A correria para dar conta das obras que a Copa de 2014 exige deixa os urbanistas com uma ansiedade: como usar todo esse dinheiro e a exposição que o país terá na mídia para mudar de uma vez os estereótipos sobre o Brasil? Para eles, mostrar o país para o mundo de uma forma que atraia novos investimentos e turistas após estádios e ruas se esvaziarem seria um ganho muito maior do que obter o hexa ou heptacampeonato.
Foi o que Barcelona fez nas Olimpíadas de 1992. A cidade começou ali uma campanha de renovação de imagem (rebranding) que se tornaria modelo para arquitetos e gestores de todo o planeta.
Os espanhóis já se incomodavam havia muito tempo em serem associados à ditadura de Franco e à siesta. Incomodado, o pintor Joan Miró criou ainda nos anos 1980 uma logomarca em que "España" vinha logo abaixo de seu traço e cores calorosas.
Mas foi a realocação do porto de Barcelona, seguida pela preservação de prédios históricos e melhorias de infraestrutura que colocaram a cidade, e consequentemente a capital Madri, no top 20 do turismo internacional. A entrada da Espanha na União Europeia e a ajuda financeira que passou a receber também ajudaram, obviamente.
"Até os anos 70, Barcelona foi uma cidade um pouco negligenciada, não muito interessante. Os gestores colocaram ali muito esforço", disse à Gazeta do Povo o diretor da consultoria israelense E.Ketter, Eran Ketter. Ele é autor do livro Media Strategies for Marketing Places in Crisis (algo como "estratégias de mídia para vender lugares em crise").
Imagem não é tudo
Mas a história mostra que não basta vender o peixe sem entregar ao turista uma experiência condizente. Senão, ele volta para casa falando mal. Por outro lado, não adianta sair fazendo obras isoladas. É preciso ter um projeto, algo de que África do Sul é um ótimo exemplo. Ali, o rebranding esteve intimamente ligado ao planejamento e visão de um líder. Antes da queda do apartheid, o país era considerado muito perigoso e estrangeiros só o visitavam se obrigados por negócios. Com pulso firme e empatia, Nelson Mandela empreendeu em seu governo (1994-1999) a alocação sistemática de recursos para a unificação do país. Depois veio uma campanha com o slogan "A África do Sul é possível". O resultado foi a noção internacional de que "ali a África deu certo" e a atração de 8 milhões de turistas ao ano (o que aumentará muito com o início da Copa no país no mês que vem).
Outros países lucraram com uma explosão espontânea de propaganda com blockbusters que promoveram suas belezas. Foi o caso do Quênia após 1989, ano em que estreou "Out of Africa Entre Dois Amores", com Robert Redford, Meryl Streep e infindáveis pradarias repletas de animais prontos para colaborar com guias de safári.
Agora, países como Uganda e Nigéria fazem campanhas com slogans que destacam o calor e a magia do africano, mas não sempre com o planejamento necessário. "Muita gente não tem a visão ou a paciência para projetos de longo prazo", diz Ketter. "Querem atalhos. Dizem (aos consultores) dê-nos um visual melhor."
Hora do show
Além do planejamento de mudanças na infraestrutura e de uma campanha bem planejada de imagem, um instrumento muito eficaz no rebranding são os eventos culturais. Na Europa, cidades pequenas e grandes competem todo ano para obter o título de "capital europeia da cultura". Foi o que iniciou a transformação da maior cidade da Escócia, Glasgow, em 1990. Naquela época, a cidade sofria com conflitos entre forças de resistência. "Tinha bombardeios, revoltas violentas, tudo de ruim que se quer evitar", diz Ketter. De lugar decadente e frio, passou a grande ponto turístico, com foco no design e glamour.
Mas nem sempre uma campanha em que se investe muito funciona. A Polônia, por exemplo, ainda luta para se desvencilhar da imagem de "fria e sem sal". Antes mesmo de entrar para a União Europeia, em 2004, o país lançou uma logomarca alegre e contratou um dos mais respeitados consultores de marcas nacionais para transformar sua imagem. Não deu certo. A ideia que muitos têm do país, ainda, (excluindo os descentes de imigrantes na região de Curitiba), é aquela que o consultor Wally Olins identificou anos atrás. "Não é tanto que o país sofra um problema de imagem, e sim que não tem nenhuma imagem", disse à revista Dorchester.
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Aprovado