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| Foto: WILLIAM THOMAS CAIN/AFP

Contrariando a lógica, as disputas dentro dos partidos para a nomeação dos candidatos que vão concorrer à Casa Branca em novembro ficam cada vez mais acirradas à medida que as primárias ocorrem. Os resultados de Wisconsin, na terça-feira, fizeram reduzir ainda mais a liderança de Donald Trump, no Partido Republicano, e de Hillary Clinton, entre os democratas. O que amplia incertezas e aponta para uma convenção contestada, na oposição, e por uma longa e desgastante corrida no partido do presidente Barack Obama. Os vice-líderes na contagem de delegados nos partidos, Ted Cruz e Bernie Sanders, querem aproveitar a boa fase e dizem ver chances de viradas inéditas na disputa.

Se Wisconsin define relativamente um pequeno número de delegados em ambos os partidos, os resultados das primárias no estado aumentaram as incertezas. Bernie Sanders venceu a sexta disputa das últimas sete prévias e viu a liderança de Hillary na contagem total de delegados cair fortemente. O senador por Vermont agora já argumenta que pode vencer na primária fundamental do dia 19, em Nova York, que até então era vista como vitória certa para Hillary — que já foi senadora pelo estado por oito anos. Hillary teve de se voltar contra o oponente interno e fez duras críticas a Sanders.

Convenção contestada é mais provável

Mas a situação não se compara ao que ocorre entre os republicanos. A vitória de Cruz sobre Trump praticamente sepulta as chances do magnata de chegar à convenção de julho, em Cleveland (Ohio), com os 1.237 delegados necessários para ser aclamado candidato. Trump precisaria, segundo a CNN, conquistar 59% dos delegados que ainda serão disputados — algo que não obteve até o momento.

A corrida para Cruz tampouco é fácil: ele precisaria conquistar 88% dos delegados das prévias futuras. Assim, a convenção contestada é uma probabilidade cada vez mais real. Caso aconteça, a disputa ficará aberta, e inclusive novos nomes que sequer disputaram as prévias podem ser apontados como candidatos.

“No lado republicano, os fortes resultados de Cruz devem impedir que Trump conquiste a nomeação, criando a convenção contestada. E o momento de Cruz, junto à fraqueza de Trump, está mudando a corrida republicana”, afirmou Mitchell McKinney, professor de Comunicação Política da Universidade do Missouri.

Analistas como Nate Silver, do site especializado “Fivethirtyeight”, já veem Cruz como favorito para ser o nomeado na convenção contestada — segundo o próprio, o resultado de Wisconsin marca uma virada. Sua forte vitória mostra que o senador texano está conseguindo se firmar em outro tipo de eleitor, além do identificado com a extrema-direita ou os religiosos.

“Não temos certeza se os votos têm sido para Cruz ou se são, na verdade, contra Trump”, explicam Kyle Kondik e Geffrey Skelley, do projeto Sabatos’s Crystal Ball, da Universidade da Virgínia.

Trump, que vem de uma série de resultados ruins e de gafes que começam a abalar sua imagem, não parece dar o braço a torcer. Ele voltou a afirmar que vencerá fortemente em Nova York, seu estado natal, o que dará um novo gás a sua campanha. Sua porta-voz, Hope Hicks, afirmou que Cruz é um “cavalo de Troia”, usado pelos líderes do partido para barrar a indicação do magnata. Os sinais reforçam o temor de que, preterido, ele poderia tentar uma candidatura independente.

No primeiro discurso após a derrota de Wisconsin, Trump chamou o rival de mentiroso. Falando a uma plateia de Nova York, fez uma defesa emocionada de suas propostas polêmicas e voltou a dizer que “ama de coração” o povo daquela cidade, tentando se aproximar do eleitor e obter a maior vitória de sua campanha até o momento.

Do lado democrata, o franco favoritismo de Hillary começa a dar lugar a dúvidas. Sanders tenta aproveitar o momento e afirma ter chances de vencer na disputa de delegados definidos em primárias, e que automaticamente os superdelegados (políticos que votam livremente na convenção) o apoiariam — hoje, o grupo está em massa com a ex-secretária de Estado.

Sem alternativa, Hillary foi ao ataque para não correr o risco de perder em casa — mais que impacto moral, um fracasso em Nova York poderia gerar danos reais para a campanha, já que o estado aloca 247 delegados, ou 10,4% do necessário para a nomeação. Questionada numa entrevista do site “Politico” sobre se considerava Sanders um “verdadeiro democrata”, ela foi dura com o adversário: “Bem, não posso responder isso. Ele é relativamente novo como democrata e, na verdade, eu nem tenho certeza se ele é um. Ele está concorrendo como democrata, mas não sei bem como defini-lo”, alfinetou.

Disputa pode rachar democratas

Numa entrevista ao vivo na CNN — que fará um debate entre os dois na próxima quinta-feira — Hillary afirmou estar “confortável” com a disputa interna e disse ter uma larga vantagem na contagem de delegados sobre Sanders. Ela lembrou que tem ainda mais votos agora do que Barack Obama tinha no mesmo momento, em 2008, quando concorria justamente contra a ex-primeira-dama.

“Com base nas propostas do senador Sanders, o tamanho do governo federal aumentaria cerca de 40%. Todos os economistas progressistas que falaram sobre seu programa de saúde gratuita universal dizem que os números não batem”.

E mesmo que os analistas ainda duvidem de sua capacidade de virar o jogo, temem o impacto destas primárias desgastantes para a campanha de Hillary, que precisou de meses para vencer o senador de 74 anos, que aceita o rótulo de socialista — o que ainda se assemelha a um palavrão para alguns grupos no país.

“Temos que pensar sobre o número de delegados, e a matemática não mudou após a vitória de Sanders. Em Wisconsin ele conquistou 48 delegados, contra 43 de Hillary. A esse ritmo, Sanders nunca vai ultrapassá-la, ou impedi-la de obter a nomeação”, afirmou McKinney.

Mas o estrago pode estar feito: “Sanders não será o candidato, a liderança de Hillary é intransponível. Mas está fazendo um trabalho suficientemente bom, que deve preocupar os democratas sobre a unidade do partido. Será que os eleitores de Sanders vão aceitar Hillary como candidata? De que maneira?”, questionaram os autores do “Sabatos’s Crystal Ball”.

Agora, todos os olhos se voltam para Nova York. Mas nada indica que o estado irá liquidar a disputa. Pelo contrário: nos dois partidos, a corrida tende a seguir até a primária da Califórnia, dia 7 de junho. E, para os republicanos, pode se estender até a convenção de julho.

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