Paris A Turquia vai às urnas neste domingo. Mais do que um uma simples disputa pelas 550 cadeiras do Parlamento, essa é a escolha de um caminho: para que lado este país considerado no mundo como altamente estratégico por sua posição geográfica vai descambar? Para uma democracia no modelo ocidental ou para um modelo oriental mais conservador e religioso?
O primeiro-ministro, o islâmico moderado Recep Tayyp Erdogan, e seu partido AKP (Justiça e Desenvolvimento) têm boas chances de reeleição. As últimas sondagens apontam para uma vitória esmagadora do AKP: mais de 40% contra 21% para o CHP, partido de oposição que reivindica o status de guardião da herança do general Ataturk, o fundador da República.
Os efeitos das eleições de hoje se espraiarão além do território turco. Esse grande país se situa na divisa entre a Europa e a Ásia, fronteira quente, que corre entre Bulgária e Grécia de um lado, e Síria, Iraque e Irã do outro.
A Turquia tem outras singularidades. País muçulmano (99% dos seus habitantes são islâmicos) , em 1923 ele se tornou uma república laica fundada por Kemal Ataturk (18811938). Desde então, o país permanece fiel ao seu fundador sob o olhar rude de um Exército guardião dos dois traços de Ataturk: um nacionalismo passional e o apego ferrenho à laicidade.
Evidentemente, o furor islâmico que se projeta sobre o mundo desde o final do século passado não deixou indiferentes esses 70 milhões de muçulmanos. Mas, por enquanto, a Turquia segue um caminho original. Ela tem um primeiro-ministro islâmico e moderado, Erdogan, o que parece um pouco acrobático.
Desde 2002, Erdogan segue um caminho escarpado. Apesar de islâmico, ele mantém boas relações com os Estados Unidos. Ademais, tem se empenhado intensamente para fazer seu país entrar na União Européia. É também por isso, aliás, que sua vitória ou derrota neste domingo terá repercussões além do Bósforo e de Istambul.
O caminho audacioso percorrido por Erdogan é compreendido pelo povo turco. Tudo leva a crer que ele reencontrará sua maioria na eleição (as sondagens lhe conferem 40% dos votos). Mas uma parte da população permanece desconfiada. Ela teme que Erdogan, muçulmano fiel, aumente sua dose de "islamismo."
Os turcos mais avançados, ocidentalizados, das grandes cidades, os intelectuais, os ricos, os empresários, são claramente laicos Eles receiam. Notam, que apesar dos discursos sobre "a igualdade de mulheres e homens", Erdogan não tem nada a favor das mulheres, inferiorizadas no trabalho, submetidas cruelmente a seus maridos, e cobertas de vergonha se aparecem de biquíni.
É por isso que, em caso de vitória dos islâmicos moderados do AKP, o Exército não relaxará sua vigilância. Ele não brinca com a laicidade. Jamais hesita em atacar. Desde 1923, esse Exército já depôs quatro governos suspeitos de islamismo radical.
O vasto país muçulmano, encostado na Europa e na Ásia, escolherá a via moderna seguida desde 2002, essa síntese sutil entre o Islã e os valores das democracias ocidentais? Ou sucumbirá a uma das duas outras tentações que o obcecam desde 1923: de um lado, um islamismo frenético; de outro, a embriaguez nacionalista.
A vitória dos muçulmanos moderados do AKP não parece em risco. Resta a saber se essa vitória saberá afastar os múltiplos perigos que a espreitam: a agitação curda, a pressão dos "loucos de Deus", e também as tentações "bonapartistas" do Exército, caso Erdogan se deixe alijar pelos islâmicos puros e duros que nunca foram desarmados em seu próprio partido. E os resultados dessa eleição terão certamente um efeito direto em uma outra questão crucial: a entrada ou não da Turquia na União Européia.
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