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Curitiba – A submissão mundial às decisões das grandes potências, mais evidente nas situações de guerra, confirmou o que os cientistas políticos temiam logo após a queda do Muro de Berlim (1989). O mundo se transformou num grande império e não há mais um país que possa se considerar totalmente independente das decisões dos Estados Unidos. Porém, nem todas as possibilidades de interferência nas decisões centrais foram eliminadas. Criada 60 anos atrás e cada vez mais assediada politicamente, a Organização das Nações Unidas (ONU) se tornou o plenário de discussões, o parlamento do império. Essa avaliação parte de especialistas que participaram na semana passada do 3.º Congresso Brasileiro de Direito Internacional, em Curitiba.

Após a queda do Muro de Berlim, a economia mundial desfez os laços mantidos com a antiga União Soviética e reforçou as ligações com os Estados Unidos, que mesmo diante da ameaça terrorista, se impõe enquanto a única grande potência econômica, militar e política, constata o doutor em Direito Internacional José Carlos de Magalhães, professor da Universidade de São Paulo (USP).

Em sua avaliação, a guerra no Iraque é uma prova de que as decisões das grandes potências prevalecem sobre as posições da ONU – a invasão do país árabe, em 2003, ocorreu mesmo diante da clara reprovação da organização. Por outro lado, a história recente mostra que países economicamente fracos conseguem levantar a voz nas assembléias da organização e mobilizar a opinião mundial, como tem feito o Brasil em busca de apoio à quebra de patentes de medicamentos.

A ONU não chegou a ser desmoralizada pela confirmação de que, apesar de ter sido criada para manter a paz mundial, possui pouca influência quando o assunto são conflitos armados, defende a doutora em Direito Internacional Araminta Mercadante, também docente da Universidade de São Paulo. A importância dos programas de ajuda humanitária seria um dos contrapontos.

Para ela, as reformas devem fortalecer a organização e ampliar a representação de regiões como a América Latina e a África. Por enquanto, a discussão ainda passa pela falta de consenso em relação ao tamanho da ocupação e à escolha dos representantes de cada região. O Brasil sonha com uma vaga para si, já a Argentina defende que a vaga da região seja ocupada em sistema de rodízio.

A força da ONU, por outro lado, não depende necessariamente da ampliação do número de vagas no Conselho, diz o professor Magalhães. Ele considera que o atual sistema – com apenas cinco cadeiras, ocupadas por EUA, Rússia, Reino Unido, China e França – manteve o interesse das grandes potências e fortaleceu a organização. O especialista diz que a importância social e econômica da ONU se perpetuou justamente por esse motivo. "Hoje, sem ONU, não tem palco, não tem fórum, não há discussão." Sem a presença das grandes potências, as decisões teriam peso menor e a organização seria extinta, considera. Por outro lado, ele não descarta mudanças drásticas. "Um ano antes da queda do Muro de Berlim, ninguém imaginava que a União Soviética iria se dissolver", afirma Magalhães.

Além da ONU, instituições como a Organização Mundial do Comércio (OMC) também estariam tentando cumprir o papel de fiel da balança, com a abertura de novos espaços para que legisladores e empresários debatam sobre a aplicação dos acordos internacionais. Apesar de a própria estrutura interna da OMC ser considerada pouco democrática, a resolução dos conflitos, com decisões favoráveis a países pobres, melhora sua credibilidade.

O fato de países supostamente prejudicados em seus interesses estarem mobilizando grupos de nações para cobrar a aplicação do direito internacional, lançando mão do mecanismo da pressão global, também descentraliza o poder de decisão, avaliam os especialistas. A pressão internacional produz bons resultados, diz o professor de Direito Internacional da USP Umberto Celli Jr. Ele considera, porém, que os interesses comerciais acabam prevalecendo e que causas como os direitos humanos muitas vezes são simplesmente usadas para aumentar a cobrança sobre países como a China.

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