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O governo e o PT – cabeças da mesma hidra –, depois de longa temporada de encolhimento acuados pelo escândalo da corrupção, aproveitam a pausa do cansaço da opinião pública, na expectativa dos resultados das CPIs e o pé atrás de medo de mais uma decepção, para a manobra tática da reação na tentativa de passar à ofensiva. Não deu certo porque não podia dar certo. Soou em falsete, como quem finge que está tudo bem depois do embaraço do engasgo em almoço de cerimônia. O mesmo erro reincidente, contumaz, marca gravada com ferro em brasa pelo presidente Lula no governo e que pegou como praga no Partido dos Trabalhadores, parceiro na mesma agonia da desmoralização. Lula erra no remédio, na dose e, principalmente, no tempo. Chega sempre atrasado e com o jeito encafifado de vezeiro incorrigível. Foi ao fundo negro da depressão quando as águas podres da roubalheira do caixa 2 e do mensalão inundaram o governo, invadiram o Palácio do Planalto, passaram debaixo da porta do seu gabinete, provocando baixas no núcleo duro com a saída do ainda deputado José Dirceu da Chefia da Casa Civil, outras baixas e um estrago dos diabos na imagem do obsessivo candidato à reeleição.

Bastou a aragem enganosa da trégua, para que o PT botasse as mangas de fora e, dando uma de esperto, reclamasse em nota oficial da perseguição das CPIs pilotadas pela oposição para exigir que as investigações fossem mais longe no recuo aos oito anos dos dois mandatos do governo do presidente Fernando Henrique Cardoso, para a devassa das denúncias de milionários desvios nas muitas privatizações, como a da Vale do Rio Doce, além de outras mazelas enterradas no esquecimento.

No contracanto, nas suas andanças de candidato e no esforço para ficar o mais tempo possível a léguas de distância da Brasília e da chatice da administração, desabafou a sua irritação contra a temida CPI dos Bingos, a única com maioria oposicionista, com a frase que enriquece a sua coleção de tolices: "Estou esperando essa CPI convocar um bingueiro". Queimou a língua. Em cima da bucha, no palco da CPI, desfilou com garbo capenga, o esquema de tráfico de influência, armado pela multinacional Gtech do Brasil, na renovação do contrato de R$ 650 milhões com a Caixa Econômica Federal para o processamento de loterias. Com o bate-boca de sarjeta entre os cinco acareados e largo consumo de desaforos cruzados, acusações de roubo e propinas. Entre os atores da chanchada, o ex-assessor da Casa Civil, Waldomiro Diniz, o bicheiro Carlos Cachoeira e dois ex-diretores da Gtech.

No mesmo compasso desastrado, na reunião do Conselho de Desenvolvimento Econômico, o ministro das Relações Institucionais, Jacques Wagner, imprensado pelas críticas do empresário e ex- assessor de Lula, Oded Grajew, à omissão do governo no combate à corrupção, cunhou a explicação para o caixa 2 e o mensalão que merecia ser gravada em bronze: "O problema é tipicamente de financiamento irregular de campanha". E o fecho em ouro: "A gente vai se habituando a conviver com algumas coisas." Portanto, nada a estranhar e punir, pois a corrupção inclui-se entre as coisas com as quais "a gente vai se habituando a conviver". Trata-se de um costume, uma característica da cultura nacional. Depois que o presidente Lula, falando de improvisou, aplicou o substantivo concretude com o correto significado de qualidade do concreto, nada mais deve esbugalhar nossos olhos de espanto. A torcida e o empenho do governo para que as CPIs acabem no ridículo de um arranjo de comadres é mais uma perda de tempo, além de erro tático. A pressão da mídia, o instinto de sobrevivência dos senadores e deputados, a impaciente cobrança da sociedade exige a punição da quadrilha, ainda incompleta. No rosário de erros da incompetência, da arrogância, da omissão desperdiça o tempo como todo malandro que se preza. Lula orgulha-se de conhecer o país como ninguém. Para quê? Rodou 90 mil km de estrada na Caravana da Cidadania. Viu os buracos, os estragos e pegou o Aerolula. Agora, com mais um ano e três meses de mandato, promete liberar R$ 800 milhões para recuperar a rede rodoviária em pandarecos, a exigir, segundo avaliação técnica, o mínimo de R$ 12 bilhões. Nesta cadência, necessitaria de mais três mandatos.

No mesmo caçuá do esquecimento, o polêmico projeto de transposição das águas do Velho Chico há dois anos e nove meses espera pelo resgate da promessa de campanha. Agora, é tarde. O governo acabou e deve rezar para que o bispo de Barra, Dom Flávio Cappio, não se transforme no mártir que atormente as insônias presidenciais.

O sonho da reeleição está mais para pesadelo.

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