Antes mesmo da Rússia deflagrar na semana retrasada a invasão à Ucrânia, muitas pessoas já faziam um paralelo com a situação do grande parceiro geopolítico russo, a China, e o vizinho por ele ameaçado, Taiwan.
Depois que Moscou iniciou a guerra contra a ex-república soviética, o slogan “Ucrânia hoje, Taiwan amanhã” foi usado em manchetes na ilha asiática e difundido nas redes sociais, refletindo uma preocupação crescente entre os taiwaneses.
“Acredito que a Ucrânia de hoje é Taiwan amanhã”, afirmou o soldado reservista Lung Wei-chen, de 69 anos, em entrevista ao Washington Post. “Outros países, incluindo os Estados Unidos, não são confiáveis, e só podemos contar com nós mesmos para defender Taiwan.”
Em declaração ao mesmo jornal, um alto funcionário da segurança nacional de Taiwan salientou que a guerra na Ucrânia acendeu um alerta sobre medidas a serem aceleradas pela administração da ilha.
“A partir da crise da Ucrânia, há muito que devemos fazer, mas são coisas que já estávamos fazendo antes. [Mas] talvez devêssemos fazer mais e mais rápido”, destacou o funcionário, falando sob condição de anonimato – entre as medidas, ele citou a reforma do sistema de reservistas de Taiwan e a compra de mais armas dos Estados Unidos.
Os governantes da República da China se transferiram para Taiwan após a derrota para os comunistas na Guerra Civil Chinesa, em 1949, e a ilha é administrada separadamente desde então, mas Pequim a considera uma província rebelde a ser reincorporada até 2049.
Desde o ano passado, a ditadura comunista tem aumentado as hostilidades contra Taiwan, com declarações reafirmando essa posição, invasões do espaço aéreo do país e exercícios militares na região.
No dia seguinte ao início da invasão da Ucrânia, a presidente de Taiwan, Tsai Ing-wen, descreveu a situação da ilha como “fundamentalmente diferente”. Entretanto, a preocupação cresce conforme as hostilidades de Pequim aumentam - no mês passado, o Legislativo local aprovou a adição de US$ 8,6 bilhões ao orçamento anual de defesa, de US$ 13 bilhões.
Contrariando a posição de Tsai, Enoch Wu, membro do partido da presidente, o Democrático Progressista, disse à NBC que Taiwan enfrenta a mesma ameaça que a Ucrânia: “um poder revisionista reivindicando outro país soberano como seu”.
“Acho que isso [invasão da Ucrânia] serve como um grande alerta de que a guerra é uma possibilidade”, afirmou. “As pessoas têm falado muito sobre o futuro das guerras estar ligado à guerra cognitiva, exclusivamente à desinformação, mas quando chegar a hora, os tanques vão rolar.”
Para a China, Taiwan é “assunto doméstico”
Na semana passada, uma delegação de ex-altos funcionários de defesa e segurança dos Estados Unidos esteve em Taiwan e reiterou apoio à ilha. Assim como a maioria dos países, os americanos não reconhecem Taipei; porém, apesar de desde os anos 1970 adotar a política de “uma China só”, Washington mantém com Taiwan compromissos de cooperação e ajuda militar.
“Chegamos a Taiwan em um momento muito difícil e crítico na história mundial. Como disse o presidente [Joe] Biden, a democracia está enfrentando desafios sustentados e alarmantes, mais recentemente na Ucrânia. Agora, mais do que nunca, a democracia precisa de defensores”, declarou Mike Mullen, ex-chefe do Estado-Maior Conjunto dos Estados Unidos.
Na segunda-feira (7), o ministro das Relações Exteriores da China, Wang Yi, reafirmou um argumento recorrente de Pequim, de que Taiwan e Ucrânia não poderiam ser comparados porque a ilha seria um “assunto doméstico” dos chineses, enquanto o conflito no Leste europeu é uma disputa entre dois países.
“Observamos que algumas pessoas enfatizam o princípio da soberania na questão da Ucrânia, mas continuam a minar a soberania e integridade territorial da China na questão de Taiwan. Este é um caso nítido de dois pesos, duas medidas”, reclamou.
No mesmo dia, a Rússia incluiu Taiwan em sua lista de nações “hostis”, numa resposta às sanções impostas a Moscou devido à invasão da Ucrânia.