Num intervalo pouco inferior a três semanas, o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, passou de autor de alertas sobre uma possível guerra com a Colômbia a defensor da negociação do fim de décadas de conflito entre o governo colombiano e guerrilheiros de esquerda.
A súbita mudança de comportamento ocorre em um momento no qual Chávez busca um novo começo com o recém-empossado presidente da Colômbia, Juan Manuel Santos. Na última terça-feira, apenas três dias depois da posse de Santos, os dois governantes concordaram em restabelecer as relações diplomáticas, rompidas em 22 de julho.
Há uma questão em aberto com relação a quão genuína é a reaproximação e outra referente a quanto tempo ela pode durar. Entre as principais armadilhas estão a denúncia colombiana segundo a qual a Venezuela estaria tolerando a presença de guerrilheiros em acampamentos em seu lado da fronteira e a incerteza quanto à disposição de Chávez de oferecer a cooperação em segurança na qual a Colômbia há muito tempo insiste.
De qualquer forma, apesar das divergências ideológicas entre o presidente venezuelano de esquerda e o novo líder colombiano de direita, ambos possuem interesses comuns, como a retomada do comércio bilateral. Além disso, a disposição manifestada por Santos de dialogar com os rebeldes colombianos foi bem recebida por Chávez.
No encontro que tiveram no dia 10 na localidade colombiana de Santa Marta, a postura mais conciliatória de Santos em comparação com a linha dura adotada por seu antecessor, Alvaro Uribe levou Chávez a manifestar, em tom otimista, que os dois reconstruiriam "o que foi feito em pedaços".
O caso
As relações bilaterais entre Caracas e Bogotá foram rompidas por Chávez em 22 de julho, horas depois de a Colômbia ter apresentado perante a Organização dos Estados Americanos (OEA) o que qualificou como provas de que a Venezuela estaria tolerando, em seu lado da fronteira, a presença de aproximadamente 1.500 supostos integrantes dos grupos guerrilheiros Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) e Exército de Libertação Nacional (ELN).
Ao romper as relações, Chávez acusou Uribe de mentir e de estar se preparando para atacar a Venezuela da mesma forma como, em 2008, autorizou um ataque a um acampamento rebelde em território equatoriano.
Factoides
Com o passar dos anos, Chávez recorreu aos atritos diplomáticos com a Colômbia em diversas ocasiões para angariar simpatizantes, acusando o governo Uribe de atuar como fantoche dos Estados Unidos. Juan Manuel Santos serviu como ministro da Defesa de Uribe e compartilhou o crédito pelos ganhos militares da repressão às Farc, fato que, durante a campanha presidencial colombiana, levou Chávez a qualificar Santos como um "fomentador da guerra" e a advertir que a tensão bilateral poderia se agravar caso ele vencesse o pleito.
Chávez aparentemente mudou sua postura depois de Santos ter enfatizado seu interesse no restabelecimento pleno das relações especialmente do comércio bilateral, que beneficia os produtores de alimentos da Colômbia.
O comércio entre os dois países diminuiu drasticamente ao longo do último ano, em parte pelo fato de Chávez ter congelado as transações bilaterais em protesto contra a decisão colombiana de expandir o acesso do exército dos Estados Unidos a bases militares em seu território.
As preocupações de Chávez com relação à presença de tropas norte-americanas na região persistem e é provável que o antagonismo entre Caracas e Washington continue mesmo em um momento no qual o líder venezuelano tenta reparar suas relações com o principal aliado dos EUA na América Latina.
Chávez parece disposto a atenuar o tom de seu discurso se Santos for mais discreto ao levantar suspeitas contra a Venezuela no que diz respeito aos rebeldes e evitar acusações em público.
O líder venezuelano vinha afirmando que o principal requisito para a normalização das relações era o respeito mútuo, e o foi o que Santos prometeu a ele ao manifestar o desejo de uma "comunicação aberta e sincera".
A expectativa é de que Santos continue em busca da cooperação venezuelana na vigilância da extensa fronteira compartilhada pelos dois países, mas por intermédio de canais diplomáticos, e não de queixas em público.
Ainda não é possível prever até que ponto o comércio pode voltar a ser o que era, uma vez que a economia venezuelana está em recessão e o declínio nas importações da Colômbia tem sido apontado como responsável, em parte, pelos estritos limites impostos por Caracas ao mercado de câmbio. De qualquer forma, importar mais da Colômbia provavelmente resultaria em benefícios econômicos para a Venezuela, onde a inflação está na casa dos 30% ao ano e os itens importados da Colômbia foram substituídos pelos vendidos por outros países a preço mais elevado. No entanto, mesmo que Chávez e Santos prometam deixar de lado os atritos, ainda haverá tensões subjacentes.
Chávez assegura que seu governo não tolerará a presença de grupos armados estrangeiros em seu território e assegura que não ajuda as guerrilhas. No último fim de semana, o líder venezuelano fez um chamado público aos guerrilheiros a que libertem dezenas de reféns e percebam que "não há mais futuro" na luta armada.
No entanto, enquanto as autoridades colombianas acharem que a Venezuela não está agindo contra os guerrilheiros que se escondem ao longo da fronteira entre os dois países, o assunto pode voltar a causar atritos entre Bogotá e Caracas.
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