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Uruguai ruma para a esquerda

Pepe Mujica presenteia Lula com camisa de futebol do Uruguai: carisma perante as massas e discurso de esquerda podem decidir eleição | Roosewelt Pinheiro/ABr
Pepe Mujica presenteia Lula com camisa de futebol do Uruguai: carisma perante as massas e discurso de esquerda podem decidir eleição (Foto: Roosewelt Pinheiro/ABr)

No cenário político uruguaio, desenrola-se uma peça cujo ro­­teiro guarda um bom número de semelhanças com os eventos que estiveram em cartaz no Bra­­sil em 2002, quando da primeira eleição de Luiz Inácio Lula da Silva.

O favorito para vencer as eleições é um candidato carismático, reconhecido pelo poder de comunicação entre as massas. Passou por uma transformação estética; os cabelos revoltos fo­­ram domados e a barba, aparada. Embora perseguido pela ditadura militar, não mais proclama o discurso radical do passado, po­­rém ainda defende políticas so­­ciais e reformas estruturais. Seu partido, do qual foi um dos fundadores, é a principal agremiação de esquerda do país.

Esse ator principal no Uru­­guai de 2009 é José Alberto "Pepe" Mujica, de 74 anos, candidato a presidente pela Frente Ampla.

Faltando menos de dois meses para a eleição presidencial, Mu­­jica mantém uma confortável dianteira em relação aos principais adversários.

Com 45% das intenções de voto, deve ser eleito no segundo turno em disputa com Luis La­­calle, ex-presidente do Uruguai entre 1990 e 1995 e candidato pe­­lo Partido Nacio­­nal.

Apesar de ser o postulante oficial do atual presidente, Tabaré Vázquez, Mujica carrega a bandeira da mudança. Caso seu favoritismo seja ratificado, ele será o primeiro integrante do partido Tupamaro a alcançar o cargo máximo. Os tupamaros são uma legenda integrante da Frente Ampla (ver box).

Mujica, o ex-guerrilheiro que passou 15 anos preso du­­rante a ditadura uruguaia, também carrega consigo a responsabilidade de dar prosseguimento à chamada "guinada à esquerda" na política latino-americana. No início desta década, partidos e candidatos considerados de esquerda conquistaram a Pre­­sidência em vários países do continente. Lula no Brasil; Hugo Chávez na Venezuela; Rafael Correa no Equador; além do próprio Tabaré Vázquez no Uruguai. Todas foram vitórias de ruptura. Agora, no Uruguai, Vázquez terá a primazia de fa­­zer o sucessor.

Aproximações

José Mujica tem a característica de representar, ao mesmo tempo, a continuidade e a mudança. Des­­de o fim da ditadura militar, o Uru­­guai vinha sendo co­­mandado por advogados de ca­­belos e ter­­nos bem cortados, membros dos partidos conservadores. O pre­­­­cedente foi quebrado por Ta­­baré Vázquez, cabelos e ternos idem, porém médico e de esquerda.

Mujica confronta a persona tradicional da política uruguaia, e tenta se aproximar culturalmente da população média. É adepto de dois grandes hobbys uruguaios: andar de lambreta e xingar os argentinos.

Ficou fa­­moso o discurso em que chamou o casal Kirchner de "gângsteres" e os habitantes da Argentina de "totalmente irracionais".

Para Graciela Garcia, coordenadora de campanha de Mujica, os rompantes do candidato são parte de sua grande capacidade comunicativa: "Mujica fala a mesma linguagem do povo", afirma. "Em geral, as populações são movidas por grandes líderes, e é Mujica quem faz este papel hoje no Uruguai. As pessoas querem falar com ele, tocá-lo, pedir um autógrafo".

Graciela define a possível transição de Tabaré para Mujica como um "aprofundamento da mudança": "Tabaré foi um bom presidente, e Mujica vai manter a mesma linha de trabalho. A di­­ferença é que a preocupação fundamental dele é a questão agrária. Mujica vai lutar por justiça social e realizar reformas em educação, saúde e trabalho. As mudanças que se iniciaram com Tabaré Vázquez precisam continuar", defende.

Incógnita

Entretanto para o uruguaio José Gabriel Porcile Meirelles, economista da Universidade Federal do Paraná e estudioso da política de seu país-natal, a candidatura Pe­­pe Mujica ainda representa uma incógnita. "Mujica não adota um discurso político tradicional, mas sim um discurso pragmático e popular. É difícil saber quais são suas reais convicções", argumenta.

Segundo o acadêmico, o surgimento de Mujica representa transformações ocorridas dentro da Frente Ampla, que passou a interessar a base social uruguaia. "Um amigo meu costumava en­­contrar todos os seus amigos da classe média nas manifestações da Frente Ampla. Hoje não en­­contra mais ninguém", exemplifica. "Mujica está conseguindo apoio em cima desse fenômeno. Todos os candidatos moderados da Frente Ampla perderam nas prévias partidárias. Hoje, até quem é contra ele no partido se tornou aliado, por medo de uma eventual vitória da oposição", afirma.

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