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Numa de suas frases inspiradas nos ideais republicanos, que sempre defendeu com impressionante entusiasmo e veneração cívica, Ruy Barbosa (1849–1923), jurisconsulto, escritor, advogado, jornalista, orador e político, disse que a imprensa é "a vista da Nação".

Nenhum outro brasileiro seria mais qualificado para manifestar esse sentimento que o abolicionista histórico, a Águia de Haia, como ficou conhecido em face da magnífica representação de nosso país na Segunda Conferência da Paz, realizada na sede da Corte Internacional de Justiça (1907). O líder republicano (vice-presidente do Governo Provisório e ministro da Justiça) e defensor do regime federativo, elaborou a primeira Constituição republicana (1891). Suas denúncias pela imprensa, os habeas corpus memoráveis no Supremo Tribunal Federal em favor de perseguidos políticos e a sua heróica rebeldia colocaram-no em confronto irreversível com o governo do presidente Floriano Peixoto (1839–1895). Mesmo não tendo participado da famosa Revolta da Armada (1893), o imortal tribuno foi obrigado a sair do país. Primeiramente exilou-se em Buenos Aires, depois Lisboa, Paris e finalmente em Londres, onde ficou dois anos. Através da imprensa inglesa repudiou a injustiça da condenação do capitão francês Alfred Dreyfus (1859–1935), por um conselho militar sob a acusação de espionagem em favor da Alemanha. A sua denúncia repercutiu em Paris e no Brasil antes mesmo da célebre defesa feita por Émile Zola com o famoso artigo "J’Acuse", publicado no jornal L’Aurore (1898).

A decisão do ministro Celso de Mello, arquivando o processo contra o colunista Diogo Mainardi, se insere entre os grandes julgamentos do Supremo Tribunal Federal. O artigo "Quero derrubar Lula", publicado na revista Veja de 3 de agosto, foi qualificado pelo advogado que iniciou a causa como "crime de subversão contra a segurança nacional" ou seja, um "crime" contra a pessoa do chefe de um dos poderes da União e que o texto – de sabor crítico e irônico – estaria "colocando em perigo o regime representativo e democrático brasileiro, a Federação e o Estado de Direito". Nada mais esdrúxulo.

A memorável decisão, prestigiada pelos mais variados núcleos do pensamento nacional, revela a importância do Judiciário independente num Estado Democrático de Direito. Ruy Barbosa chegou a beijar solenemente a mão do único magistrado do Supremo Tribunal Federal que dera um voto favorável num habeas corpus impetrado por ele em favor de oprimidos pelo regime do marechal de ferro. Registra a antiga crônica forense que quando disseram a Floriano que os juízes da mais alta corte de justiça iriam conceder habeas corpus em favor dos revoltosos, ele teria disparado: "E quem vai dar habeas corpus para eles"?

Nos dias correntes e em especial na cobertura jornalística dos escândalos que estão sendo apurados pelas Comissões Parlamentares de Inquérito do Congresso Nacional (correios, mensalão e bingo), o povo está acompanhando pelo rádio, televisão, jornais e revistas não somente os detalhes das investigações como assistindo e estimulando o grande debate nacional sobre a importância dos valores éticos na vida política.

A descoberta e a mostra desses formidáveis corpos de delito não seria possível com a censura da imprensa assim como pretendia o malsinado projeto de criação do Conselho Federal de Jornalismo, um arremate simplista dos piores instrumentos de opressão das liberdades do espírito.

É oportuno, em favor da liberdade do pensamento, transcrever literalmente o que disse Ruy Barbosa em complemento à expressão usada no início desta crônica: "A imprensa é a vista da nação. Por ela é que a nação acompanha o que lhe passa ao perto e ao longe, enxerga o que lhe malfazem, devassa o que lhe ocultam a tramam, colhe o que lhe sonegam ou roubam, percebe onde lhe alvejam ou nodoam, mede o que lhe cerceiam ou destroem, vela pelo que lhe interessa, e se acautela do que a ameaça." (A imprensa e o dever da verdade", p. 15).

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