Parlamentares da oposição ao governo de Recep Erdogan estão acusando os líderes da Turquia de entregar à China os uigures que vivem no país em troca de vacinas contra a Covid-19. Nos últimos meses, a polícia turca realizou buscas e prendeu cerca de 50 pessoas da minoria muçulmana em centros de deportação, um grande aumento em comparação a períodos anteriores, advogados disseram à Associated Press.
Embora não existam provas de um acordo de troca entre China e Turquia, a oposição turca teme que Pequim esteja usando as vacinas para barganhar a ratificação do tratado de extradição entre os dois países. Esse acordo, assinado em 2017, foi ratificado pela China em dezembro e pode ser avaliado na Turquia já neste mês.
A Turquia começou a sua campanha de vacinação contra o coronavírus com a vacina da Sinovac em meados de janeiro. Após atrasos nas entregas das doses da vacina, algumas pessoas no país começaram a questionar se a demora do envio seria uma punição de Pequim pelo atraso na ratificação do tratado de extradição entre os dois países.
O governo de Erdogan fez um acordo para receber 30 milhões de doses da Sinovac até o fim de janeiro, mas até o momento recebeu cerca de um terço desse total. As suspeitas sobre um possível acordo entre Ancara e Pequim surgiram em dezembro, quando o primeiro lote de vacinas que seria entregue à Turquia sofreu atraso de semanas. "Esse atraso não é normal. Nós pagamos por essas vacinas. A China está chantageando a Turquia?", questionou o deputado Yildirim Kaya, da oposição, segundo a AP.
Cerca de 50 mil uigures vivem atualmente na Turquia. Grande parte deles vêm da região de Xinjiang, na China, que é lar de cerca de 10 milhões de uigures. A minoria étnica é perseguida no país asiático; cerca de um milhão já foram encarcerados em campos que, segundo a China, servem para "reeducação política". Autoridades de direitos humanos, incluindo a organização Human Rights Watch, acusam Pequim de cometer prisões arbitrárias em massa, tortura, doutrinação política forçada e perseguição aos muçulmanos em Xinjiang. Recentemente, os Estados Unidos designaram de "genocídio" a repressão aos uigures no país asiático. A China, no entanto, nega repetidamente as acusações, alegando que promove apenas a "reeducação" dessa população para combater o terrorismo.
Os uigures que vivem na Turquia temem que o tratado de extradição, assim que se torne lei, resulte no seu pior pesadelo: a deportação para o país do qual fugiram para escapar da detenção em massa.
Autoridades dos dois países negam que o tratado de extradição tenha o objetivo de deportar uigures. Um porta-voz do Ministério de Relações Exteriores da China negou também que exista qualquer ligação entre o tratado e as vacinas. "Acredito que suas especulações são infundadas", disse Wang Wenbin em entrevista coletiva na quinta-feira, segundo a AP.
O ministro de Relações Exteriores turco, Mevlut Cavusoglu, afirmou que a questão dos uigures não está relacionada ao atraso nas vacinas. "Nós não usamos os uigures para motivos políticos. Nós defendemos os direitos humanos deles", disse.
Advogados que representam os uigures que foram detidos recentemente na Turquia dizem que, na maioria dos casos, a polícia não tem evidências de ligações com grupos terroristas, e que as prisões tiveram motivação política.
Com medo de que a nova legislação provoque um aumento nas deportações para a China, muitos uigures estão se mudando para a Alemanha, Países Baixos e outros países europeus.
Na sexta-feira (5), uigures que vivem na Turquia fizeram uma manifestação em frente à embaixada chinesa em Ancara, com cartazes que diziam "Onde está a minha família?" e "Liberte a minha família".