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Opinião do dia 3

A simulação na luta pela vida

É o título de um livro de José Ingenieros, psiquiatra, psicólogo, professor, autor de obras que empolgaram a cultura do último século e cujas páginas me ocorrem aos lamentos da situação que aí está.

Nascido em Palermo, no dia 24 de abril de 1877, consagrou-se, pela importância de suas idéias, gênio da época com vários anos de residência em Buenos Ayres.

A simulação (disfarce, mentira, hipocrisia) é a forma mais arcaica na luta pela vida. O indivíduo adota um tipo específico de atitudes a fim de auferir as vantagens que a sociedade ou a lei podem lhe proporcionar. Compõe uma falsa identidade, alheia ao que realmente é, expresso em um modelo capaz de lhe dar riquezas e mandos.

Essa falsidade, que tem como símbolo o camaleão ao trocar de cor, igualando-se ao meio em que vive, é o mais comum dos recursos humano, desde as crianças no pretexto de doenças para faltar as aulas, dos recrutas diante do serviço militar, dos funcionários públicos com o atestado médico e dos mais ávidos na conquista da aposentadoria.

O mais freqüente, natural e infalível apelo na luta pela vida, encontradiço em todos os níveis sociais, seria o máximo da utopia esperar que não fosse usado e abusado pelas felpudas raposas que hoje se debatem nas malhas das CPIs, num festival de mentiras jamais visto na historia do planeta..

Homens dignos e respeitáveis, investidos das mais altas condecorações nacionais, tremem, gaguejam e se perdem, tais meninos de colégio, à procura da melhor farsa para se eximirem das patifarias que articularam, dos crimes que praticaram, dos roubos que cometeram.

E mentiram, medrosos e despudorados, mentiram a granel, mentiram todos, deslavada, cínica e hipocritamente para milhões de brasileiros vítimas de facínoras arvorados em donos do mundo e da verdade.

O quadro cada vez mais caótico se espraia pela televisão, jornais e revistas dando conta da extensão de uma barbárie que já esgotou os piores adjetivos do vernáculo lusitano.

Panorama que bateu às portas do Palácio do Planalto, a obrigar diante de um microfone o indigitado autor de toda essa babel, o único que de tudo sabe e tudo nega num esforço inédito para salvar a pele. E na parafernália adrede preparada para explicações ao povo, o presidente atingiu os primores do mestre que efetivamente é. Seus áulicos, companheiros e adversários se sentiram meros aprendizes, curvados e abatidos ante seu talento na simulação da luta pela vida.

Sem pejo ou emoção, frio e forte, encarnou de pronto o personagem ideal. No semblante contrito tal um sacerdote na hora sacramental da eucaristia, na tonalidade da voz, lenta e pausada, buscando a inocência e transmitindo a persuasão, na postura solene de um magistrado no transe da sentença cruel, nas pausas definidas e bem postas, sua excelência deu ênfase ao texto escrito por Tarso Genro, com a inclusão de eventuais improvisos de sua própria lavra.

Mas a emenda saiu pior do que o soneto. De principio as aptidões de seu governo a enumerar feitos e virtudes, numa ficção de extremo mau gosto. Devia saber, o tribuno, que elogio em boca própria é vitupério. E vitupério é sinônimo de crime, vileza, infâmia. A seguir, um sermão de desculpas ao povo, inserindo uma velada semiconfissão de metas descumpridas em razão de fatores alheios à sua vontade.

A seguir as juras de que nada sabia e o propósito de uma averiguação severa de todas as tramas com exemplar punição dos culpados, homens que traíram sua confiança e responderam com ingratidão aos extremos de sua generosidade. Uma lástima ver no presidente a imagem de um detento.

Para alguns Lula está no fim. Navegador de um barco à deriva, sem comando e sem bússola, refém de uma tripulação amotinada, a qual se subjuga por desconhecimento de rumos, correntes e marés. Ignorante, também, dos ventos, das calmarias e das tempestades não ousa uma opinião, um parecer, um voto, um veto.

À sua volta uma turba de voluntários se apresenta no afã de mais acuá-lo com o depoimento de escabrosos casos que desejam contar, provar, documentar.

O jurista Hélio Bicudo, personalidade tradicional de nossa trajetória política, não faz cerimônias em dizer que "Lula esconde a sujeira debaixo do tapete. Sempre agiu dessa forma. Seu pronunciamento de sexta-feira confirma. Lula mantém a postura de que não faz parte disso e não abre espaço para uma discussão pública. Quer, a qualquer preço, o usufruto do poder mas sem o ônus do trabalho, objetivo que tenta conseguir com a corrupção do Congresso Nacional"

Em outro tópico afirma-se que o presidente só não caiu por falta de um Carlos Lacerda, Leonel Brizola, Oswaldo Aranha, homens com H, diferente dos atuais tímidos e fracos, seguidores, do "vamos deixar como está para ver como fica". São os que optam pela prudência, tementes às conseqüências de um impeachment imediato. Tais facções já se digladiam nas ruas em passeatas e confrontos.

No assomo da tragédia surge um herói disposto ao supremo sacrifício. Severino Cavalcanti, estóico e impoluto, caráter sem jaça é o nome do homem pronto para assumir o cargo. "Já revelei minha competência na Câmara e melhor farei no posto supremo". Não se afoite deputado ilustre. O apressado come cru. A escolha será em 30 dias por eleição indireta, segundo a Lei.

Enquanto isso o povo inquieto reza pela melhor solução que não vem.

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