela após um longo telefonema com o presidente russo, Vladimir Putin, na sexta-feira (3). Ele disse que Putin "não está preocupado em se envolver na Venezuela, além de querer que algo positivo aconteça para a Venezuela. E eu me sinto do mesmo jeito. Queremos obter ajuda humanitária".
Seus comentários contrastaram com declarações anteriores do secretário de Estado dos EUA, Mike Pompeo, e do próprio Bolton, que acusaram a Rússia de apoiar Maduro com dinheiro e equipamento militar.
Durante o telefonema com Putin, Trump expressou sua preocupação com a segurança e a situação humanitária na Venezuela, segundo uma pessoa informada sobre a ligação. Putin concordou com a avaliação de Trump, mas disse que a posição dos EUA solidificou Maduro no poder. O presidente russo disse ainda que Moscou não estava vendendo novas armas para a Venezuela, mas mantendo contratos existentes, e também subestimou os investimentos financeiros da Rússia no país.
Os eventos de 30 de abril efetivamente arquivaram discussões sérias sobre uma resposta militar pesada dos EUA, de acordo com atuais e ex-funcionários do governo americano e consultores externos. Em vez disso, os funcionários dos EUA acham que o tempo está do lado deles e que Maduro cairá com seu próprio peso. Esse jogo de espera, por sua vez, representa um risco se Guaidó solicitar assistência militar americana.
O vice-presidente dos EUA, Mike Pence, foi comedido em suas ameaças a Maduro durante uma reunião de líderes latino-americanos em Washington, na terça-feira (7), dizendo que "Maduro deve ir", mas também sinalizando que isso não acontecerá rapidamente.
Pence anunciou a instalação de um navio-hospital da Marinha na região, em junho, e disse que os Estados Unidos suspenderiam as sanções contra um assessor sênior de Maduro que trocou de lado. Essa foi uma mudança em relação à retórica anterior sobre o aperto do jugo de sanções, com o objetivo de enfatizar que há recompensas na política dos EUA, além das pressões, disse uma autoridade sênior.
Bolton tem sido a voz mais alta dentro da administração em apoio a uma potencial resposta militar à crise política e humanitária na Venezuela, onde a escalada das sanções dos EUA não forçou Maduro a ceder o poder. Ele não foi o primeiro, no entanto. Trump pensou em invadir ou bombardear a Venezuela no ano passado, comentários que inicialmente foram considerados fantasiosos.
Abordagem de longo prazo
Trump agora não está inclinado a fazer qualquer tipo de intervenção militar na Venezuela, disseram dois funcionários e um assessor externo.
Trump, em reuniões no Salão oval e em telefonemas com consultores, questionou sua administração oferecer um apoio tão forte a Guaidó. Alguns funcionários da Casa Branca disseram que Trump gosta do líder carismático, a quem ele chamou de corajoso, mas se perguntou em voz alta se ele está pronto para assumir e o quanto o governo americano realmente sabe sobre ele.
Os muitos defensores de Guaidó dentro da administração dizem que ele provou ser o primeiro líder da oposição venezuelana a unir facções e representar uma ameaça credível a Maduro. Sua posição dentro do país é confirmada pelo fato de que Maduro não o prendeu nem o feriu, temendo uma reação adversa, disseram algumas autoridades.
O senador Lindsey Graham, republicano da Carolina do Sul, disse que não tem a menor preocupação de que os Estados Unidos estejam fazendo uma aposta ruim em Guaidó.
"Oh Deus, não. Melhor aposta", disse Graham. "Eu acho que ele é o futuro da Venezuela. Ele é jovem, ele é a solução - não o problema".
Graham também disse que Trump foi bem servido de informações por seus conselheiros, incluindo Bolton.
O senador republicano Marco Rubio, influente na formação das abordagens americanas à crise da Venezuela, disse que Trump e Bolton estão na mesma página e que apoia a política de esperar pela queda de Maduro.
"Trump está com o mesmo pensamento que eu tenho, e é isso que temos que manter o curso, está funcionando", disse Rubio em uma entrevista. Ele lembrou também que algumas das sanções mais severas dos EUA só agora estão tendo pleno efeito, inclusive semeando divergências entre os assessores de Maduro.
"Só agora você está começando a ver isso acontecer e eu acho que é isso que está causando um pouco dessa fricção interna no regime".
Líderes da Defesa dos EUA consideram qualquer cenário de intervenção militar em solo venezuelano como um atoleiro e alertam que armas como os mísseis Tomahawk correm um grande risco de matar civis.
No entanto, a Casa Branca pediu repetidamente que o planejamento militar de invasão.
Autoridades disseram que as opções em discussão, enquanto Maduro continuar no poder, incluem o envio de ativos militares adicionais para a região, aumentando a ajuda a países vizinhos, como a Colômbia, e outras medidas para fornecer assistência humanitária a venezuelanos deslocados fora da Venezuela. Opções mais avançadas incluem o envio de navios para águas da Venezuela como uma demonstração de força.
Outras etapas discutidas devem ser feitas depois que Maduro sair do poder, quando o pessoal militar dos EUA poderá ser autorizado a entrar na Venezuela para ajudar nas respostas humanitárias.
John Feeley, ex-embaixador dos EUA e analista político do canal Univision, disse que há outra razão pela qual a intervenção militar é improvável.
"Isso vai contra a narrativa da reeleição de Donald Trump em 2020. No momento em que você está tirando tropas da Síria, do Iraque, do Afeganistão, como você diz que vamos mandar 50, 100, 150 mil soldados americanos para um país onde você não pode diferenciar os bandidos dos mocinhos?", observou Feeley.
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