Escola de Música e Belas Artes é um dos marcos da cultura paranaense, mas há pelo menos 20 anos mendiga lugar para se desenvolver como espaço criativo
O descaso com a Escola de Música e Belas Artes do Paraná (Embap) se tornou um solene exemplo de desperdício de capital humano e cultural infeliz legado de nossa miséria. A "Belas", como é chamada, projeta o estado no campo da produção artística desde 1948, ano de sua fundação. Modesta no aparato, faz o Paraná dialogar com o mundo da alta cultura. E, se parecer pouco, é bom lembrar que a cultura elaborada faz parte da terceira maior fonte de renda do mundo, a indústria do entretenimento.
Mais? Guido Viaro, Theodoro de Bona, Bento Mossurunga... Difícil citar um standard da cultura local que não tenha cruzado o portão torneado da sede histórica, na Rua Emiliano Perneta, para lecionar ou para estudar, quando não os dois. Sim, a Belas tem tradição, desafiando as embalagens dessa nossa era fugaz, líquida e presentificada.
Há argumentos a rodo para colocar a escola entre as prioridades educacionais do Paraná. Mas... saliva gasta. Contra todas as evidências, a Belas acumula pelo menos duas décadas de agonia. Nesse tempo, mendigou reparos na sede histórica a reforma meia-sola feita em 1995 não foi capaz de sanar as dificuldades estruturais do prédio, nem de botar cupins para correr ; sofreu contínuas ameaças de fusão com a Faculdade de Artes do Paraná; e experimentou os dissabores da vida de retirante. A cada vez que o chão da sede histórica treme, a Belas sobe no caminhão de mudança.
Ora, por mais brilhantes que sejam seus professores, não há qualidade de ensino que resista a tamanha instabilidade, ainda mais quando se está sujeito à marcha lenta da burocracia. Beira o grotesco. Nos anos em que a Belas pedia expansão para atender às novas demandas das linguagens artísticas , teve de se limitar a passar o chapéu, pedindo o mínimo: um teto que não desabasse, um piso que não afundasse. Um dos capítulos dessa crônica sinistra se deu em 1993, quando uma chuva arruinou o forro miserável de um edifício provisório, na Rua Trajano Reis, para o qual a escola tinha sido recentemente transferida. Virou motivo de chacota: jurava-se que a sede da Emiliano cairia "em questão de horas", mas o que ruiu foi o puxadinho onde o governo, então, desejou asilar a escola, perto do Cemitério Municipal. Não tem sido muito diferente nos últimos tempos.
Em meio à falta de afeto oficial, é notável o apreço dos alunos pela Belas. Em 20 anos de crise após crise, parte dos pouco mais de mil alunos da instituição não fica de bico calado. São antológicas as manifestações na Rua Emiliano Perneta, as velas acesas e as frases espirituosas escritas na fachada "crimes delicados" perto da situação a que gerações inteiras estão sujeitas a cada vestibular. Infelizmente, os estudantes podem pouco diante da politização da escola, no sentido imoral da palavra. Qual outras instituições públicas, a exemplo da UFPR, a Embap mais de uma vez serviu de moedinha barata nos labirintos do poder. De pouco adiantou. Ficou sempre na rabeira, só vendo multiplicarem-se seus problemas de "saneamento básico". O Brasil, uma pena, tem baixa prática de egressos em instituição de ensino. Mas, se cada "ex" da Belas pusesse a boca no trombone, o estado que cultivou a fachada de "amor à cultura" veria ele o seu teto desabar. São muitos os notáveis e famosos que cursaram a Belas de Juarez Machado a Denise Sartori, Eliane Prolik e uma safra de paranaenses que brilham em orquestras internacionais.
O atual momento é de esperança renovada. A diretora Maria José Justino bate nas portas atrás de uma sede que mereça esse nome. E a aproximação do secretário de Educação Flávio Arns propondo contrapartida da Belas com as escolas estaduais soa como uma esperança. Mas alto lá. Mal não fará aos colégios participar de intercâmbio com a mais importante instituição artística do estado, desde que fique claro que a Embap não é um centro de arte-educação, mas de criação artística. Não se trata de lhe arrumar uma utilidade para que possa existir, o que parece ser uma perigosa mensagem subliminar, mas de lhe garantir condições para experimentar linguagens, atrair pesquisadores e talentos, como lhe era de praxe. Esse é o maior contributo que pode dar ao ensino.
Seria uma grande notícia se, ao fim de 2013, se pudesse noticiar como um dos grandes feitos do ano que a Belas ganhou sede espaçosa, bem instalada. E que seu prédio histórico foi mantido como marco urbano. Não custa sonhar, dizem todos os bordões de réveillon. Que viva a Belas!