Decorridos trinta anos desde a ocorrência da geada que praticamente destruiu a cafeicultura do Paraná e ocasionou irrecuperáveis estragos econômicos e sociais, especialmente o desemprego e o êxodo rural, é perceptível o funcionamento, no estado, de um aparelho produtivo menos sensível às agruras climáticas e mais atrelado aos ambientes econômicos nacional e internacional.
Nem por isso caberia o exagerado diagnóstico de que aquele terrível acidente climático teria forçado um despertar coletivo (público e privado) na direção da mudança radical do perfil econômico do Paraná. Isso porque, por ocasião do rigoroso inverno de 1975, a base econômica estadual já estava ingressando no terceiro estágio de transformações de sua estrutura produtiva, marcado pela continuidade da diversificação do agronegócio e pela implantação de indústrias de ponta.
Mais precisamente, o primeiro momento de mudanças teria acontecido nos anos 1960, diante dos sinais de exaustão de um ciclo baseado na operação de uma indústria com baixo grau de elaboração e da urgência de uma maior integração interna e externa do estado. Assim, o governo decidiu aplicar expressivo volume de recursos na montagem da infra-estrutura econômica, particularmente em transportes rodoviário, ferroviário e portuário, em geração de energia elétrica, e em implantação das redes de telecomunicações e de armazenagem de produtos agrícolas.
Essas iniciativas foram amparadas financeiramente pelo Fundo de Desenvolvimento Econômico (FDE) e pela Companhia de Desenvolvimento do Paraná (Codepar), criados em 1962. Por ser constituído por um adicional restituível de 2,0% sobre a alíquota de 4,5% do Imposto sobre Vendas, Consignações e Transações (IVC), atual ICMS, o FDE representava um verdadeiro orçamento paralelo tanto para gastos e investimentos públicos quanto para a disponibilização de recursos para giro e investimentos da iniciativa privada, ou mesmo para a participação acionária pública em empreendimentos estratégicos.
A segunda etapa de alterações econômicas relevantes deu-se no primeiro qüinqüênio dos anos 1970, quando houve pronunciada influência do processo de modernização/diversificação da agricultura, derivado de uma estratégia federal que objetivava a auto-suficiência do país na produção de alimentos. A expansão das lavouras de soja e trigo abriu flancos para a introdução de novos segmentos agroindustriais, sustentados em corporações multinacionais. Ainda nesse intervalo, foi instalada a indústria cimenteira na Região Metropolitana de Curitiba (RMC), visando ao suprimento da crescente demanda por insumos utilizados pela construção civil, que estava em franco crescimento, por conta da elevação das demandas dos setores primário e institucional.
O terceiro estágio verificou-se na segunda metade dos anos 1970, e foi caracterizado pela consolidação de atividades industriais estruturantes e inovadoras, com a implantação da Cidade Industrial de Curitiba (CIC) e da Refinaria Presidente Getúlio Vargas (Repar), expressando no estado a marcha de desconcentração da indústria brasileira, ocorrida durante o II Plano Nacional de Desenvolvimento (PND).
Esse curso de profundas transformações foi interrompido nos anos 1980, em razão do esgotamento do modelo nacional de desenvolvimento baseado na substituição de importações, na intervenção estatal e no endividamento externo. Mesmo assim, houve continuidade na modernização do agronegócio estadual (com destaque para a produção de carnes, álcool, malte e derivados do milho), além da maturação plena das grandes inversões realizadas no final dos anos 1970 e início dos 1980 (fertilizantes, caminhões e ônibus, cigarros e computadores) e da efetivação de alguns projetos de investimento, particularmente nos ramos de siderurgia e refrigeradores.
Na primeira metade da década de 1990, a economia estadual passou a refletir as transformações estruturais ditadas pela intensificação da abertura comercial, pela desregulamentação dos mercados e pelas privatizações verificadas no país. Também foi acelerado o processo de reestruturação industrial, voltado à adaptação das empresas às novas condições concorrenciais determinadas pelo panorama de abertura.
A partir de 1995, o Paraná deu largada à construção do quarto estágio de diversificação e sofisticação econômica, habilitando-se a disputar os novos investimentos industriais atraídos pelo país, com a estabilização monetária e o aprofundamento da liberalização comercial. De fato, o estado utilizou um conjunto de atrativos, sintetizados nas vantagens locacionais e infra-estruturais e nos incentivos fiscais e financeiros à instalação e/ou ampliação de segmentos dinâmicos.
Tudo isso conferiu uma nova fisionomia econômica ao Paraná, bastante diferente daquela dependente das grandes fazendas de café e das inúmeras serrarias, predominantes nas décadas de 1950 e 1960. Na era da globalização, para o bem ou para o mal, o Paraná deixou para trás a subordinação aos ciclos econômicos, como tropeirismo, erva-mate, madeira, café e soja. A estrutura produtiva do estado exibe um retrato mais diversificado, ancorado na indústria automobilística, no agronegócio cooperativista, no complexo madeireiro papeleiro e na construção civil. Em sendo assim, as intempéries climáticas tem peso menor.
Gilmar Mendes Lourenço é economista e coordenador do Curso de Ciências Econômicas da FAE Business School Centro Universitário.
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