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A partir da segunda quinzena de agosto, passaremos a conviver com um novo e gigante órgão arrecadador de impostos e contribuições. Trata-se da Receita Federal do Brasil, resultado da união da conhecida Receita Federal com a área de arrecadação e fiscalização da Previdência Social, conforme prevê a medida provisória que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva baixou na última quinta-feira – na mesma ocasião em que, ao dar posse a novos ministros, confirmou a estratégia de impor um "choque de gestão" nesses meses finais de seu governo como resposta à crise que o avassala. O novo órgão já vem sendo chamado de Super-Receita, já que seu objetivo é juntar em uma única estrutura a arrecadação e a fiscalização de todos os impostos do país.

A pílula foi devidamente dourada pelo novo ministro da Previdência, o técnico Nelson Machado. Para ele, a Super-Receita será um instrumento mais racional de arrecadação e de apoio aos empresários, que passarão a enfrentar uma burocracia reduzida à metade tanto para pagar os tributos que devem ou para obter certidões. Com o que o empresariado não concorda: "Essa centralização de poder leva à ineficiência que, por sua vez, leva à corrupção. Uma medida como essa só seria aceitável se viesse junto com uma simplificação dos processos de arrecadação", rebateu o presidente da Associação Comercial de São Paulo, Guilherme Afif Domingos.

Realmente, não é esta a questão mais fundamental. Fundamental é o fato de que a intenção do governo foi criar um torniquete ainda mais apertado para garantir o aumento da arrecadação previdenciária mediante o cruzamento imediato pela fiscalização – agora única – dos dados contábeis (sobre os quais incidem todos os impostos) com os da folha de pagamento das empresas (sobre os quais pesam os encargos previdenciários). Em resumo, a Super-Receita acrescentará garras e dentes ao Leão para fazê-lo apanhar os sonegadores e fraudadores da Previdência, cujo déficit, atualmente calculado em cerca de R$ 35 bilhões a R$ 40 bilhões anuais, constitui-se numa das causas do endividamento público.

Lembremo-nos, no entanto, que o déficit da Previdência tem inúmeros motivos, que não se situam necessariamente no estrito campo da exigüidade da arrecadação direta na folha de pagamento frente aos seus gastos com aposentadoria e pensões e outros benefícios. Esta é uma causa verdadeira, mas não é a única e nem a maior. A maior está no fato de que o sistema previdenciário, por força da Constituição, paga benefícios para uma multidão que nunca contribuiu (trabalhadores rurais, idosos etc.), gerando fenomenal e permanente desequilíbrio em suas contas.

Ocorre, porém, que o governo arrecada alguns impostos e contribuições criados exclusivamente para pagar essa parcela de não-contribuintes e a seguridade em geral, como é o caso da Cofins, da Contribuição Social sobre Lucro Líquido (CSLL) e das loterias. O montante dos recursos não incidentes sobre a folha de pessoal das empresas é superior à necessidade do sistema para manter equilíbrio orçamentário. Portanto, em tese, não há déficit. O problema está no desvio pelo governo desses recursos para outras finalidades, dentre as quais a formação do superávit primário para pagar o serviço da dívida.

Vê-se, desse modo, que a criação da Super-Receita poderá não resolver o problema da Previdência, caso o esperado aumento da arrecadação não lhe seja, como convém, integralmente destinado. O novo organismo, embora tenha o mérito de reduzir espaço para a sonegação e a fraude, poderá acabar sendo apenas mais um tentáculo da já poderosa máquina arrecadatória e não uma solução, como se anunciou, para o equilíbrio da Previdência. E, portanto, para a necessária e urgente melhoria dos padrões da seguridade social brasileira.

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