Senadores democratas e republicanos chegaram a um acordo nos Estados Unidos para estender o teto da dívida do país até o início de dezembro, evitando assim - pelo menos temporariamente - uma crise que ameaça a paralisação do governo federal americano.
O anúncio foi feito pelo líder dos democratas no Senado americano, Chuck Schumer, nesta quinta-feira (7). O Senado aprovou horas depois um projeto de lei para resolver a questão, que ainda precisa da aprovação da Câmara dos Representantes, de maioria democrata.
Nesta semana, uma ideia curiosa começou a ser lançada no país: os Estados Unidos poderiam cunhar uma moeda única, de platina, com o valor de US$ 1 trilhão para escapar da crise.
O governo americano ficará sem dinheiro para pagar as suas dívidas em 18 de outubro, caso a ampliação do limite do endividamento não seja aprovada pelo Congresso americano. O governo gasta mais do que arrecada anualmente, e pode fazer empréstimos para compensar a diferença, porém, apenas dentro desse teto legal.
A ideia da moeda trilionária ganhou tração entre economistas da esquerda, mas a própria Casa Branca chegou a considerar a proposta brevemente. Porém, mesmo os defensores da ideia sabem que essa seria uma manobra insólita.
A solução mágica seria a seguinte: o Tesouro americano pode simplesmente cunhar uma moeda de platina de US$ 1 trilhão, a depositar, e usar o dinheiro para pagar suas dívidas sem contrair novo endividamento.
O economista com tendência à esquerda Dean Baker escreveu, em artigo de opinião para a CNN, que o presidente Joe Biden tem essa "carta na manga" caso o Congresso não suspenda o limite da dívida.
"Devido a um detalhe técnico na lei, o Departamento do Tesouro pode imprimir uma moeda de platina e atribuir um valor enorme a ela - digamos, US$ 1 trilhão - e vendê-la ao Conselho do Federal Reserve. Isso contornaria a necessidade de empréstimos", cogitou Baker em seu artigo, de 29 de setembro.
A moeda teria que ser de platina, já que a legislação limita a quantidade de papel moeda e de moedas de ouro, prata e cobre que podem circular simultaneamente. Mas não há limites para a quantidade ou o valor de moedas de platina em circulação.
A lei que permitira a criação de uma moeda sem a necessidade de aprovação do Congresso é de 20 anos atrás. Ela tinha o objetivo de facilitar a produção de moedas comemorativas para colecionadores, desde que fossem feitas de platina.
Pelo menos dois democratas do Congresso apoiaram a ideia. Mas além da questão da legalidade de tal solução - existe um debate sobre se o governo federal americano teria autoridade para adotar essa medida - economistas apontam que a solução "mágica" não seria uma ideia tão sensacional quanto parece.
As implicações para a economia de uma moeda de US$ 1 trilhão surgida praticamente do nada seriam "graves", avalia o economista Brad Polumbo.
"Uma das preocupações mais óbvias que as pessoas levantam com a ideia é que cunhar uma moeda de US$ 1 trilhão levaria à inflação ao aumentar a oferta de moeda, enquanto a economia de outra forma permanece inalterada", diz Polumbo em artigo para a Foundation for Economic Education.
Isso porque, com tanto dinheiro novo em folha, as outras moedas em circulação perdem valor - embora a moeda nunca entraria em circulação, ficando depositada no Fed.
Porém, o Federal Reserve americano poderia neutralizar esse efeito, explica Polumbo, citando o especialista em política monetária William J. Luther, que detalhou as ramificações da solução proposta. O Fed faria isso com a venda de títulos do tesouro ao público e destruindo o dinheiro recebido. Portanto, a hiperinflação não seria necessariamente uma preocupação, mas nesse caso também não haveria um resultado líquido monetário.
Outra preocupação seriam os impactos às políticas fiscal e monetária dos EUA. A política monetária, de responsabilidade do Fed, decide sobre o dinheiro em circulação na economia. Já a política fiscal trata dos gastos do governo, em decisões elaboradas pelo Congresso e a presidência. "A moeda de US$ 1 trilhão iria misturar completamente as duas. O presidente usaria política monetária (criando mais dinheiro) para resolver um problema fiscal (o governo perdendo capacidade de empréstimo)", explica artigo do Washington Post.
A secretária do Tesouro dos EUA, Janet Yellen, se opôs à criação da moeda trilionária para resolver a crise. "Eu me oponho a isso e não acho que devemos levar isso a sério", disse Yellen em entrevista. "É realmente um truque."