O Vaticano afirmou nesta quarta-feira que uma carta enviada para bispos irlandeses a respeito das preocupações sobre os relatos à polícia de casos de abusos sexuais contra crianças foi "profundamente mal interpretada".
O porta-voz do Vaticano, reverendo Federico Lombardi, disse que na carta de 1997 a igreja queria apenas assegurar que os bispos irlandeses seguiriam precisamente as leis canônicas, de forma que os padres não tivessem bases técnicas para escapar à punição da igreja. Segundo o advogado do Vaticano, Jeffrey Lena, de forma alguma o documento instruía os bispos a desconsiderar a exigência de relatar os abusos às autoridades civis.
Lombardi e Lena divulgaram comunicados depois de a Associated Press ter revelado, ontem, que a carta de um importante diplomata da Santa Sé na Irlanda afirmava que a política dos bispos irlandeses de obrigar o relato de abusos à polícia "provoca sérias reservas de natureza tanto moral quanto canônica".
A carta cita a Congregação para o Clero do Vaticano, que havia revisado o documento irlandês. Na época, o órgão era presidido pelo cardeal Dario Castrillon Hoyos, que já defendeu várias vezes a prática da igreja de não relatar os casos de abuso à polícia.
O comunicado de Lombardi lembra que a carta do núncio do Vaticano, arcebispo Luciano Storero, foi escrita antes das instruções de maio de 2001, nas quais a igreja determina a todos os bispos do mundo a enviar os casos para a Congregação para a Doutrina da Fé, para revisão. O Vaticano afirma que as instruções de 2001 marcam uma mudança na forma de lidar com os abusos. Mas as normas não dizem nada sobre relatar os abusos à policia. Somente no ano passado o Vaticano publicou em seu site um guia não-oficial e sem peso legal dizendo que os bispos deveriam seguir as leis de cada país sobre o relato dos crimes, quando elas existirem.
A preocupação do Vaticano sobre a exigência de relatar os abusos se baseia em parte na regra de que informações passadas durante o sacramento da confissão devem permanecer confidenciais. Os advogados das vítimas dizem que esse caráter de confidencialidade se soma a uma política de encobrir os abusos e não relatá-los às autoridades civis. As informações são da Associated Press.